484-TARZAN DA MADRUGADA-Peripécias de Maurício

Desde os tempos de infância, passando pela meninice, puberdade e adolescência, Maurício foi diferente dos irmãos. Se em casa gostava de brincar com lápis coloridos e canetinhas hidrográficas, também era levado da breca quando estava na rua ou mesmo no quintal. Parece que tinha uma personalidade para ambientes fechados e outra quando estava em liberdade.

Cursava o último semestre da faculdade e conseguira um estágio em estabelecimento financeiro, como Auxiliar de Programação. Trabalhava a partir das 22 horas e saia entre três e quatro da madrugada. A fim de voltar para casa, tomava um ônibus que passava de hora em hora, cujo ponto ficava ao pé de frondosa árvore.

O medo de assaltantes era grande. Por isso, ao chegar ao ponto olhava para todos os lados, a ver se estava sendo observado. Em seguida subia, qual um macaco, pela árvore que se situava ao lado do poste da parada do ônibus. Alí permanecia escondido entre a ramagem, até que via o ônibus subindo a rua. Então, num salto ágil, pulava da árvore e caia em pé, exatamente no local da parada de ônibus.

Na rua deserta, o aparecimento súbito só era notado pelo motorista, que encostava o ônibus com toda a calma para receber o solitário passageiro, e pelo cobrador. Não havia mais ninguém na rua. E naquela avançada hora da madrugada, somente os três — passageiro, cobrador e motorista — seguiam a viagem.

Isto acontecia em todas as madrugadas. Motorista e cobrador já estavam acostumados com a presença do rapaz que saltava da árvore, qual um macaco de hábitos noturnos.

Até que numa madrugada, estando Maurício abrigado pela ramaria, chegou uma mulher alta e forte com uma sombrinha (a madrugada prometia chuva) na mão e bolsa a tiracolo. Vestida de branco.

Ela parou ao lado do poste que sinalizava a parada do ônibus e ficou aguardando. Olhando, com olhos de preocupação, em todas as direções.

Certamente uma enfermeira que saiu do trabalho, pensou Maurício, já acomodado no seu galho predileto, na árvore.

Alguns minutos decorreram até que o ônibus, virando a esquina, iluminou a rua com faróis. Foi quando o rapaz pulou repentinamente da árvore, caindo bem perto da mulher, que se assustou. Entretanto, sua reação não foi de medo e sim de defesa. Pensando que se tratava de um meliante pronto para assaltá-la, partiu firme com a sombrinha para cima do moço.

— Toma, seu safado! Comigo, não! Sem vergonha! Bandido! Filho da mãe! — E a cada xingo, uma pancada com a sombrinha na cabeça, nas costas e nos ombros.

Maurício correu e entrou no ônibus. A mulher o seguiu, gritando:

— Esse safado queria me assaltar!

O motorista e o cobrador, que assistiam a cena, davam boas gargalhadas.

— Ele não é assaltante não, dona. — Disse o motorista. — Tem costume de ficar na árvore, esperando o ônibus.

E o cobrador confirmou, dizendo:

— É, dona. O rapaz é o Tarzan da Madrugada.

ANTONIO GOBBO

Belo Horizonte, 09 de março de 2008

Conto # 484 da série Milistórias

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 02/11/2014
Reeditado em 02/11/2014
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