Santo carroceiro
Talvez não fosse santo de nome ou nas suas ações, mas uma vez de Santo chamado, gostou e a coisa pegou e se não se santificou, Santo ficou. Homem irriquieto, de múltiplas atividades, tinha mesmo era que briquitar para assegurar o pão de cada dia daquela numerosa prole que, na Velha Serrana, disputava acirrada liderança com a família dos Giriza.
Era ping-e-pong: se num ano o troféu de "Mãe do Ano" ia para a Senhora Giriza, no seguinte, Santo e Senhora é que faziam as honras. E não raro, de lado a lado, aos pares. `A vida é mais jocunda quando a fertilidade abunda` - inscreveria no mármore dos tempos um Cícero, um
Homero, se tivesse tido a felicidade de nascer por aquelas fecundas bandas.
E além de meninos a rodo, dos quais o mais velho era uma réplica silente do Elvis Presley - do que se dá para depreender a hollywoodianidade do resto do plantel - Santo também mantinha uma vasta criação de galinhas, cabras, leitões e, naturalmente, o cavalo, para o transporte individualizado e o de carreto. E tinha também os cães, e de caça, farejadores da mais vira-lata raça.
E deu num dia, madrugada, aliás, em que passando férias na pacata Serrana, retornava eu de algum baile, ou serenata e já tendo franqueado a esquina de minha descalçada ruela, onde os lotes vagos, ainda predominavam, achei por bem valer-me da quietude da noite para `obrar`, al fresco, e à luz das estrelas que agora era mais intensa, e porque não dizer, poética, em perfeita comunhão com a natureza.
Senão os deuses da madruga, os goles em excesso d`alguma libação quiçá mais me impeliam do que inspiravam. E senão posso dizer literalmente "mãos à obra", à obra passei, mal liberto e solto, me agachei.
E justo no segundo movimento, quase findo o tormento, oh céus, que ouço: um arrastar de patas triunfal em meio à resfolgação infernal e era o Santo, com sua matilha, que por minha rua se enveredava e toda minha concentração bem ao meio se cortava, se travava e a linda abóboda que me inspirava e cobria, agora, devassa, de mim só ria... e só não me fiz ali celebre por não ter agado por lebre…