O RELÓGIO DA VILA
O RELÓGIO DA VILA
Aquela era uma vila pequena e muito simples, o povo vivia feliz com o que possuía e não desejava nada mais, porque os donos de terras eram pessoas simples como os que não contavam nem com sete palmos para serem enterrados; o certo era que na Vila de Santa Cruz da Serra a igualdade existia, porque ninguém se julgava melhor que o outro e assim todos viviam em perfeita paz.
A maior parte dos negócios feitos na vila era na base do escambo, bem assim: se dona Joana tinha uma galinha e precisava de um corte de chita, ela ia até a venda de Seu Néstorio e trocava a galinha pela chita e Seu Néstorio trocaria a gorda galinha com alguém que precisasse de uma galinha e tudo era assim e todos achavam bom e justo, pois era o costume dos antigos e estava tudo bem.
Por anos e anos a vida em Santa Cruz da Serra foi assim, nada mudava e a felicidade e a paz moravam lá, mas nada como um dia depois do outro para mudar as coisas e quando Lourenço de Justina resolveu ir até uma cidade grande tudo mudou, porque ao voltar ele trouxe um punhado de notas de mil reis e foi um sucesso, porque era a primeira vez que aquela gente via dinheiro em notas.
Atrás das notas de Lourenço, apareceram os mascates com suas novidades e o dinheiro substituiu o escambo e seguiram em frente, mas com a chegada do dinheiro, começaram a querer coisas e a primeira idéia foi construir uma igreja e construíram, mas o padre Sebastião foi chegando e dizendo que faltava um relógio na torre e que toda igreja precisa ter um e concordaram.
O padre encomendou o tal relógio na Suíça e a viagem da Suíça para o Brasil levou alguns meses, mas finalmente chegou e ai complicou, porque na vila ninguém entendia da instalação do relógio e lá se foi mais um bom tempo para conseguir alguém entendido no assunto, mas o padre Sebastião conseguiu no Rio de Janeiro um alemão para finalmente instalar o relógio; o alemão se chamava Hans.
Naquelas lonjuras ninguém jamais tinha visto um estrangeiro e o tal Hans Kepller era um homem jovem, alto, forte e louro de olhos azuis, as moças da vila ficaram encantadas com o bonito alemão e ficavam por perto da igreja vendo o rapaz trabalhar, mas as atenções dele eram para Ana, uma morena linda e o namoro começou com a aprovação da familia da moça e durou uns dois meses.
Finalmente o relógio ficou pronto e começou a dar as horas para o povo, que se admirava com a precisão que seu sonoro sino anunciava as horas, quartos de horas e as meia horas; na primeira badalada do relógio a festa da inauguração começou com as bênçãos de padre Sebastião, muita comida, bebida e música e o povo comeu, bebeu e dançou a noite inteira, foi a melhor festa daquela vila.
O Hans participou da festa ao lado da namorada Ana, mas no dia seguinte ele sumiu, e ninguém entendeu nada, porque todos esperavam que ele se casasse com a bela Ana, procuraram por ele na região, mas deu em nada,o alemão anoiteceu e não amanheceu e o assunto foi esquecido, mas Ana que era magrinha começou a engordar e logo ficou claro que a moça estava grávida.
O padre Sebastião pediu a seus amigos do Rio de Janeiro para encontrar o alemão e manda-lo de volta, mas já era tarde, porque o esperto Hans Kepller já tinha voltado para a Alemanha e o jeito foi a familia da moça se conformar com o acontecido e criar o mestiço, que nasceu forte, lindo, louro e de olhos azuis como seu fugitivo pai; naquela época mães solteiras, ficavam solteiras para sempre.
Maria Aparecida Felicori {Vó Fia}
Nepomuceno Minas Gerais Brasil