O Galo Procópio

Quando completei doze anos de idade ganhei de presente um galinho e já veio com o simpático nome de Procópio.

A princípio achei estranho, mas, com o tempo, fui me afeiçoando aos seus caprichos e ao seu porte elegante.

Lembro-me de sua crista de um vermelho intenso e da sua marca registrada de olhar-me atentamente quando eu puxava uma conversinha para passar o tempo. Ele alteava o seu pescoço fixando seu olhar com tamanha atenção e gestos de censura - parecia avaliar-me - e isto me fazia alongar o discurso.

Na escola eu ganhara tarefas onde exigia minha apresentação em público. Isso me dava um nó, um friozinho percorria o meu corpo e eu tremia antecipadamente. Aí me lembrei de Procópio. Ele seria o meu público. Eu treinaria minha palestra sobre o crivo do seu olhar permanente, ininterrupto, rígido e ameaçador.

Eu ficava sobre uma cadeira proferindo algo de minha imaginação e ele ficava ali, de prontidão, como se avaliasse ritmo, entonação de voz e até a minha postura. Confesso ter ficado nervoso na primeira tentativa, porém a continuidade trouxe-me segurança e maturidade. Eu já estava prontinho para encarar uma plateia numerosa.

No dia da apresentação eu estava tranquilo e havia domínio do conteúdo; a sala estava repleta! Não precisei do recurso de ficar consultando o texto: deixei-o posto sobre a mesa e falei com um aspecto natural e descontraído, conduzindo magistralmente o tema em questão.

E se tornou uma prática constante essa minha atividade. Em toda ocasião eu estava presente, procurava sempre contribuir com algum tipo de participação; já recebia convites de professores, diretores, presidentes de grêmio recreativo.

Havia um ritual para minhas apresentações. Chegava ao local munido do material de trabalho – cartolinas, faixas, cartazes – e, como sempre, uma caixa de papelão com pequenos furinhos a qual eu guardava no cantinho da sala bem ao meu alcance. Ao final, recolhia todo o conteúdo, guardava dentro de algumas pastas, selecionando um a um, e depois cuidava de pegar a caixa sem nem mesmo tê-la usado para coisa alguma.

Quando todos deixavam a sala, não sem antes cumprimentarem-me pela brilhante exibição, eu olhava para todos os lados, assegurando-me da possibilidade de não haver ninguém às voltas, e abria delicadamente a caixinha de papelão e dava um beijo cheio de ternura no meu maior ouvinte. Procópio, eu bem sabia, ficava cada vez mais orgulhoso pelo meu progresso.

Rui Paiva
Enviado por Rui Paiva em 30/09/2014
Reeditado em 30/09/2014
Código do texto: T4982187
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