A Grandeza de um Sorriso

Há sobre a colina verdejante uma casa de aspecto sombrio, onde o tempo deixou marcas de abandono total. Frondosa árvore deita-lhe imensa sombra quando o sol inunda as tardes de luz.

Ali, naquele recanto, mora um homem, ou melhor, o homem vê a vida passar sem dar-lhe a mínima importância; seu rosto é de uma tristeza tamanha, seu descaso pelas emoções é tão notório quanto o seu andar encurvado, alvo de pesados e rudes infortúnios.

Algum caminhante aqui e ali lhe dirige a palavra, faz-lhe uma cortesia, mas só ouve resmungos, quando muito; o silêncio, a mais das vezes, é a sua predileta resposta.

Seu nome é Carlos, sabe-se apenas isto. Nada sobre filhos, esposa ou parentes. Tem a pele ressequida, mãos calejadas, olhos esbranquiçados pelo desgaste dos anos.

Certo dia, um trio de meninos resolveu adentrar a casa e fazer traquinagem com o velho. Já vieram fazendo alvoroço.

Chutaram um balde de flandres, jogando-o próximo à cerca de varas entrelaçadas; pedras foram atiradas à porta semiaberta e um jato de areia cobriu o pequenino retângulo da janela. Dentro, nem um sinal de vida, tudo calmo.

Os moleques ficaram inquietos, a curiosidade ficou mais aguçada e ousaram invadir as dependências. Deram-se as mãos, pé ante pé cruzaram a soleira da porta. A escuridão interna e o silêncio absoluto aumentaram seus batimentos cardíacos, quanta adrenalina! O mais magrinho adiantou-se e deu uma espiada pela abertura do corredor... Nada! Quase esbarrou num pote fincado junto à entrada do quarto.

Os outros dois detiveram a marcha e ficaram paralisados ao ponto de quase renunciarem a missão. Viram quando o amigo lançou um olhar de espanto e enveredou pelo quarto como um raio.

O garoto viu o corpo inerte do velho estendido sobre um colchão de palha, um lençol em farrapos cobria seu vulto esquelético e uma tênue luz revelava sua respiração dificultosa, o cabelo em desalinho cobria-lhe o rosto.

O visitante aproximou-se, pegou uma quartinha posta sobre um caixote de madeira, pôs água dentro de uma vasilha e deu para o velho beber. Ele sorveu a água com extrema vontade e depois fitou o menino nos olhos. E sorriu. Como há muito não fazia.

O menino correu e foi perseguido pelos companheiros; só foram parar a várias quadras de distância, exaustos. Nunca se soube de algum comentário entre eles. Mas uma coisa ficou profundamente gravada em suas memórias: a grandeza de um sorriso tem o poder de trazer paz e serenidade. Destrói qualquer atitude voltada para o mal.

Rui Paiva
Enviado por Rui Paiva em 29/09/2014
Código do texto: T4980487
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.