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O HOMEM DOS DEZOITOS
É verão. Gosto de cochilar na rede, depois do almoço. O vento do mar faz uma carícia em meu desgastado corpo. Às vezes, sou perturbada pelos gritos dos netos. É costumeiro e não me incomoda. Agora, é a vez da Lavínia.
- Vó! Te acordei?
Sorrio e respondo não.
- Conta a história do vovô.
Conto. Ela já deve saber de cor. Mas gosta de ouvir-me. Então.
Eu tinha quinze anos. Mamãe mandou-me levar uma costura para a fábrica. Resolvi mudar o caminho. Quando passei na Rua das Acácias, vi o homem sentado na varanda da casa, tentando fazer um bebê se calar. Parei e achei graça dos gestos desajeitados. Ele também riu. Num ato espontâneo, aproximei-me.
- Deixa, comigo. Pobrezinha. Precisa trocar as fraldas. Onde tem?
Entrei na casa que não conhecia. Começou a chegar crianças.
- Quem é ela, pai?
- Vai morar com a gente?
- Sabe fazer comida?
- Posso chamar de mãe?
Olhei para o homem, achando graça, de novo. Ele riu, de novo. Tinha olhos escuros. Pretos, talvez. Cabelos despenteados, barba por fazer, camisa molhada da baba e choro do bebê, pés descalços e... apaixonei-me na mesma hora. Desviei o olhar, rapidamente, encabulada e de faces rubras.
- Toma! Tem outras fraldas no varal. As roupinhas coloquei na gaveta. As que estão no chão estão sujas. Não consigo dar conta, sabe como é. A propósito, meu nome é Ezequiel. E o teu?
- Alice.
Falaram ao mesmo tempo e riram. Eram tantas crianças. Fiquei séria e contei: oito.
- A do País das Maravilhas – perguntou a maior.
Mais uma algazarra, risos, perguntas empurrões, choros. Confusão.
Olhei para o pai:
- Quem são?
- Meus filhos.
- Todos?
- Sim. Janaína, Pietro, Gabriela, Janice, Amanda, Leandro, Joice e Anelise. Oito.
- E a mãe?
- Saiam crianças. Vão brincar na rua. Janaína, leva todos. Quero falar com a moça.
Mais confusão, contrariedades, choros e muitas falas. Finalmente, Ezequiel olhou-me e explicou:
- São meus filhos, sim. Minha esposa morreu ao dar à luz. Agora, preciso de quem me ajude. Gostei de ti. Já vi que tens jeito com crianças. Queres casar comigo?
Ri tanto que meus olhos se encheram de lágrimas. Anelise voltou a chorar. Coloquei-a no colo e fiquei embalando-a, de cabeça baixa, sem coragem de encarar o homem. Coisas doidas passavam pela minha cabeça. Então, quando ergui o olhar para Ezequiel, como se as palavras tivessem saído de outra boca, disse:
- Sim, aceito.
Não voltei para casa. Casamo-nos quando fiz dezesseis anos e já com meu primeiro filho nos braços. Tive dificuldades. Às vezes, meu marido chegava do trabalho e me encontrava brincando com as crianças, sem ter feito almoço, limpado a casa ou lavado a roupa. Com calma, foi-me ensinando. Cada ano que passava, tínhamos mais um filho e... e...
- Vó! Acorda. Quero ouvir mais.
- Ah, querida. Você já sabe. Foram dez filhos, dez. Por isto é que nossa família é tão grande. Teu avô teve dezoito filhos. Dezoito. Agora, deixa a vovó dormir mais um pouco, deixa.
É verão. Gosto de cochilar na rede, depois do almoço. O vento do mar faz uma carícia em meu desgastado corpo. Às vezes, sou perturbada pelos gritos dos netos. É costumeiro e não me incomoda. Agora, é a vez da Lavínia.
- Vó! Te acordei?
Sorrio e respondo não.
- Conta a história do vovô.
Conto. Ela já deve saber de cor. Mas gosta de ouvir-me. Então.
Eu tinha quinze anos. Mamãe mandou-me levar uma costura para a fábrica. Resolvi mudar o caminho. Quando passei na Rua das Acácias, vi o homem sentado na varanda da casa, tentando fazer um bebê se calar. Parei e achei graça dos gestos desajeitados. Ele também riu. Num ato espontâneo, aproximei-me.
- Deixa, comigo. Pobrezinha. Precisa trocar as fraldas. Onde tem?
Entrei na casa que não conhecia. Começou a chegar crianças.
- Quem é ela, pai?
- Vai morar com a gente?
- Sabe fazer comida?
- Posso chamar de mãe?
Olhei para o homem, achando graça, de novo. Ele riu, de novo. Tinha olhos escuros. Pretos, talvez. Cabelos despenteados, barba por fazer, camisa molhada da baba e choro do bebê, pés descalços e... apaixonei-me na mesma hora. Desviei o olhar, rapidamente, encabulada e de faces rubras.
- Toma! Tem outras fraldas no varal. As roupinhas coloquei na gaveta. As que estão no chão estão sujas. Não consigo dar conta, sabe como é. A propósito, meu nome é Ezequiel. E o teu?
- Alice.
Falaram ao mesmo tempo e riram. Eram tantas crianças. Fiquei séria e contei: oito.
- A do País das Maravilhas – perguntou a maior.
Mais uma algazarra, risos, perguntas empurrões, choros. Confusão.
Olhei para o pai:
- Quem são?
- Meus filhos.
- Todos?
- Sim. Janaína, Pietro, Gabriela, Janice, Amanda, Leandro, Joice e Anelise. Oito.
- E a mãe?
- Saiam crianças. Vão brincar na rua. Janaína, leva todos. Quero falar com a moça.
Mais confusão, contrariedades, choros e muitas falas. Finalmente, Ezequiel olhou-me e explicou:
- São meus filhos, sim. Minha esposa morreu ao dar à luz. Agora, preciso de quem me ajude. Gostei de ti. Já vi que tens jeito com crianças. Queres casar comigo?
Ri tanto que meus olhos se encheram de lágrimas. Anelise voltou a chorar. Coloquei-a no colo e fiquei embalando-a, de cabeça baixa, sem coragem de encarar o homem. Coisas doidas passavam pela minha cabeça. Então, quando ergui o olhar para Ezequiel, como se as palavras tivessem saído de outra boca, disse:
- Sim, aceito.
Não voltei para casa. Casamo-nos quando fiz dezesseis anos e já com meu primeiro filho nos braços. Tive dificuldades. Às vezes, meu marido chegava do trabalho e me encontrava brincando com as crianças, sem ter feito almoço, limpado a casa ou lavado a roupa. Com calma, foi-me ensinando. Cada ano que passava, tínhamos mais um filho e... e...
- Vó! Acorda. Quero ouvir mais.
- Ah, querida. Você já sabe. Foram dez filhos, dez. Por isto é que nossa família é tão grande. Teu avô teve dezoito filhos. Dezoito. Agora, deixa a vovó dormir mais um pouco, deixa.