279-O ESCRAVO DO CENTURIÃO-Biblíco

Coisas muito estranhas estão acontecendo nesta velha cidade. Alguns estão se reunindo às escondidas para planejar arruaças e causar problemas aos romanos. Os sacerdotes do templo aumentaram os preços dos cordeiros e das pombas que temos de comprar para fazer as oferendas. Uma multidão segue um homem que dizem santo e que faz milagres.

Sou testemunho do poder maravilhoso de cura desse peregrino a que chamam de Jesus de Nazaré. Estava padecendo de um mal desconhecido. Feridas apareceram em meu corpo, cobrindo o peito, as costas, braços e pernas, a cabeça e o rosto. As dores, insuportáveis, percorriam meu corpo, sem cessar. As pústulas cheiravam mal e fui colocado em um catre sob o telheiro, fora da casa de meu senhor. Apenas meu patrão e dono, um decidido centurião do exército romano, me ia ver, levando-me alimento e água. Nem seus filhos, dos quais quem fui preceptor nos ensinamentos do hebreu e do grego, conseguiam chegar perto de mim. Até minha companheira Adjanira me evitava. Todos, exceto meu senhor, me consideram (tenho certeza) doente sem cura. Minha morte era certa para eles.

Só meu patrão não desistia. Na manhã de sábado, me disse:

— Vou procurar esse homem que faz milagres. Ele vai curar você.

Não sei bem o que aconteceu. O que sei é que, na tarde daquele dia, enquanto o patrão estava fora, e eu sozinho em meu catre, entre tremores e dores, uma claridade vinda do teto foi aumentando, aumentando... Tive de fechar os olhos, pois era uma luz mais forte do que o próprio sol. Senti um calor agradável e uma mão passando suavemente sobre meu corpo. Acho que dormi. Acordei com vozes de pessoas da casa, que se acercavam de meu leito.

Meu senhor estava ajoelhado à minha cabeceira e chorava.

— Ele falou que você ia ser curado e cumpriu a promessa. Você está curado!

Levantei-me. Passei a mão pelo rosto, pelo corpo. Não havia mais feridas. Senti-me revigorado. As forças tinham voltado. Estava curado.

Fiquei sabendo, em seguida, do desespero do meu senhor, quando procurou o homem que,segundo disse, chamavam de Jesus de Nazaré. Contou para todos da família:

— Foi difícil chegar até Ele. Uma multidão o rodeava. Antes que chegasse perto, senti seus olhos me procurando. Quando me aproximei, uma força estranha me jogou aos seus pés.

“Que queres?” — Me perguntou. Percebi que perguntava por perguntar. Ele já sabia por que eu estava ali.

— Senhor, meu servo está à beira da morte, padecendo dores horríveis. Quero que o livre do mal.

“Leve-me até ele.”

Confesso que tive vergonha de trazer aquele homem até minha casa. Respondi-lhe:

— Senhor, minha casa não é digna de recebê-Lo. Diga uma só palavra e meu servo será curado.

O Homem de Nazaré replicou:

“Sim, seja feito conforme dizes. Vai, tua fé salvou teu escravo”.

Beijei seus pés nus e corri de volta para minha casa.

As lágrimas escorriam dos olhos de meu amo. Permanecia ajoelhado, balançando o corpo de um lado para outro, repetindo:

— Ele cumpriu a palavra. Ele o curou.

Fiquei penalizado. Passando as mãos sob seus braços, ajudei-o a se levantar. Ele me abraçou, comovido, e disse:

— Ele curou você e eu o liberto. Agora você é um homem livre.

Beijei-o nas faces e nas mãos e saí, em busca de Jesus de Nazaré.

ANTONIO ROQUE GOBBO –

BELO HORIZONTE, 17.ABRIL.2004. –

CONTO # 279 DA SÉRIE MILISTÓRIAS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 05/07/2014
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