Laura e o quase tombo
Depois de um pesadelo assustador, Laura acordou apavorada.
Suas pernas tremiam, sentia medo.
Cogitou chamar sua mãe, porém lembrou-se estar velha demais para fazê-lo.
Inevitavelmente, recordou-se dos tempos de criança; onde um simples abraço da mãe dissipava todos os medos.
Percebeu-se sozinha.
Sentia-se como um livro velho, empoeirado e esquecido no alto de uma estante.
Durante anos, Laura anulou-se por completo; negligenciou sonhos, deixou-se ser oprimida, permitiu que espinhos sufocassem seu tesouro mais precioso.
Afastou-se de si.
Já pela manhã, superado o susto do pesadelo, levantou-se meio sem pressa, tomou um café tão amargo quanto sua vida e partiu.
Talvez, aquele sabor fosse o algoz responsável pela punição de suas culpas.
Achava que não tinha permissão pra ser feliz, pensava-se indigna de uma vida viva.
"Mantenha o foco, Laura!" - pensava.
De repente, em uma leve distração, sentiu uma imensa vontade de viver aquilo negligenciara um dia.
Quis voltar ao passado, mudar a história já escrita, recuperar o leite derramado.
Que inútil tentativa!
Não sabia que, capítulos publicados, não podem ser reescritos, ainda que estejam empoeirados e esquecidos no alto de uma estante.
Sua alma chorou!
Recheados de devaneios, seus pensamentos estavam a mil.
Atordoada, com a visão meio embaçada e uma fraca percepção da realidade, tropeçou em uma pedra e, por pouco não se esborrachou no chão.
Ainda assustada pelo quase-tombo, num estalo de pensamento e com a mesma empolgação de alguém que decifra algum código secreto, Laura entendeu o que a vida lhe dizia:
estava na hora de descer do alto da estante, vencer o medo da queda, sacudir a poeira, e provar da vida que existe além da sobrevivência.