o lobo
abandonou a fase balzaquiana. casa dos quarenta:era agora um lobo. logo tinha pêlos e eles não obedeciam qualquer senso de estética, ao invés, eram sempre um convite aos primórdios da humanidade. Foi preciso armar-se de paciência e tesoura. O espelho do banheiro escarnecia e trazia o mal estar. Nada crescia de uma só vez. A lua cheia alimentava uma sobrancelha medieval, hirsuta, causava desespero. nas semanas de lua nova, não todas, era comum corta-los saltando pela narina inconvenientes, semanas depois esquecia e lá no espelho estavam aqueles pêlos duros e tortos crescendo dentro da orelha. percebeu que seria uma eterna batalha. naquela noite assistia no sofá o jornal da noite ao lado da família. passava uma reportagem sobre conflitos religiosos na palestina, uma grande disputa sobre locais sagrados. todos atentos até o avô pronunciar o que seria certo fazer sobre israel: derrubem tudo, todos os muros e monumentos e comecem do zero! entonou isso feito um fascista
ninguém deu atenção ao ancião, mas dentro da cabeça do lobo surgiu uma inspiração. correu ao banheiro trazendo consigo uma navalha. saiu de lá, 40 minutos depois, com a cabeça lisa, não havia qualquer cabelo ou coisa que lembrasse isso acima do pescoço, apenas a pele branca cheia de sangue e esparadrapo. sentou-se novamente ao lado da família, deu beijo no rosto do avô, disse obrigado e junto de todos assistiu a novela