O dia de todos os santos (a revolução do silêncio)
Houve certa vez um boato de que uma grande legião vinda do norte e do sul do país invadiria são Paulo num colossal e coordenado ataque para tomar o governo, primeiro da capital e depois o estado sendo que pretendiam formalizar uma anarquia sem precedentes. Não era ainda matéria de jornal, tudo era lido nos muros, comunicado de ouvido em ouvido, boca a boca. As massas caminhariam armadas através das avenidas. A noticia foi ganhando outros contornos quando passou a ser divulgada através de um manifesto impresso sem figuras, com papel de má qualidade. Segundo a conversa corrente nos bares do centro e em todo o comércio, do Bráz a Sé, do Ipiranga ao Cambuci, tais papéis principiaram a surgir nas madrugadas nos meados da primavera daquele ano. Curiosamente não era período de eleições. As autoridades começaram a torcer as sobrancelhas apesar da paz relativa. e assim foi chegando o dia previsto: seria no dia de todos os santos. não tardou para que o povo passasse a compartilhar de uma certa ansiedade maculada de boa dose de paranóia. O governador e o prefeito vieram, através da poderosa mídia, tranquilizar o povo dizendo que os serviços de inteligência do governo estavam atentos "aquela brincadeira".
As horas tangiam a meia noite do dia 31 de outubro, as avenidas curiosamente estavam vazias, algo próximo de um grande pacto de silêncio, as catedrais e igrejas de todas as religiões estavam repletas de fiéis unidos em orações , as catedrais iluminadas por velas, os rádios lembravam de minuto em minuto o dia grande dia. a polícia federal e o exército acompanhavam a movimentação nas divisas do estado e todos concordaram que não havia qualquer movimentação em massa coordenada. nos outros estados das regiões citadas como epicentro do grande movimento nenhuma aglomeração. Foi então que todos foram saindo de seus prédios foram enchendo as ruas e avenidas num silencio nunca visto antes. milhares e milhares de pessoas de todos as classes se encaminharam as ruas naquela madrugada. veio gente da zona leste, são mateus, tatuapé, moóca, ipiranga, pinheiros, morumbi, moema, interlagos e tantos outros lugares os quais poucos sabiam existir na grande babilônia, ninguém ousou qualquer palavra ou gemido. a polícia e o exército estavam lá, também em silêncio, ninguém soube dizer se aquilo tudo estava sendo dito nas rádios, internet ou televisão por que todos os aparelhos foram desligados. quando a grande multidão chegou até a sede do governo não houve resistência nem qualquer ofensa ou coação. nenhum tijolo ou pedaço de pau foi lançado, nenhum tiro disparado. lado a lado, favelado e engravatado, crianças, idosos adultos: todos em grande silêncio. o povo aproximou-se da polícia e do exército, que se assomaram ao movimento e todos juntos foram entrando nos prédios do governo: aonde estavam os políticos? sentados em silêncio. eles se levantaram, convidaram o povo a colocar fogo naqueles edifícios e todos os livros contendo leis, emendas e decretos. foram pras ruas e aquele silencio apocalíptico foi rompido por uma salva de palmas de todos, o único som a se ouvir na cidade. então todos, todos mesmo, cansados, se despediram e foram para suas casas dormir. amanha seria um outro dia, sem precedentes.