UM SONHO MUITO ESTRANHO

Uma noite eu tive um sonho. Sonhei que estava em uma cidade desconhecida e já era noite. Meus passos ecoavam na rua deserta. As casas, do lado esquerdo e direito, pareciam abandonadas há muitos anos. Gatos negros, de pêlos eriçados, saiam de todas as esquinas e enveredavam por buracos abertos nos portões dos jardins, internando-se nos porões escuros de cada uma das moradias. Um morcego, em vôo rasante, passou rente a minha cabeça enquanto eu procurava, com os olhos, a coruja que lançava no ar o seu pio agourento.

De repente apareceu, como que vinda do nada, uma carruagem negra puxada por um par de cavalos esqueléticos com olhos de fogo. Não havia um condutor. Ela parou e eu subi. Dentro não havia ninguém. A carruagem partiu em alta velocidade, e eu ouvia as chicotadas, nos cavalos infernais, desferidas por um cocheiro invisível contratado, talvez, pelo demônio.

Depois da corrida louca, a carruagem, envolta em um nevoeiro cinza, estacionou a porta de um sobrado velho rodeado por um jardim de flores mortas. Desci assustado e a carruagem partiu sem deixar, no chão de terra, a marca de suas rodas. Do interior da casa vinha o som de uma música que mais parecia um lamento macabro. Os instrumentos tocavam em câmera lenta. Entrei.

As pessoas pareciam saídas de um desenho animado. Eram alongadas, vestidas com roupas do século dezoito. Olharam para mim. Seus olhos brancos saltavam das órbitas e, com as mãos ossudas, elas os devolviam ao devido lugar. Umas dançavam, outras estavam sentadas comendo algo que não se via. A música continuava. Eu tremia. Que era aquilo? Parecia um baile no cemitério. Enquanto eu me perdia em pensamentos, uma mulher alongada se aproximou e me convidou para dançar. Ela sorriu e eu pude ver seus dentes. Pensei:

- Ela vai sugar meu sangue... Ela não esperou a minha resposta, simplesmente desapareceu. Um frio percorreu a minha espinha. As pernas bambeavam. Queria sair, porém me faltavam forças. Então eu reuni toda a coragem que tinha e caminhei na direção da porta para sair correndo. Girei a maçaneta. A porta rangeu e foi se abrindo lentamente parecendo pesar uma tonelada. A música, que acompanhava a lentidão da porta, foi desvanecendo. Os minutos pareciam horas. Saí. Deus! Deus!

A mulher alongada, que havia desaparecido, estava na calçada com os seus dentes de vampiro e uma flor morta na mão. Ofereceu-me a flor e eu, apavorado, aceitei. Novamente ela sumiu. Enquanto eu tentava organizar meus pensamentos para entender tudo aquilo que estava acontecendo, ouvi um trotar de cavalos: era a carruagem negra que retornava trazendo no seu bojo a mulher alongada.

Ela fixou o olhar em mim. Seus olhos eram fosforescentes e giravam emitindo um barulhinho que lembrava bolinhas de vidro. Num átimo de segundo ela arrancou a própria cabeça e a jogou no meio da rua dando gargalhadas demoníacas. Foi neste instante que se abriu, no espaço, um túnel de fogo sugando para o seu interior a carruagem, os cavalos e a mulher alongada, agora sem cabeça, deixando no ar um cheiro forte de coisa podre. A cabeça se elevou do chão e, ainda gargalhando, foi subindo, subindo, subindo até desaparecer na escuridão da noite.

Acordei. O suor molhava o travesseiro. Que sonho mais esquisito! Parecia tão real. Foi então que, esticado na cama, senti algo áspero junto a minha perna. Tateei com a mão e lá estava, sobre o lençol, a flor morta presente da mulher alongada...

O coração acelerou tanto que pensei que fosse sair pela boca. Será que foi um sonho? Cruzes...!

09/05/07.