Jabuticabo
Imaginei que fosse tarde quando eu a vi voltando da praia. Acompanhei da janela, presumindo que fosse entrar à casa rapidamente. Mas a perdi de vista quando passou de fronte as jabuticabeiras. Via apenas os galhos e o que parecia ser um vulto de suas vestes que logo se mostraram novamente do outro lado das arvores, perto do canteiro. Recolhia algumas flores.
Para ela, esses momentos únicos e simples valiam mais que uma prosa. Ela ainda se sentou para arrumar o canteiro das flores, medindo palmo a palmo o tamanho de seus troncos verdes e delicadamente alisando as pétalas perfumadas. Quis sair para ficar com ela. Romper o silêncio, quem sabe. Ela estava linda, casualmente linda, sem esforço algum. Coloquei as mãos no bolso e esperei ereto na janela, impaciente.
Ela voltou sua cabeça para onde eu estava e me viu sem pudor. Acenou longamente com as mãos. Quis retribuir, mas apenas consegui sorrir, amarelo. Quando dei por mim, vi que ela mudara o movimento das mãos, como se quisesse me chamar. Ansioso, procurei rapidamente a porta para o jardim e fui até ela.
... Como se confundia com aquele perfume verde. Quis saber de onde vinha aquele aroma - do corpo dela ou das flores do canteiro? Pediu então que me sentasse ao seu lado para que me mostrasse algumas flores que plantara a pouco tempo. Eu concordava com a cabeça mediante todas as explicações que pouco dava conta de entender por estar trêmulo e utópico ao lado dela. Por vezes hipnotizado, com o seu sorriso entusiasmado, tentava me recobrar, rindo, do que quer que fosse, bastava vê-la gesticulando e sorrindo.
Quando ela tomou minha mão para ajudá-la a cavar um novo berço para as sementes que trazia no seu bolso, eu quase tive um treco pensando que ia me consumir em sonhos de realidade.
- Já pensou se este canteiro fosse como um labirinto? A gente podia andar por horas, só nos dois, tentando descobrir o fim, né?!
Eu concordei balançando o pescoço. Temia que ela me achasse um tapado pelo fato de não fazer outra coisa a não ser concordar.
- Você é engraçado, quase não fala.
Senti-me no dever de declarar-lhe algo, mas eu realmente não conseguia pensar em sequer uma frase feita.
- Venha, vamos fazer de conta que você é uma árvore, puxou-me pelos braços rapidamente me colocando ao lado das flores dela.
Uma árvore? Bem, não deveria ter ficado calado o tempo todo... Devia ter dito logo que queria brincar com ela de algo que envolvesse um herói e uma dama, de preferência em perigo.
- Ó, se cobre com esses galhos velhos da jabuticabeira e fica parado aí! vou tentar escalar você. E tomou distância como se fosse subir um muro.
Quando ela veio correndo e gritando eu pensei que fosse derrubar o pequeno jabuticabo aqui. Mas consegui segurá-la nos braços.
Ela ficou avermelhada, não temia tal reação minha. Mas, também, ela não quis sair dos meus braços.
Eu ri, roxo e sem graça. Ela jogou os cabelos para trás e disse, delicadamente:
- É melhor que tenha uma explicação para me segurar assim.
- Eu sou uma árvore... uma árvore com balanço.
Ela envolveu seus braços em torno de meu pescoço. Girei com ela por todas aquelas flores, jabuticabeiras.
O jabuticabo com balanço.