O homem de lá

O silêncio trançava em ruídos ainda não ouvidos. Prendedores de roupa se prendiam entre si. Formavam um extenso comer-se. Os pássaros, todos, cantavam e observavam da copa de árvore o caminhar vacilante do cortejo. Trilha já percorrida por outros tantos. Na entrada, cravado em cobre rústico, as palavras diziam: “Tu és o que fui e serás o que sou”. Alguns corpos meneavam por lá seus estribilhos de dor. Era dia que se tornava noite. Lusco-fusco. O fosso cavado, bem mais fundo do que pendia o costume, parecia úmido. Melhor. Depositavam em alegres cordas o corpo decaído. Facínora.

Não aguardavam mais a sua subida quando de ímpeto o mandaram. Não era por compadecimento ou saudade. Certeza teriam ao ver os dedos, agora ébanos, recostados em flores alvas, perfumadas com a tão esperada despedida. Descia a caixa de madeira boa. De costas, sem exceção, retornaram em cortejo. Agora, os sons e cores se espalhavam, remexiam tanto! Os pássaros, silenciosos, aguardavam nota por nota e observavam os barulhos daqueles, e não mais os olhavam, apenas ouvia-se. Estavam distraídos demais para mar de poesias em canto.

Ao sair, o letreiro emendava letras irreconhecíveis. Talvez por também se curvarem aos soluços cegos e moribundos. Hoje brotam rosas do chão seco. Som se via, vento se via, cheiro se via, em lugar donde tornava-se, enfim, mais claro dia. Era enterro no sertão.

Fernando de Camp
Enviado por Fernando de Camp em 20/02/2005
Código do texto: T4796