189 - DO GRAMOFONE AO CD PLAYER
Instalado o DVD player adquirido através da promoção da revista Época. Tanto a aquisição quanto à instalação são exemplos de como funciona, hoje, o velho sistema de compra-e-venda. A promoção oferece um DVD Player a toda nova assinatura da revista, tudo por um R$ 390,00, equivalente a US$ 145,00 (o dólar a pouco mais de R$ 2,70). É o preço corrente de um aparelho nos magazines..
Aproveitei a chance. Recebi o aparelho em julho/2002. Isto é, o aparelho foi recebido pela Fabíola e Anselmo, já que eu estava em SSParaíso e a encomenda chegou pelo correio, com prazo fatal para ser retirado. Ao voltar da viagem, o aparelho já estava instalado, funcionando perfeitamente bem.
Esta aquisição me faz lembrar da evolução, que assisti, das técnicas da reprodução de som, no século passado. O Gramophone (era assim que se escrevia em bom português, até por volta de 1930) foi a única tecnologia de tocar discos, até o final da segunda guerra mundial. Tio Gordo, homem de idéias avançadas para seu tempo, tinha um, que trouxe da Itália, em viagem no ano de 1929. Aparelho moderno para a época, consistia de uma caixa de madeira dentro da qual um sistema de relojoaria, acionado por manivela, fazia girar o prato, uma bandeja rotativa na parte superior. Um braço oco, em cuja extremidade a agulha de metal era afixada, transmitia o som para a corneta, um dispositivo tremendamente difícil de ser acoplado ao gramophone. No braço estava todo o segredo da reprodução, que eu, criança curiosa, não entendia: como a agulha, raspando o disco, podia captar os sons, que passavam por um diafragma de mica, e dali eram levados à corneta, que funcionava com amplificador.
Eu não compreendia aquele simples funcionamento tanto quanto não compreendo o funcionamento do DVD player, que reproduz sons e imagens de discos (CD e DVD). Mas hoje ninguém está preocupado em saber “como funcionam” os aparelhos, veículos e máquinas. Queremos é usar, usufruir, consumir. Bem diferente do século passado, quando a curiosidade pelas técnicas novas era uma constante.
Uma pilha de discos com performances de Caruso e das primeiras gravações brasileiras fazia parte do sistema (hoje se diria, do “kit”). Os discos, de 10 e alguns de 12 polegadas, eram pesados, feitos (informaram-me) de cera de carnaúba. Óperas inteiras, cantadas pelo insuperável Enrico Caruso, podiam ser ouvidas numa coleção de 8 discos. As gravações de músicas brasileiras (maxixes, canções melódicas) iniciavam invariavelmente com uma voz caricata que anunciava: “Casa Edson, Rio de Janeiro, 1905”. O cachorrinho atento, marca da RCA estava em todos os selos dos discos.
A rotação do disco por vezes era retardada em função da corda que era dada pela manivela. Muitas vezes, no meio de uma ária magnificamente interpretada por tenores e sopranos, acontecia de acabar a corda, isto é, diminuía a tensão da mola que era acionada pela manivela, e aconteciam então os maiores desafinos. Um fiasco completo, se fosse ao vivo.
A partir de não sei quando, o gramophone passou a ser designado de vitrola. Talvez uma referência ou desdobramento da marca do fabricante – RCA Victor – americano. Como se comprovou nas décadas finais do século vinte, eles, os ianques, foram os mestres em elaborar novos nomes, marcas e logotipos.
Quando terminou a guerra, apareceram (no Brasil) as primeiras vitrolas elétricas. Apesar da evolução: motor elétrico para girar o prato, alto-falantes substituindo a corneta, persistiu o uso da agulha de metal. Que só iria desaparecer nos aparelhos de Alta-Fidelidade.
Essas vitrolas elétricas chamavam-se eletrolas. Adquiri uma, por volta de 1950, pequena, barata, que certamente foi importada na enxurrada de produtos americanos, nos anos de 47 em diante. Os discos já eram de melhor qualidade, feitos de baquelite, material desenvolvi-do durante a guerra de 39/45. A variedade não era muita, pois predominava a edição de músicas norte-americanas. Pela década de 50, fui insaciável comprador (dentro de meus parcos recursos) de discos de 78 RPM (rotações por minuto). Minha coleção iniciou-se com um disco de Stan Kenton, maestro americano, executando The Peanut Vendor de um lado, e The Lamp is Low, na face B. Sensacional! Glenn Miller executando o insuperável Moonlight Serenade (lado A) completado no lado B com In the Mood foi a seguinte aquisição. Nessa época tive alguns de Dalva de Oliveira, mas minha predileção logo foi na direção das grandes orquestras românticas: mais de uma dezena de Roberto Inglês (orquestra que desapareceu no final dos anos 50 e nunca mais ouvi). Mantovani foi também um dos primeiros. David Rose e Morton Gould. Orquestra da MGM com músicas dos filmes de sucesso.
No final da década de 50 foi lançado o Long-Play. Uma revolução nos discos e nos aparelhos toca-discos. Comprei um aparelho com rádio e toca discos em Alta Fidelidade (HI-FI, de High Fidelity). A agulha substituída por cristal. A rotação passou de 78 para 33,3 RPM. A qualidade da reprodução excelente! E com a vantagem de poder ouvir os discos antigos, de 78 RPM, bastando trocar o cristal, mediante simples giro no cabeçote do braço e mudança da rotação, uma alavanca de alterava a rotação.
Apareceram novidades: um disco de 7 polegadas e 45 RPM, que não teve aceitação de mercado. Aliás, nas primeiras eletrolas HI-FI havia também a velocidade 45 RPM, para esses discos pequenos, que não fizeram carreira.
Que fim levaram o gramofone, a pequena vitrola, os toca-discos? O gramophone foi sistematicamente desmontado por papai, que aproveitou a mola da corda, fita de aço de primeira qualidade, para consertar o grande relógio de pêndulo de nossa família. Sobrou apenas a caixa de madeira com o prato, a corneta e a manivela, que hoje estão com o Alexandre, meu filho. Os discos de Caruso e da Casa Edison-1905 quebraram-se todos, de tanto manuseio. A pequena eletrola que tive em 1950 presenteei ao Darcy, meu primo, quando saí de SSParaíso para o Rio de Janeiro. O toca-discos que adquiri 1959, logo após meu casamento com Enny, me acompanhou até medos da década de 70. Os cupins atacaram a madeira, e a tecnologia ficou superada. Não me lembro qual foi a destinação da peça.
No final da década de 60 apareceram as fitas-cassete: cartuchos de fita magnética, gravadas ou virgens (para serem gravadas). Foi uma revolução no campo das gravações. Em 1969 , residindo em Jales (SP), comprei um toca-fitas (contrabandeado do Paraguai) para ser instalado em carro (tinha então um Galaxie 500). Não cheguei a instalar, pois usava uns cartuchos enormes, e havia poucos no mercado. Vendi o aparelho para Matsuo Nakamoto, colega do banco.
Adquiri, em 1973, um aparelho Panasonic, com rádio, dispositivo para tocar long-plays e fitas K-7. Estava sendo lançada a série de aparelhos conhecida como “3 em 1”, ou seja: rádio (AM, FM e Ondas Curtas), toca-discos e toca-fitas. No toca-discos, desapareceu por completo a rotação 78 RPM, agora só toca long-plays de 12, 10 e 7 polegadas, nas rotações 45 ou 33,3 RPM. O toca-fitas já era da tecnologia das fitas K-7, abreviaturas de “cassete”, que dominou o mundo.
Na década de 90, outro salto na reprodução dos sons: o aparecimento do Compact Disk, pequeno disco de 5 polegadas, com gravação de até uma hora de duração, conhecido abreviadamente por CD. Técnica a lazer, que não me pergunte como funciona.
Em 1998, nova troca de aparelhos. O “3 em 1” foi doado à oficina de eletrônica da Sociedade de São Vicente, e no seu lugar entrou um aparelho Phillips, que oferece quatro opções de uso: rádio, toca fitas e CD player e toca-discos. O rádio agora só sintoniza estações FM e AM e ondas médias. Não tem mais ondas curtas. O toca-fitas é “double-deck”, isto é, tem dois toca-fitas, sendo que um é também gravador de fitas. No toca discos (e este será, certamente, o último aparelho com toca-discos) as opções de rotação são de 45 e 33,3 RPM. E o CD player é simples, tem capacidade para apenas 3 CDs, enquanto que já existem no mercado aparelhos que recebem até 10 CDs, para execução, sem interrupção, de mais de 7 horas de musica.
Agora,no início do terceiro milênio, chega este aparelho DVD player, cuja função principal é passar filmes gravados em DVD, mas com função secundária de tocar CDs. Com a vantagem de ser programável: pode-se determinar uma seqüência diferente das músicas, repetir músicas, etc. Destacar instrumentos ou vozes, enfim, uma complicação para quem, como eu, só quer mesmo é ouvir uma boa música enquanto trabalha ou faz sessões de Reiki.
Quanto aos discos... bem, isto já é assunto para outra crônica.
ANTONIO ROQUE GOBBO –
Belo Horizonte, 28 de novembro de 2002.
CONTO # 189 DA SÉRIE MILISTÓRIAS