As Escolhas da Vida

Meu nome é José tenho 72 anos, caminhava pelas ruas da grande capital sozinho, minha família insistia para que eu não fizesse isso, estavam sempre me alertando sobre os perigos da Cidade Grande. Não fazia o que me pediam, eles não paravam de dizer que sou teimoso, mas a verdade é que sempre preferi ter fé nas pessoas.

Não gosto de julga-las, sabemos que os atos de cada uma são reflexos do que elas passaram na vida, não é segredo para ninguém que ela não é fácil e mesmo assim cada um de nós tenta viver do seu jeito.

Nesse mesmo dia em que refletia caminhando pelas ruas movimentadas do centro, onde a pobreza era muito grande, havia mendigos em todos os quarteirões, usuários de drogas e ao mesmo tempo havia executivos, doutores, pessoas perante a sociedade bem sucedidas e eu me questionava porque esse tipo de coisa ocorria.

Por trás de cada pessoa existia uma história, tanto por trás dos olhos famintos quanto por trás dos olhos deslumbrantes pelo sucesso. Imaginava que muitas daquelas pessoas não tiveram oportunidade para ser alguém na vida e se tivessem uma oportunidade de fato elas aproveitariam ou jogariam fora? Um fato que ocorreu comigo nesse mesmo dia me fez entender um pouco mais sobre o rumo que cada pessoa tomava na vida.

Naquele mesmo dia um homem com grandes olhos azuis, colocou uma arma na minha cabeça, seu rosto ficou registrado na minha memória. Enquanto ele gritava – velhote me passa todo o dinheiro que você tem aí! Enquanto o assaltante gritava várias pessoas passava por nós e não faziam exatamente nada, movidas pelo medo e pelo conformismo de uma situação como essa que ocorria diariamente. – Meu jovem, porque está fazendo isso com um velhote como você mesmo disse? - Falei tranquilamente como se conversasse com um amigo. – Preciso de dinheiro, será que você não entende? Passa a grana logo ou sofrerá as consequências. – O Assaltante começou a apertar ainda mais a arma em minha cabeça tentando me assustar. Por fim fiz uma última pergunta para ele – Você já pensou em trabalhar e ganhar o seu próprio dinheiro ao invés de roubar o dinheiro que cada pessoa conquistou com o seu esforço para ganhar? – A vida não é fácil como você pensa velhote. Vi uma lágrima escorrer dos seus olhos, ele tirou a arma da minha cabeça e atirou em minha perna – vi os seus olhos sofridos e amargurados olhando em minha direção enquanto caía no chão, ele se virou e saiu correndo sem levar nada apenas minha compaixão daquela alma, enquanto a dor latente em minha perna e em minha alma por ter vivenciado uma situação como essa me fizeram desmaiar.

Comecei a movimentar minhas mãos para ter certeza que ainda estava vivo, antes de abrir os olhos ouvi a voz terna de um homem dizendo – Que bom que acordou. Ainda sem abrir os olhos perguntei para aquela voz amiga – Onde estou? – Está no Hospital, acabou de sair do CTI, o Sr. levou um tiro na perna em um assalto, pensamos que não resistiria mas o Sr. é um velhote muito forte. A palavra velhote pronunciada daquela forma me pareceu familiar, resolvi abrir os olhos, mesmo com dificuldades de enxergar devido a claridade, percebi que o era o médico do Hospital quem conversava comigo, vestia roupas brancas e com as suas palavras podia me transmitir uma paz. Minha visão foi desembaçando, então pude ver o rosto do médico, aqueles olhos azuis penetrantes, me pareciam ainda mais familiar. Fiquei muito confuso nesse instante – O Sr. tentou me assaltar e quase me matou, agora está salvando a minha vida? – O médico ficou desconcertado com a minha pergunta – Me desculpe Sr. estou de plantão nas últimas 24hs não existe a menor possibilidade de eu ter tentado tirar sua vida. – Esses olhos azuis... Não pode ter sido outra pessoa. O médico estava envergonhado enquanto eu falava – Posso imaginar o que aconteceu. – Se o Sr. puder me esclarecer ficarei grato – estava aguardando uma resposta do médico – Tenho um irmão gêmeo, ele infelizmente resolveu seguir o caminho da marginalidade, peço sinceras desculpas pelo que ele fez com o Sr. – Como é possível dois irmãos seguirem caminhos tão diferentes? Um se tornou um médico o outro um assaltante e se eu tivesse morrido também seria um assassino.

- Peço que não julgue o meu irmão, fomos criados juntos e passamos por uma vida miserável – Senti a dor do médico ao pronunciar aquelas palavras. - Vejo que esse assunto lhe faz mal, não precisa continuar me contando se essa for a sua vontade. - Depois do que lhe aconteceu, vou contar para que não carregue uma raiva eterna do meu irmão, procure ao menos entendê-lo. - A vida me ensinou a não guardar raiva das pessoas, quanto a isso não se preocupe – fui compreensivo com o médico. - Eu insisto em contar. Nós fomos criados por uma família muito pobre, nosso pai nos abandonou quanto tínhamos três anos de idade e logo minha mãe colocou outro homem dentro de casa. O nosso padrasto bebia muito e ficava muito agressivo, ele batia em mim e no meu irmão gêmeo sem motivo éramos apenas crianças, nós estávamos sempre com o corpo marcado com hematomas e arranhões.

Fiquei chocado ao ouvir a história daqueles rapazes. – E a mãe de vocês não os defendia?

- Ela tentava, mas ele não tinha dó de ninguém batia nela na nossa frente, às vezes preferíamos não contar para ela o que ele fazia, para ela não sofrer as consequências, cada roxo nos olhos da mamãe doía mais em nós do que nela mesma. O homem que ela chamava de marido foi ficando cada dia mais agressivo até provocar a morte de nossa mãe, então aos 14 anos fomos para um orfanato.

- Lamento...

- Não lamente isso aconteceu faz um bom tempo, e tudo que aconteceu em nossa vida foi o que determinou o nosso futuro. Enquanto no orfanato meu irmão tentava fugir, não queria saber de estudar, era expulso das aulas e ainda por cima estava sempre metido em brigas. Ele só fazia o que aprendeu dentro de casa, brigar, roubar, matar e não ter respeito com nada nem ninguém.

Eu estava realmente comovido com a história daqueles jovens. – Vejo que a vida não foi fácil para nenhum de vocês, o que fez você tomar um rumo oposto do seu irmão?

- Tudo que me lembrava do meu padrasto, me fazia a cada dia querer ser o oposto dele, sempre fiquei longe de brigas, procurava respeitar as pessoas como eles ensinavam no orfanato e a vontade de ser alguém na vida me fez estudar ainda mais, quando tinha um tempo livre ficava estudando, ao sair do orfanato consegui uma bolsa na faculdade para cursar Medicina, me formei há pouco tempo. Hoje tenho a profissão dos meus sonhos, enquanto meu padrasto carregava uma morte em suas costas, por ter tirado a vida da nossa mãe, consegui se o oposto dele, pois tenho uma profissão que me permite ajudar as pessoas salvando vidas.

A história dos gêmeos me fez refletir, entendi que por mais que a vida não fosse justa, precisávamos escolher um caminho a seguir, o sofrimento pode te jogar no buraco ou te fortalecer. Duas pessoas foram criadas da mesma forma e hoje um dos irmãos tem uma vida bem sucedida enquanto o outro leva uma vida miserável, os irmãos fizeram escolhas diferentes um deles usou como desculpa tudo que haviam passado para levar uma vida na criminalidade enquanto o outro optou por dar a volta por cima e ser alguém melhor que o exemplo que tivera na infância.

A vida é feita de escolhas por isso cabe a cada um de nós fazer as suas e jamais se esquecer das consequências.

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Isabela Pimenta
Enviado por Isabela Pimenta em 18/04/2014
Reeditado em 18/04/2014
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