P A S S A G E I R O S II

A sociedade

Eu estou deitado num tipo de maca dentro de um quarto estranho. Minha cabeça está doendo e sinto que há algo preso em meu braço esquerdo. As luzes não são tão fortes, mas, quando tento abrir os olhos, uma forte vertigem me faz querer vomitar. Aos poucos vou me adaptando à luz e então consigo ver que o que está me incomodando é uma agulha ligada à uma bolsa de soro. Não faço a mínima ideia de onde estou, só sei que não é a cúpula e isso por enquanto me agrada. Tento me colocar sentado mas acabo falhando. Meu corpo está cheio de arranhões e percebo que a minha perna direita está engessada. Agora que a observo uma dor bem chata aparece e desejo não ter olhado para ela. Estou fraco. Provavelmente desidratado, por isso o soro. Lembro-me que fiquei tempo de mais sem comer e beber água. Minha garganta está seca e só percebo agora que pensei em água. Vejo uma jarra sobre a mesinha ao lado. Eu não me dou ao trabalho de pegar o copo e me servir, simplesmente apanho a jarra e tomo toda água que tem nela. Não devia ter feito isso, minha barriga está pesada agora. Estou arrependido. Não sei quando terei água de novo. E se estiver envenenada? Espero o efeito de o veneno me abater mas nada acontece. Estou errado, não havia nada de mais além de água. Afasto o pensamento e tento me concentrar no que pode ter acontecido. Uma lembrança fraca começa a se manifestar para mim e antes que eu a perca me agarro a ela como se dependesse disso para viver. Então, entendo onde estou.

“Tone. Alguém está gritando meu nome. Eu olho ao redor até que vejo Brendon entre as árvores bem ao longe. Estou saltando a grade em volta da cúpula e correndo para a floresta. Os aviões se aproximam e começam a atirar em todos até que a bomba é liberada. Estou correndo como um louco entre as árvores e elas estão dobrando atrás de mim. Penso que vou morrer e não demora muito até que eu tenha certeza disso. Brendon está gritando que há um desfiladeiro à frente, antes que suas palavras sejam concluídas, Maria se joga sem muito pensar. Por um minuto eu acho que ela é uma completa maluca, mas, não tenho tempo de processar pois outros estão repetindo sua ação. Estou apavorado, quero parar para tomar ar e não quero seguir para o desfiladeiro, mas a poeira está queimando meus pulmões. Não consigo respirar e não vejo outra saída se não saltar. Corro mais depressa rumo ao abismo, ergo os meus braços e me jogo. Não acredito que estou caindo tão depressa para a morte. Não me atrevo a abrir os olhos. Não quero ver o chão se aproximando. Certamente doerá menos se eu me manter de olhos fechados, mas, tudo muda e estou errado. Eu sinto minha perna bater contra uma estrutura endurecida. Eu poderia berrar tamanha a dor que sinto, mas, estou imerso por água. Uma água salgada. Tento abrir meus olhos agora mas água os queima como brasa. Preciso lutar para chegar a superfície e tomar ar antes que meus pulmões sejam esmagados. Sinto que vou desmaiar. Meu corpo não me obedece e a droga da perna dói cada vez. A profundidade em que estou está esmagando meus tímpanos. A água começa a entrar involuntariamente em meus pulmões e sei que a morte agora será inevitável. Uma questão de tempo, mais uma vez me entrego.

Estou sobre a terra, sinto areia de praia entrando cobrindo meu corpo quando as ondas quebram em mim. Não consigo entender como cheguei até aqui, mas isso é o que menos me preocupa nesse momento. Ouço vozes vindo em minha direção e não posso correr pois estou impossibilitado devida a droga da perna. Devem ser os guardas da cúpula. Penso. Os aviões sobrevoaram o resto do perímetro e perceberam que houve fugitivos, eu sou um deles e agora eles estão vindo para me matar. Não, pior que isso, iriam me prender e me torturar, se quisessem minha morte eles teriam me deixado afogar no mar. Afogar! Estou tossindo forte e expelindo o resto de água salgada que ficou em meu peito. As vozes estão se aproximando, eles irão me torturar! A última coisa que sinto é meu corpo sendo arrastado para qualquer lugar.”

A lembrança vai embora. Levanto-me num ímpeto e ignoro a perna quebrada e as demais dores em meu corpo. Eu arranco a seringa do meu braço e me apoio na mesinha para não cair. Respiro fundo. A porta! Estou me arrastando rumo à porta. Preciso escapar. O chão liso facilita minha locomoção. Eu alcanço a maçaneta. Está trancada! Mas que droga. Alguém está vindo. Mais de um. Estão rindo. Talvez se eu voltar para a maca e fingir estar inconsciente eles me deem mais um tempo, assim, poderei elaborar outra fuga, mas, não... A jarra! A jarra está vazia. Irão perceber que acordei. Estão girando a maçaneta. Não tenho mais tempo. Arrasto-me o mais rápido que poço até a mesa e pego a jarra, depois faço um esforço absurdo para me por de pé e vou para trás da porta.

Quando o primeiro homem entra, eu salto sobre ele e o acerto com a jarra. O material de vidro se estilhaça. Ele tomba para o chão e antes que poça reagir estou tateando a procura de um caco maior de vidro que poça usar como arma. Encontro-o, porém, não tenho tempo de usá-lo. Estou sendo imobilizado por trás e começo a gritar insultos para os dois. Vejo o homem que acertei levando a mão ao bolso. Está sangrando. Acertei-o em cheio na cabeça. Só agora percebo que está usando roupa comum. Não é um guarda. Ninguém na cúpula trajava aquele tipo de roupas. Mas não poço ficar pensando nisso. Ele está tentando apanhar alguma coisa, uma arma provavelmente, mas não, estou errado, não é uma arma, é uma carteira. Então ele quase a esfrega na minha cara, depois, afasta-a para que eu poça ler. Está escrito “UFOLSECRETS - LABORATÓRIO SECRETO DE UFOLOGIA” e em baixo sua identificação “Marcos”. Não estou entendendo muita coisa mais sei o que significa ufologia. Meu coração está desacelerando. Percebo que eles não querem me machucar, pelo menos temporariamente. Certamente, querem algo mais. O homem que está me imobilizando solta o meu braço e estou aliviado. Ele está me chamando pelo nome, mas, não pode ser! O timbre é familiar, mas, não. Tomara que não. Quando eu me viro tenho uma surpresa. É mesmo o Brendon. Ele também tem uma carteira de identificação. Está no bolso de sua camisa. Ele me pede calma, mas, não consigo. Estive errado. Não era um homem simples que precisava de emprego. Tinha algo mais. Interesse. Estou com raiva de mim por ter acreditado nisso. Embora tenha me ajudado a fugir eu quero socar sua cara. Não perco tempo e assim o faço.

_Salvei sua vida. – Grita para mim.

_E agora o que quer em troca? –Atiro essas palavras para ele no mesmo tom.

Brendon está olhando para mim com reprovação. Sinto que ele esperava gratidão de minha parte e talvez o deva mesmo, porém, sei que essa ajuda não será de graça. A raiva não me permite raciocinar no momento. Tudo que quero é poder socar mais a cara dele.

_Vocês trabalham para a NASA?

_Não seja idiota. – Expressa rudemente Marcos. – Eu poderia partir a cara dele também, porém, já estou cansado e a perna tratou de me conter logo. Afasto-me dos dois. –Queremos relatos. – Completa. – Você é um dos passageiros. – Sua expressão é de um lunático agora. – Eles existem não é mesmo? – Pergunta.

Eu sei do que ele está falando. Os extraterrestres. Minha vida certamente será isso agora.

_Sim. Eles existem. – Respondo em tom agressivo. –Por isso fiquei preso e quase fui morto. –Disparo. – Não vou relatar nada. Já colheram todas as informações sobre o que aconteceu.

_Já disse que não fazemos partes nem estamos vinculados a nada do que você pode ter sofrido naquela cúpula.

_Ótimo. Mesmo que seja verdade não vou relatar mais nada. Quero minha família. Além do mais, os oficiais não querem que a verdade seja contada.

_Eles não os donos do mundo! – Marcos Vocifera.

_Concordo. –É só o que digo.

_Então? –Quer saber ele.

_Eles tem poder. –Completo.

_Nós também temos poder.

_Então sugiro que pegue sua família e corra para a terra mais distante que conhecer. É o que pretendo fazer.

_Porque sugere? –Ele está me olhando bem nos olhos agora.

Não posso responder a essa questão se não nunca me deixaram sair. Vão exigir detalhes e estou cansado de ser interrogado: _Eles irão nos perseguir e nos matar. –Desvio o foco da pergunta.

_Você já está morto e agradeça por termos providenciado isso. – Marcos me surpreende ao dizer essas palavras. Sinto como se tivesse levado um tiro no peito. Eu estou olhando para ele e tenho vontade de agredi-lo assim como agredi ao Brendon, mas, dessa vez me contenho, ele ainda não acabou e preciso ouvir o que ainda falta com esperança de que não seja o que estou pensando.– A essa hora você ainda estaria preso e provavelmente, desidratando lentamente até morrer à mingua. Não fosse por nós, nunca mais veria a luz do sol. Acha mesmo que iriam se desfazer tão rápido assim da fonte de pesquisa deles?

Minha cabeça está girando rápido de mais e sinto que vou cair. Lentamente me coloco rumo à maca e me sento. Não tenho certeza se ouvi direito. Então, para que não reste dúvidas eu pergunto sobre o que ele está falando. Estou apreensivo. Minhas suspeitas aumentam. A resposta está ecoando em minha mente, mas, espero até que ele diga, talvez eu esteja errado! Não tenho tanta sorte. É exatamente o que pensei.

_Nós bombardeamos a cúpula. – Diz ele.

Eu estou partindo para cima dele e distribuindo socos, quero mata-lo, mas, não tenho chances. Brendon está enfiando uma seringa em meu pescoço e estou sonolento agora. Luto para me manter acordado. Eles estão discutindo. Olham para mim. Brendon está me carregando de volta para a maca. Meu corpo não me obedece.

_Por quê?– Pergunto meio grogue. –Eram inocentes. –Completo com dificuldade.

_Não poderíamos salvar a todos. Eles precisam acreditar que estão mortos. –Ele responde com calma.

_Por quê? –Volto a perguntar.

_O mundo precisa saber. –Diz Marcos.

_Nos matarão ao menor sinal de ameaça. – Estou quase dormindo.¬

_Não se tivermos a imprensa ao nosso lado. – Ouço a voz de Brendon distante.

_Não teremos chances...

_Deixe conosco. Nesse momento, apenas descanse.

Ainda não sei se sinto ódio ou compactuo com eles, sacrificaram inocentes, porém, preciso concordar com uma coisa, as pessoas precisam saber que o mundo mudará completamente assim que a terra for invadida. Meus sentidos estão falhando e eu desisto de ficar acordado, além do mais, preciso mesmo descansar, precisarei de forças quando acordar.

C O N T I N U A . . .

Héryton Machado Barbosa
Enviado por Héryton Machado Barbosa em 01/04/2014
Reeditado em 01/04/2014
Código do texto: T4752489
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