Dor de Pai
Dor de Pai
Meu prato vazio. Escondia-me num canto da casa, não queria que meus filhos vissem aquilo. Dividi o que tinha com meus três filhos, acho que era o suficiente para aquela noite. Hoje faz cinco dias que não como nada. Amanhã bem cedo vou olhar as armadilhas pra ver se algum lagarto caiu, seria uma benção um pouco de carne.
A chuva demora demais, esse ano está ainda pior.
Meus filhos estão fracos, tristes, a morte do caçula de colo deixou uma ferida aberta. Enterrei nos fundos da casa. Minha mulher ainda chora a noite, e a mim, só é reservada a dor no peito. Não tenho tempo, os outros ainda vivem e vou conseguir que assim seja.
Eu ouvia do rádio que as coisas no meu país estavam melhorando, que o progresso estava chegando. Devo estar longe demais. A pilha acabou, assim como a comida, assim como a saúde que vai aos poucos.
Minha fé está acabando.
Acho que somos os escolhidos, viver aqui é provar todos os dias o valor de se estar vivo. Espero que essa noite passe logo, olhando a lua e esse céu cintilante de estrela, fico imaginando o por que do amor de Deus comigo ser tão grande.
Um calafrio corre minha espinha.
Abençoado seja esse pedaço de chão seco, abençoada seja minha casa, que eu seja digno de viver. Amém.