Final do dia, final de tudo

Cecília chegou a casa exausta. Mais um dia de trabalho e os alunos não estavam interessados em aprender nada. Do jeito que estava a situação, ela não tinha motivação para dar aulas. E ainda haviam muitas coisas pela frente. Marido e filhos queriam sua atenção. Ela, tentando fazer as coisas da melhor forma possível, sempre dedicava grande parte de seu tempo à família.

O tempo que dispunha para si mesma era curto, já quase madrugada, e a exaustão tomava conta de seu ser. Sempre optava por dedicar um momento para si mesma. Precisava refletir, ler alguma literatura ou livros relacionados à sua profissão.. Mas o que a estava ocupando no momento era a sua situação pessoal, íntima. As coisas não iam bem dentro dela. Uma ânsia misturada à insatisfação com o todo de sua vida. Mas não via saída. Ela sempre cumpria com as coisas que designava para si mesma. Nada era feito de forma obrigatória, somente a partir de opções suas:

Ah, eu me dispus a ser mãe em tempo integral e uma pessoa tolerante com os erros deles e do marido. Afinal, a vida é tão curta e a nossa verdadeira existência é tão maior do que isso. Não, eu preciso levar até o fim a missão de ser o esteio desta casa. Às vezes me pesa um pouco e acabo absorvendo as tensões deles, mas não há ninguém em quem eles confiem além de mim. Ao passo que eu não possuo com quem dividir as angústias, o medo, o peso da vida, o cansaço, a necessidade de um tempo para mim mesma.

Quando eu me dispunha a descansar, sempre um deles vinha me procurar para desabafar, pedir ajuda. Meu marido até para comprar um carro, conversa comigo antes. Meus filhos desabafam desde os aborrecimentos e alegrias do trabalho e estudo até questões amorosas. E a mim sempre cabe ouvir e deixar que eles cheguem às próprias conclusões, já que não posso decidir a vida de ninguém. Sempre falo que não estarei aqui para vê-los na maturidade e que cabe à cada um optar pelo que é melhor e mais adequado ao perfil deles.

Enfim, o dia tinha que ter 48 horas para mim. Mas tudo bem, pelo menos não sou uma inútil completa em minha casa.

Enquanto isso as questões de foro íntimo vão ficando para trás, sem solução, por falta absoluta de tempo. Às vezes penso em viajar sozinha e passar uns dias isolada, eu comigo mesma. Mas a consciência deixa? Só me resta dar risadas.

Bem, amanhã é outro dia. Vou tomar um delicioso banho, colocar uma roupa confortável e ver o que ainda me aguarda no dia de hoje.

Saí do banho revigorada e fui procurar algo para comer. Pensei em como tudo estava quieto, cada um ocupado com suas coisas. Pelo jeito terei um pouco de sossego. Hum, vou terminar de ler o livro da Nélida. Ou seria melhor um filme? Tantas opções que fico perdida. Ai, estou novamente tonta, o maldito choque na cabeça. Sinto os músculos do ombro e do pescoço retesarem-se, causando muito desconforto. Parece estar pior do que das vezes anteriores. Estou perdendo a audição e somente visualizo tudo nublado. O que está havendo? Eu tomei todos os medicamentos hoje ....

E, como um fantoche, despencou no chão dando fim à sua existência e angústias.

Campos dos Goytacazes, 14 de março de 2014 – 10:43 horas

Emar
Enviado por Emar em 14/03/2014
Reeditado em 14/03/2014
Código do texto: T4728262
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