Prefácio no alto de uma Marquise

(Projeto de um novo conto, novas partes se seguirão)

E no fim eu não era nada além de um escritor suburbano,

sem estilo... Desconhecido.

Eu não me importava, no entanto.

Foi o que pensei sentado naquela marquise, a vários metros do solo.

Escrever era o que eu mais gostava de fazer, apesar de ter uma vida paralela, que eu tentava conciliar com minhas aventuras amorosas e bebedeiras.

Beirava os trinta, por mais que não sentisse, ou entendesse o que aquilo significava.

O que se espera de um homem com aquela idade?...

A capacidade de assumir responsabilidades, constituir uma família, criar filhos...

ter um emprego fixo.

Eu não tinha nada disso naquela altura.

Eu sequer conseguia me fixar com uma mulher por mais de dois ou três meses.

As mulheres que nasceram depois de mim pareciam estar mais adaptadas ao nosso tempo, onde os relacionamentos são descartáveis e de curta duração.

Eu estava sendo freqüentemente superado por elas...

Raramente eu deixava uma delas por minha vontade, simplesmente pelo fato de que eu não me envolvia com mulheres que não queria manter ao meu lado por muito tempo.

Então me acostumei a vê-las entrar e sair de minha vida, assim como entravam e saiam de minha cama para buscar um copo d’água.

Nunca me incomodei com aquilo.

Na verdade, no começo me sentia perdido. Sofria, embriagava-me, escrevia e isolava-me do mundo. Com o tempo me acostumei, as despedidas foram ficando cada vez mais indolores e os finais menos dramáticos.

Um homem deve saber aproveitar o melhor de uma mulher

no tempo em que ela quer lhe dar o melhor de si.

e deve também saber evitar o pior, mesmo que isso signifique uma separação.

Acredito que me tornei bom naquilo.

Eu as amava enquanto era possível e as deixava ir quando não era mais.

Algumas retornavam, me amavam novamente,

algumas se tornaram figuras recorrentes em minha vida e em meus textos.

Mas nenhuma delas se demorou muito... É fato.

tenho certeza que boa parte delas sequer lembram-se de minha existência...

Outras, acredito que, guardam certo rancor. Principalmente as primeiras.

A juventude e a imaturidade são como álcool. Tornam tudo mais intenso... Tornam o amor mais fácil.

Mas quando somos jovens, somos incapazes de ver a realidade e de dar valor a coisas simples.

Tendemos a dar importância a grandes coisas, a planos complexos.

e São tantas as certezas...

‘Quanto mais certezas você tem, mais estúpido você é’

Meu pai me disse algo assim certo dia.

É fácil ignorar as palavras dos mais velhos quando se é jovem... Mas um dia você percebe o sentido por trás delas.

É como rever um filme que se viu na infância anos depois, e só então perceber a ‘moral da história’ com muito mais riqueza de detalhes.

Hoje eu consigo olhar para trás e perceber muitos dos meus erros e as conseqüências que eles geraram, as estradas por onde me levaram e que no fim, aquilo tudo era inevitável.

Fazia parte do meu aprendizado.

Mas isso é uma idéia espiritualista da coisa. Um pensamento quase indiano de evolução e de moralidade.

Dane-se a evolução espiritual neste momento.

Tendo a me perder em minha própria prolixidade de vez em quando. Perdão por isso. Mas, voltando ao assunto... Acredito que hoje lido muito melhor com meus enroscos emocionais.

Sim, emocionais... Porque não?

Qualquer mulher que não me conheça pode me classificar como um polígamo (para não usar outra palavra) machista e superficial.

Mas me vejo como algo distante disso.

De certa forma, amo todas as mulheres que levo para cama.

Deixo com elas boa parte de mim. Por isso às vezes me sinto exausto e procuro solidão.

Talvez para recarregar, ou para poder ser ‘Eu mesmo’ sem ninguém a criticar meus hábitos estranhos e meu estilo de vida.

E eu estava num daqueles momentos,

sentado numa marquise de um prédio em decomposição...

Não era um momento suicida. Não nego que fosse um risco a minha vida, - devido ao meu estado de embriaguez- mas eu não tencionava matar-me, como você talvez tenha pensado inicialmente.

Essa idéia ainda não tinha passado pela minha cabeça naquele ponto.

A bebida acabara e resolvi descer do prédio, antes que começasse a chamar atenção dos passantes.

Andei até minha casa, abri a geladeira, peguei uma cerveja e resolvi que devia escrever minha história quando acordasse.

E foi assim que começou esta narrativa.

Ou melhor... esta colcha de retalhos.

Rômulo Maciel de Moraes Filho
Enviado por Rômulo Maciel de Moraes Filho em 07/03/2014
Código do texto: T4719663
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