Andresa
Andresa é uma balzaquiana de beleza mediterrânea, embora eu duvide que tenha sangue grego ou se os pés já pisaram as verdejantes colinas da Arcádia. Tem olhos melíferos, claros onde as pupilas pequenas lhe emprestam um penetrante olhar de leoa. Eu a desejo e talvez ela até desconfie disso, embora nunca tenhamos trocado palavras. Eu a tive em meus braços por duas vezes e acordei abraçando e beijando a escuridão do quarto por duas madrugadas seguidas, solitário entre minhas secreções.
Seu corpo magro e de anca eqüina passeia fazendo da calçada uma passarela e eu seu voyeur mais assíduo. Um dia, uma quarta feira, descobri nela o imprevisível. Talvez soubesse da minha timidez, talvez tivesse jeito em lidar, descortinar o que é em mim secreto. Aproximou-se com um sorriso mavioso e olhando de perto seus lábios polpudos e rosados decidi serem próprios de uma Cleópatra habituada aos melhores grãos de uva do oriente.
Devo ter expressado minha timidez, deixei que ela falasse. Foi prosaica, e eu confuso, não lembro se me perguntou sobre o preço do jornal do dia ou de uma revista de tricô, o fato é que não pude resistir aquele fétido hálito de jejum com uma cárie antiga, um odor indeciso entre o enxofre e o leite talhado. Resisti, ela não levou nada, arrumou sobre nariz fino o ray-ban e partiu enquanto eu agradecia em voz baixa, em meio a náuseas, sua retirada. Respirei fundo para acalmar meu estomago vulcânico e enojado e decidi que se novamente sonhasse com a rapariga não seria um sonho, mas sim um pesadelo