Véspera
Véspera
Nesses dias uma ponta de tristeza lhe manchava o olhar, uma centelha que nunca se apagava, deixando um ar melancólico que, se não estivesse presente por longos anos, pareceria estranho naquele rosto gentil. Naqueles olhos a vida brilhava tanto quanto a morte, talvez por desejar ambos na mesma intensidade. Como se a morte lhe liberaria da vida ou a vida lhe libertaria da morte. Esperava... não sabia qual grilhão iria ser solto e, talvez, fosse essa espera que lhe conferia esse ar sempre aborrecido.
Era um estado de espírito constante que às vezes era posto de lado: quando chovia, quando via uma criancinha rindo, um passarinho se banhando numa poça, quando ouvia a risada da mãe, um bom dia inesperado... Mas, tão logo se dava conta que uma luz estava prestes a lhe entrar o coração, nuvens se formavam, dissipando essas imagens as escondendo em meandros daquela mente inquieta. Nunca lhe perguntamos, com certeza não saberá dizer o porquê disso tudo, e nem quando começou. Mas ao olhá-la, assim, não dá vontade de perguntar nada, só de afirmar que vai passar. Que - um dia - tudo isso há de ter um fim... E que hoje pode ser a véspera do último dia triste.