Angelica
Angelica respirou fundo para sentir o cheiro bom do verão.E verão tem cheiro minha gente?Claro que tem, não é só a primavera com suas fl9res que cheira bom.O verão tem o odor da chuva nas terra molhada, de sol bem quente na nossa carne, de suor ardido, de cheiro de gente.No inverno só as essências se sente no ar, mas agora, no verão, é a vida cheirando no ar.Quantos verões Angelica cheirou?Tantos, que é melhor não contar.Agora, o tempo dela é diferente , não existe mais a trepidação da juventude para sempre perdida.Ela não gosta de pensar em "sempre", mas, tem coisas que não se pode evitar.
Angelica acompanhou o tempo até no seu nome.Quem hoje se chama assim, a não ser gente velha e aquela mocinha da TV. Há anos que não encontro um bebê com este nome, nem menina, nem mocinha, só velhas...velhas?Porque empregar esse nome de coisa jogada fora para gente?Não, nunca mais pensarei em Angelica como velha, ela pode ser uma mulher bem vivida no tempo, mas, velho é trapo, e Angelica não é trapo na vida.
Que coisa boa e meter aspernas nas águas claras do rio que passa...engraçado este sempre foi o mesmo rio da sua vida, ela esta gasta e o rio sempre novo na renovação das suas águas .As pernas de Angelica estão sem graça, pele seca, descorada, que não atraem nenhum olhar de cobiça.Ela acha bom mesmo e juntar nas mãos em concha aquela água fria e joga-la nos cabelos e no rosto.Ela cairá em gotas que o sol quente farão brilhar, que brilho sem graça em Angelica, é brilho de palha, é brilho de cêra.Ela fecha os olhos verdes e as rugas em volta tecem umas renda fininha, igual aquelas que ela fazia no tempo do colégio das freiras.As rendas eram lindas, mas as rugas não são.
Um ventinho frio arrepia as águas rasas do rio e as pernas sem depilar de Angelica.Para que depilar gambitos desbotados?Destraida ela escorrega no fundo de pedras lisas e cai de inteiro na água.O vestido gruda no corpo seco e nos peitos achatados, agora, pode então deitar e rolar nas águas, já esta todas molhada mesmo.Afunda o rosto e enche a boca de água, depois espirra longe.Doce lembrança de criança.Um pássaro pia no alto, outro e mais outro.Festas de passarinhos.Ela está feliz!Bate os braços e as pernas sem rumo, só na alegria de se sentir viva.
Lógo uma canseira vai tomando o seu corpo, não pode mais fazer tantas estrepolias, mas, tão pouco quer pensar sobre isso.È melhor ficar deitasda, bem quieta, só olhando o céu, faz de conta que é menina, a moça de antes.È cedo ainda, e hoje terá um dia cheio.Irá a aula para aprender com as freiras a bordar, fazer conta e rendas, aquelas que fazem lembrar as rugas.A noitinha, ficará na janela olhando a praça, esperando ele passar.Anos depois, ainda espera um discreto cumprimento, uma tirada do chapéu, um olhar.Quando ela for dormir na sua cama estreita, mas onde cabe todos os seus sonhos, pensará nele.Um dia, talvez, ele tomara coragem e baterá na sua porta,então haverá alegria e paz.A espera durou hum ano, dois, um tempão, tanto, que transformou-se em uma vida e nada aconteceu.
O vento agora tornou-se mais forte e Angelica sentiu friio.O sol foi sumindo e muitas nuvens escuras que trazem chuva, toldou o céu.Em um momento caiu chuva grossa que misturou-se as águas do rio.Dos olhos de Angelica rolaram lágrimas e o rio foi ficando cheio.Inutil ficar pensando no que poderia te sido mas, não foi.Aquela é a Angelica real, feia, sem gaça, cor de papel amassado de casrtas antigas, escritas, mas não enviadas, de vidasonhada e não vivida, do que podia ter gozado, ilusões efêmeras que o tempo carregou.
Angelica saiu do rio e tomou a direção de sua casa.Alguem poderá ve-la naquele estado e comentarão entre risos, que Angelica é doida de pedra, que não tomou jeito até hoje, agora não toma mais.Não importa o que pensem, o que falem, Angelica tem o seu mundo de "faz de conta" e nele é feliz.Ela não conseguiu curtir a sua vida, mas ainda consegue sonhar...
.