Do que existe
O que existe entre a gente não é meu e não é teu. Não é muito. Não é o vertiginoso abismo em teu lábio. Não é tua fotografia maculada por meus dedos trêmulos. Não é meu afã, não é minha afasia. Não é, tampouco, a gregária desconstrução de tudo que resiste entre a gente.
Entre a gente reside o perpétuo impasse. Tu recolhes os olhos e me olhas. Mas com que bocas tu me chupas? Com que discernimento tu me aniquilas? Acaso são tuas essas bocas? Acaso é teu esse discernimento? Entre a gente: todo o Oceano Índico, toda anarco-soberania, toda disjunção atormentada. Entre a gente, toda herança que se perde, todo o fatalismo que se supõe. Entre a gente há o ressentimento, o amor, a indiferença, a fúria, a tosse e, outra vez, o amor inteiramente ferido em suas dignidades. Tu permaneces austera e selvagem diante de teu pires de leite. Indevassável.