FATO DE MINHA INFÂNCIA

Sou o décimo filho de 13 filhos de minha mãe. Morava na roça, conhecia pouca gente, era muito tímido e nunca havia saído de perto de minha família.

Certo dia uma prima minha chegou lá em casa e pediu pra minha mãe pra deixar um de seus filhos ir com ela na casa de sua irmã que morava em outra fazenda. Minha mãe então olhou pra nós e apontou pra mim, me senti como se estivesse sendo escolhido para ser executado. Ela disse: leva esse que é menos teimoso, está aí á desvantagem de ser bonzinho, não consegui dizer nada, só sacudia a cabeça dando sinal negativo, mas minha disse: deixa de ser bobo menino, você vai é passear, só que se teimar ela pode te bater. Pronto, agora estou ferrado, afinal, vou aonde? Com quem vou dormir? E se eu tiver pesadelo? E se eu fizer xixi na cama? Essa mulher pode me matar que ninguém vai me defender.

Chegou à hora de partir, meus olhos começaram encher de lágrimas, mas consegui engolir o choro, pedi a benção a minha mãe e saí. Andamos uns 10 quilômetros de bicicleta até chegar ao ponto de ônibus, nisso minhas pernas já estavam dormentes que quase não conseguia andar. Depois de algum tempo chegamos á cidade, que lugar mais estranho, quanta gente, eu estava assustado, minha prima pegou na minha mão e saiu me arrastando e dizendo: deixa de moleza menino. Andamos uns 10 minutos, não sei ao certo. Fomos para a casa de outra irmã dela. Isso já era quase noite, a mulher serviu o jantar. Ela tinha um filho, colocou comida pra ele e disse: se você não comer tudo vai apanhar. Que estranho lá em casa apanhávamos para parar de comer e não pra comer. Minha prima colocou comida no prato. Lembro que ela colocou chuchu e jiló, eu nunca havia comido jiló e nem chuchu, mas confesso que estava tão assustado que nem senti o sabor dos alimentos, engoli sem mastigar. Pensei que não ia dormir, mas o cansaço foi maior que meu medo. Aquela cama era tão cheirosa, pois as lá de casa tinha cheiro de urina. Na madrugada acordei com minha prima me sacudindo, acordei assustado e saímos pela rua até que chegamos a uma casa e paramos ao lado de um caminhão cheio de latas de transportar leite. De repente apareceu um homem e nos mandou subir na carroceria do caminhão cheio de latas, ventava muito e fazia muito frio. Depois de quase uma hora chegamos à casa da tal irmã de minha prima, ela tinha a cara ruim, era recém-casada, não tinha filhos, a sensação que eu tinha é que ela era uma bruxa e ia me preparar no jantar. Ficamos lá por dois dias, foram os dois dias mais longos de minha vida, lembro que eu chorava escondido. Quando íamos voltar para casa, passamos de novo na casa da irmã de minha prima.

Não me lembro o que ela falou para seu filho, só sei que ele a respondeu com falta de educação e foi para o quarto e bateu a porta com força. O pai dele apareceu e já foi tirando o cinto e disse: vou ensinar esse menino a ter educação. Ele entrou para o quarto atrás do menino. Fiquei muito assustado ouvindo o barulho do cinto e dos gritos de socorro do menino, me senti num filme de terror. Nessa noite já tive mais dificuldade para dormir e chorei tanto que molhei o travesseiro com minhas lágrimas. No outro dia chegamos em minha casa, foi maravilhoso sair daquele pesadelo e ver minha mãe e meus irmãos de novo. Nunca esqueci aqueles dias e nem os gritos daquele menino, por isso odeio pessoas que maltrata crianças. Jamais obrigo uma criança a fazer algo que ela não queira a não ser algo necessário. Dou liberdade pra que elas se expressem seus medos, seus gostos e suas vontades.

Luiz Marcino
Enviado por Luiz Marcino em 06/12/2013
Código do texto: T4601645
Classificação de conteúdo: seguro