5 minutos
Cinco minutos. Não é muito. Poderia ser dez. Vinte. Uma centena de minutos. Não há diferença. É um ato de incompletude. Tu permaneces imóvel, dispersa em sono brando. Concentro-me apenas em teu fôlego. Constato: vives, respiras. Inteiramente humana. Não sei explicar-me. Não sei explicar-te. Tu estás tão presa e tão frágil. É a prisão do sono que te retém pálida diante da cegueira de toda nação. É uma orquestra de panos rotos que te fazem uma carícia nos seios, sem a menor ilusão de simetria. Eu? Sou um homem sem enredo, se tanto. Enredado apenas em teu corpo de rapariga escancarado na cama. Não. Sou menos que um homem. Sou uma alegoria de fumaça, um mal-assombro. Não posso tocar-te ou perceber-te o perfume. Não há tempo. Para mais nada há tempo. Todo tempo que havia, passou: agora sou uma entidade pós-tempo. Cinco minutos de lívida contemplação. Em breve acordarás, tens a mocidade inteira pela frente. Mas isso eu não posso ver. Apenas cinco minutos. Tu abres os olhos e eu não existo. Perco tua mobilidade mais graciosa. Só tenho-te quase morta, entregue a algum sonho ignoto.
Como me encanta a neutralidade de teu sono! Dói-me a impotência fantasmagórica. Quantas vezes já desejei trocar de lugar um objeto qualquer de teu pequeno espaço de existência livre? Somente para imaginar uma sutil ruga em tua testa. Muitas. Ou um recado em teu espelho. Algo que me denunciasse homeopaticamente. Um leve movimento que não pudesse te servir de álibi. Mas para mim, termina em cinco, quatro, três, dois, um. Acordaste. Até amanhã.