ENTRE O BARRO E O CIMENTO - TERCEIRA JUSTIFICATIVA

Terceira e última justificava

Viu na televisão o garoto que espancou a própria mãe com um cabo de vassoura? Onze anos, não era viciado em nada nem estava bêbado. E o adolescente que jogou a cadeira na professora? Faz uns dois meses que aquele – como era mesmo o nome? – que aquele doido jogou os filhos gêmeos num latão de lixo. Lembra o caso do pai (Faz pouco tempo.) que matou o filho só para não ter de pagar pensão alimentícia à ex-esposa? Posso passar o dia inteiro citando exemplos de tudo aquilo que meus filhos não são nem poderiam ser. Poderia, perfeitamente, exibi-los em praças públicas como estátuas falantes para que dessem aulas gratuitas de como se tornar o homem ideal para a sociedade. Já sei: acha que estou exagerando? Faça um teste com um deles. Não precisa ser o mais velho, não, quem a maioria julga ser um homem especial e bibibi, bobobó, pode ser o caçula, ou o do meio.

Entretanto tudo tem seu preço. E paguei o meu bem alto e à vista. Não me orgulho de ser a mãe que sou e tampouco de ter sido a que fui. Não me orgulho mesmo! Só dos meus filhos me orgulho. E não me aflige a opinião do leitor a meu respeito, se é que já tem ou terá alguma. Não vivo minha vida para agradar quem quer que seja, nem mesmo os meus próprios filhos. Se eu autorizei a publicação de fatos relacionados a mim, é porque acredito existir neles algo digno de ser sabido por todos e, sobretudo, copiado. Negativo, senhor narrador, sinceridade é uma coisa e humildade é outra. É intolerável àquele que se propõe a dizer a verdade ficar com medinho daquilo que as pessoas vão pensar. É incabível aqui falsa modéstia. Se eu tiver de usar o recurso da ironia ou algo do tipo “encobrir a verdade com uma ou duas camadas de mentira” para que o leitor não se assuste com o que seus olhos verão, então prefiro rasgar em mil pedaços esta página. Ainda pergunta por quê? Ora, porque assim o leitor estaria sendo enganado. Não tenho responsabilidade alguma com a linguagem: tenho apenas com o que digo, e não com o modo como digo. Este é um problema exclusivamente seu, narrador.

Despeço-me agradecendo por esta rara oportunidade de diálogo franco com aquele que nos vai ler. Uma pena ter sido esta a primeira e última vez, porque as coisas mais importantes jamais são postas em páginas de livro.

Alexandre de Jesus
Enviado por Alexandre de Jesus em 08/10/2013
Código do texto: T4516951
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