Tá Fazendo Frio

Chove e faz frio em SP. É fim de tarde.

Ele veste azul. Acolhe-se dentro da enorme jaqueta. Levanta. Tranca as janelas. Acende a lâmpada fria de luz esbranquiçada. Ele não sabe se está triste, chateado ou apenas bravo. Acende o isqueiro e passa a ponta de cada dedo, um por um, no alto da chama. Um calorzinho que desatina das engrenagens pequeninas do fino objeto retangular, encontrado no metrô. Estação Consolação. "Consolação", repete para si mesmo, esboça um sorriso.

Era madrugada, ele vestia cinza. Inconsolável na Consolação. Gente jovem, cheiro de cigarro. Ébrios. Boêmia forçada. Vazia. A moça loira de meias pretas deixou cair da bolsa o pequeno isqueiro prateado. Ela usava um enorme casaco de pele sintética.

Era noite, ele não vestia nada, fechado em lugar nenhum. O outro lhe diz que foi bom, que foi na sexta-feira, que era um menino "bonitinho e interessante". Ele lhe pergunta o nome. O outro não responde, continua a falar de todos os outros, um por um.

Só mais um. "Só mais um", estava nas entrelinhas. Agora ecoava e repetia-se no ar, como a fumaça do cigarro da puta. Da dona do isqueiro. Gargalhada de gralha, perfume barato.

Só mais um, com o pequeno objeto reluzente. Frio de lâmina de faca.

WsCaldas
Enviado por WsCaldas em 27/08/2013
Código do texto: T4454281
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