Sábado, na balada

Eu te juro, não faço ideia de por que me deixaram arrastar para cá. Sim, são meus amigos, eu não os vejo faz tempo. E também alguns outros amigos deles e aí viemos cair todos na balada, mesmo não sendo o nosso forte. É um ambiente que não me é familiar e nunca foi. Quero dizer, eu gosto das músicas que tocam, esses “techno” e “trance”. Até o “dubstep” é legal em certos momentos, mas não todos, eu tenho a impressão de que ele me emburrece. Talvez seja por isso que as pessoas curtem melhor o som quando estão chapadas. Outra coisa que eu nunca entendi, desde a minha adolescência quando ia vezenquando nas matinês de baladas no domingo à tarde, eu nunca entendi isso de pegação. Óbvio que não vai ser hoje que eu vou pegar alguém, não, eu sou o cara que fica com uma bebida na mão, num canto, observando as pessoas dançarem e beijarem, tudo isso enquanto acompanho as batidas das músicas com a perna. Esquerda.

Não entendo a pegação, quero dizer, a mina tá na dela e de repente chega um cara e... do nada eles se beijam. Eu não sei, talvez tenha uma alma muito antiga, mas se eu não entendia como isso funcionava antes, muito menos agora que tenho alguma moral e idade. Nós homens geralmente não temos muito sucesso quando somos mais jovens. Então envelhecemos e, como o vinho, ficamos melhores, mais sábios, mais atraentes. Cabelos grisalhos não são um problema para nós, pelo contrário, ficamos mais charmosos com eles. Ás vezes até mesmo carecas conseguimos ficar bem. Já a mulher, bem, ela sabe que a hora dela vai chegar, as coisas vão cair e depois de certa idade é só ladeira abaixo. Hoje existem cirurgias que dão uma força, mas elas nunca terão a tenacidade da juventude. Por isso, enquanto jovem, muitas vezes, a mulher é vida loka, sai pegando geral enquanto ainda pode, enquanto ainda não arranjou um marido. Não que homens não façam isso, não, eles fazem, mas a ideia é diferente. E, como disse, eles só ficam melhores quando mais velhos. Tipo depois dos 30. Coisa que não se encontra em baladas. Enquanto as menininhas novas são deliciosas e, se não se cuidarem, logo mais não o serão. E sabe qual é o maior problema delas? É que a concorrência é muito grande.

Digo mais uma vez, eu hoje sou melhor do que o era no passado. Ou eu acho que sou, pelo menos eu agora tenho o que conversar, consigo ser interessante. Se for preciso eu dou uma enrolada e finjo que sou inteligente. Hoje eu tenho idade, uma graduação, um emprego... alguns fios brancos e uma calvície aparente, é verdade, mas eu não sei se isso seria de todo mal. Talvez seja. Outra coisa que eu nunca entendi nesses ambientes de balada é a conversa, seja ela pré ou pós pegação. Veja, a situação é quase animalesca: a mina, a fêmea, está lá, dançando, exibindo seus dotes, suas curvas, suas boas roupas e pernas torneadas de muita academia. Ela quer chamar atenção do macho, e convenhamos, não existe algo no mundo mais fácil do que chamar a atenção de homem. Então, chega um pretendente! Eles dançam e, lá pelas tantas, em questão de poucos minutos, o cara agarra ela e tenta beijar. Duas coisas podem acontecer: 1) o cara leva um fora e a menina não o beija. Ou 2) eles se beijam, mas só porque ELA quer. Pois, como é sabido, em todas das formas de relacionamento sentimental, quem escolher o parceiro é sempre, SEMPRE, a mulher. Depois de eles se beijarem, duas coisas podem acontecer: 1) eles se separam, o cara vai atrás de outra e ela continua a dançar até possivelmente surgir uma nova oportunidade. Se acontecer isso,tudo bem. Ou não, ou 2) eles realmente se interessaram um pelo outro e querem se conhecer melhor. Veja, isso é um brasileirismo, nem em todos os lugares do mundo as pessoas se beijam antes e depois se conhecem. Aliás,é por isso que as brasileiras são mal vistas no exterior. Ou bem vistas,não sei,enfim, são vistas como muito fáceis, ponto. Não sei como eu nunca me dei bem com uma dessas... eu te juro, eu estou no Brasil.

Daí o casal vai conversar, e, serei repetitivo e já peço desculpas desde já, eu não entendo, como podem conversar em meio à pista!? Tem quem consiga desenvolver uma conversa. Eu não consigo, vai ver é esse o meu problema. Ou então, eles se afastam do som muito alto e vão para o bar ou algum lounge, onde a música é apenas alta. De novo, não consigo entender como conversam assim. Ou não, vai ver eles só vão pra lá para terem um pouco de intimidade e um conforto maior, uma mão boba aqui ou ali, sabe como é, estando sentados eles conseguem esconder melhor o corpo. Eu não sei, nunca passei por isso.

Aliás, eu disse antes que pareciam rituais animalescos o que acontece em meio a uma balada, e é verdade, eu aqui, no meu canto, com a minha bebida ouvindo a música de todos, eu me sinto como se assistisse ao Animal Planet. Existe todo o processo de o macho se dar conta da fêmea, se aproximar, tentar um contato, ser aceito ou rejeitado... se rejeitado o cara é feio, ou a menina só “foi pra dançar”. Dizem que existe esse tipo de gente. E ainda existe o cara que é rejeitado sem nem ter tentado chegar nas meninas, aí sim eu entendo como é e me encaixo! Em outras vezes as meninas não estão nem aí e beijam mesmo quem quer que apareça. Seja por vontade, seja por bebida, seja por doce, bom, você não tem como saber... talvez a bebida sim. Outro motivo pelo qual eu não me dou bem é porque eu não sou interessante. Veja que eu estou sendo muito camarada comigo e estou desconsiderando o fato de que sou feio, tai outra coisa que jamais saberei e, mesmo se soubessem, as opiniões podem variar. De qualquer forma, eu não sou interessante, não sou o tipo de cara das meninas que frequentam esse lugar. Eu não ganho bem, eu não tenho um baita carro e... não sei mais o que pessoas que elas acham interessantes fariam. Eu sou na minha, vivo no meu quarto, jogo videogame e leio gibis. Mesmo que eu fosse ter algum papo com alguma garota, ela não iria se interessar. Entende por que eu sou rejeitado sem nem mesmo tentar.

Mas o contexto é de balada, e, sendo assim, estamos num ambiente em que o visual importa demais. Na verdade,fora dela e em todo qualquer lugar isso é verdade, mas aqui, mais ainda. Em se tratando de relacionamentos interpessoais, a primeira impressão é sempre a que fica. E claro que você nem sempre precisa ser quem realmente é. Você pode construir um personagem, dizer que tem um sim baita carro, um grande apartamento, que mora sozinho, etc, você pode se vestir com roupas que geralmente não usaria, pode treinar gestos e tudo o mais. Aí você consegue sair do zero a zero. Mas convenhamos, viver uma mentira não é algo legal. Tem quem goste, quem aguente e que simplesmente não liga. Eu não consigo ser assim e por isso estou aqui relatando tudo o que acho e desacho.

É um mundo que não é meu. Não faço parte. E uma adaptação seria uma mentira. Melhor assim.

Bom, a bateria do note está acabando. Talvez seja hora de eu encerrar esse texto. “Mas que tipo de gente traz notebook pra balada!?” É, acho que isso explica muita coisa sobre meus fracassos baladeiros. Entenda, se eu não o tivesse feito, esse texto não teria saído. É algo que eu venho pensando ao longo de anos de... bom... de tentativas – frustradas – de me enturmar nesse meio festeiro e que eu só consigo lembrar quando estou imerso nesse ambiente. Tive de vir para cá para, de uma vez, botar nas linhas tudo o que me vem à mente quando me encontro deslocado. E com música eletrônica alta e um pouco bêbado e com muitas meninas bonitas à minha vista. Às quais nunca trocarei nada mais que um olhar despretensioso, isso SE ela der a sorte de olhar pra mim olhando pra ela. No mais, é isso. #zeromina

-G-

GaP
Enviado por GaP em 25/07/2013
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