Seu Antônio
Encontra-se perto da praça central; faltam-lhe pouco mais de duas quadras para chegar à casa de uma família que preza muito. São pessoas para as quais trabalha há vários anos. Estarão na cidade? A dúvida atemoriza-o. Com o calor, podem ter ido para a praia. Espera que não; se assim for, terá perdido o seu tempo.
Na hora em que deixou o consultório, deveria ter voltado para casa; sua mulher, com certeza, seria a pessoa mais indicada para prestar-lhe atendimento. Viu passar um ônibus, logo seguido por outro, ambos apinhados de gente naquele fim de tarde. Desanimou. Bem que Marta tinha querido vir com ele ao médico; dispensou a sua companhia, seria necessário deixar as crianças na vizinha. Ao sair para o centro, estava se sentindo um pouco melhor. Marta acompanhou-o até a porta, cheia de dedos. "Estou bem, mulher." Sabia que não a enganava. Mas, era um jeito também de convencer a si mesmo. "Vai com Deus", disse ela em voz baixa, entreabrindo um sorriso.
Quando chegou à rua, depois de cumprida a missão, já escurecia. Era a primeira vez, pelo menos na sua vida adulta, que comparecia a uma consulta médica. Não fora iniciativa sua; tinha passado mal quando pintava a fachada da mansão do doutor. No dia seguinte, a indisposição continuava. Mandou o servente tocar o trabalho e foi procurar ajuda no pronto-socorro. Perdeu cinco horas na brincadeira. Prescreveram-lhe antibióticos que pioraram a situação. Devia estar com uma aparência muito ruim no dia em que o doutor chegou para o almoço e viu-o dando instruções para o companheiro. "Passe mais tarde no consultório, seu Antônio, quero examinar o senhor. Lá pelas seis horas, sim? Pode ir, o resto fica para amanhã."
Está difícil atingir a casa de seus conhecidos. Aquela conversa de internação, bateria de exames e não sabe o que mais aperta-lhe o peito. Se parar, como ficará a família? As crianças? Quem vai pôr comida na mesa? Pagar as contas? O que poderá fazer a mulher, com dois filhos ainda pequenos? Deus do céu, o que será de tudo que vem construindo com trabalho tão puxado? O seu futuro, o futuro deles, como será?
Dá uns passos vacilantes, tentando não bater nas pessoas que cruzam com ele. Está diante da igreja cabeluda, uma obra que o intriga. Várias vezes, ao olhar para a igreja toda verde a partir da primavera, ficou pensando se as paredes poderiam resistir muito tempo a tanta planta. Agora, a construção vai mergulhando nas sombras.
Oscila, para a frente, para trás. A igreja, feito um enorme monstro escuro, parece investir contra ele. Agarra-se a um poste, em busca de socorro. Logo ele, que já enfrentou de tudo na vida. Menos essa falta de força nas pernas. Fulmina-o a sensação de que vai desabar. Nada mais.
Abre os olhos. Figuras brancas deslizam pelo ambiente, inundando-o de paz. Estará vivo ou morto? Cerra as pálpebras e fica ouvindo uma espécie de música, distante e suave, como que tocada pelos anjos.