"CONTOS DE CEMITÉRIO" (PARTE 01). Conto de: Flávio Cavalcante

CONTOS DE CEMITÉTRIO (PARTE 01).

Conto de:

Flávio Cavalcante

A MENINA

Em conversa com um coveiro de um determinado cemitério da cidade, conheci fatos que realmente me deixou atônito. Ele relatou-me tanta história no decorrer dos seus vinte e poucos anos de trabalho no ramo que me deixou impressionado.

José Venâncio da Silva é o seu nome de batismo. Há vinte e poucos anos atrás, estava desempregado e não conseguia arranjar um trabalho para alimentar seus cinco filhos, frutos de dois casamentos, fora do atual. Além de pagar pensão de mais duas crianças que estavam sendo criadas pelas mães.

Pelo fato do seu desemprego, Zé Venâncio, como era chamado pelos parentes e amigos, passava um perrengue pelas ameaças de suas ex-mulheres que tentavam se vingar daquele homem por não admitir o relacionamento da nova empreitada em sua vida e o ameaçava de jogá-lo na cadeia caso não pagasse a pensão no determinado valor que elas estavam impondo.

Depois de andar muito á procura de emprego, finalmente, Zé Venâncio chegou num cemitério e resolveu entrar só por questão de não perder a viagem. Não sabia ele que ali estava o que ele tanto procurava.

Já faz mais de vinte anos que José Venâncio trabalha como coveiro neste cemitério e consegue mostrar em seu semblante a satisfação e o orgulho do seu trabalho. Foi exatamente com este cidadão que tive uma das grandes entrevistas sobre fatos que aconteceram nas noites de solidão dentro daquele lugar que para algumas pessoas se trata de um ambiente macabro.

José Venâncio me contou toda a sua vida. Parecia que a gente já se conhecia há séculos. Ele disse que teve vários fatos que aconteceram entre as catacumbas nas altas horas da noite. Falou que no começo, foi difícil, pois passou alguns meses, impressionado e chegou a um ponto que bastava ouvir um uivo de um cachorro para ele sair rasgando tudo que encontrasse pela frente de tanto medo. Mas por não ter opção tinha voltar ao seu trabalho, mesmo tendo que enfrentar o medo. Mas dentre muitos, teve um fato que marcou a vida do coveiro.

Segundo ele, era uma tarde chuvosa e o lamaçal dentro do cemitério estava dificultando o sepultamento de uma garotinha de oito anos de idade. Os pais da garota choravam demais desconsoladamente por si tratar de sua única filha. Cena que para o Venâncio era um fato normal na sua trajetória. A menina faleceu depois de uma imensa febre e Venâncio não quis entrar em detalhes com os pais por eles estarem em estado de choque.

Carinhosamente, José Venâncio como um excelente profissional, fez toda aquela cerimônia para enterrar o corpo da pobre menina. Assim foi feito o que ele já fazia de olhos vendados se fosse preciso.

Tinha bastante gente nesse velório. O corpo desceu á sepultura rasa. Hoje em dia não é como antigamente, que era cavado sete palmos de um buraco para enterrar um corpo. No atual, basta cobrir o caixão, ta tudo certo, (Delatou o coveiro como numa brincadeira). Puseram flores ao lado da cova e finalmente chegou o final da cerimônia. Todos começaram á deixar o local com guarda-chuvas armados. Josè Venâncio precisava concluir o seu trabalho, deixando tudo ok.

Chegou um determinado momento que ele ficou solitário do lado da cova. A chuva deu uma trégua. José Venâncio, um fumante inveterado, acendeu um cigarro e sentou em cima da cova, degustando cada tragada e sem pressa alguma. Repentinamente ele ouviu um choro bem longe e começou á procurar de onde vinha aquele som. Continuou fumando o seu cigarro. Novamente ouviu o choro. Foi quando ele caiu na real que se tratava da menina que ele acabara de enterrar. Desesperado, ele pegou sua pá e começou á tirar a terra fofa do buraco novamente na intenção de salvar a vida da menininha. Chegou finalmente no caixão. Aí veio a surpresa. A garota realmente estava viva e na hora da agonia em que ela acordou dentro do caixão. Usou de todas as suas forças, quebrando os lacres do féretro, mas a luta do coveiro foi em vão. A menina ainda ficou com as mãozinhas no lado de fora, mas morreu asfixiada. Ele contou isso com os olhos cheios de lágrimas. Falou que mesmo já tendo passado bastante tempo ainda o atormenta esta cena muito macabra e chocante.

Flávio Cavalcante

Flavio Cavalcante
Enviado por Flavio Cavalcante em 14/07/2013
Código do texto: T4386230
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