A última ficção científica
O primeiro registro foi no Observatório de Antares, no Brasil, no século XXI. Raimunda Santos, observadora de uma noite de outubro de 2013, detectou no telescópio um objeto estranho e inédito no espaço sideral dirigindo-se à Terra. A novidade logo virou manchetes de jornal pelo mundo todo. Astrofísicos se reuniram para identificar o objeto e o grau de perigo para os terráqueos. Conseguiram calcular a velocidade, a massa e o formato do corpo: era um objeto metálico, tinha um formato cilíndrico pontiagudo e flexível, medindo 5 mil km2 de base e 832 metros de altura, pesava 720 mil toneladas, e chegaria à Terra em 2 anos e 3 meses, caindo no Oceano Atlântico.
Em janeiro de 2016, o objeto entrou na atmosfera terrestre. Foi filmado e divulgado e ficou popularmente conhecido como minhocão de ferro. Era tão grande que obstruiu a luz do sol em diversas cidades. Sim, os astrofísicos tinham acertado quase todos os cálculos, menos a localização da queda do objeto, porque não houve queda. O minhocão de ferro sobrevoou o céu terrestre por três semanas e meia, fazendo ziguezagues e semicírculos no ar. Após rodar o mundo duas vezes, desceu para o solo, na Antártida.
A aterrissagem foi desastrosa. Abalou o ecossistema antártico e influiu sobre outras partes do mundo. Vários indivíduos de vários espécimes foram mortos na aterrissagem. Muitos blocos de gelo se quebraram. Houve uma quantidade de calor nunca detectada antes no Polo Sul, o que provocou um considerável derretimento de gelo e inundou alguns litorais do planeta; alguns desinformados pensaram se tratar de efeitos do aquecimento global. Não. Era o começo de um desastre mais abrupto, desesperador e, por muito tempo, acreditou-se: irreversível.
O minhocão levou dezessete dias parado na Antártida. Muitas pessoas se dirigiram para lá nesse período; queriam pano para manga nos noticiários e nos periódicos. Instalaram diversas câmeras para vigiar o que aconteceria. Nesses dezessete dias, o objeto esfriou; assumiu a temperatura ambiente do Círculo Polar Antártico. No décimo sétimo dia, abriu-se um buraco redondo no teto do minhocão e dele saíram voando estranhas máquinas. Foi a primeira vista dos maquinoides na Terra.
Maquinoides foi como ficaram conhecidos aqueles estranhos seres. Eles eram brancos ou cinzentos e tinham um formato trapézico tridimensional. Voavam com hélices em suas bases e possuíam enormes lanças de metal que cravavam sobre o chão quando pousavam ou em alguma parede. Desvendou-se, muito tempo depois, que eram feitos quase que completamente de metal e pouco carbono. Uma esquisita forma de vida. Eles eram muitos, incontáveis.
Espalharam-se por toda a Antártida. Depois de explorarem bastante o continente, atravessaram o Oceano Glacial Antártico e foram em direção à África. Da África, atravessaram o Oceano Atlântico e foram para a América do Sul. Depois disso, subiram, tomando a América Central, América do Norte e Alaska. Do Alaska, seguiram para a Groelândia, depois foram direto para a Eurásia. Sempre viajavam em comboio e sempre ficava uma enorme quantidade deles pelo caminho. Em aproximadamente dez meses, estavam espalhados por todo o planeta. Não havia lugar algum onde não fossem vistos. Seus ambientes preferidos eram cachoeiras e ondas do mar; pareciam gostar de água agitada. Também se aglomeravam em torno de tempestades, tsunamis e lugares ventosos, mas sempre viviam em terra firme. Uma gama imensa deles povoou a Linha do Equador e o Deserto do Saara.
No começo, a humanidade se dividia em relação àquele acontecimento. Muitos diziam se tratar do fim do mundo. Outros, mais céticos e menos apocalípticos, diziam se tratar de uma invasão alienígena não ufológica. Era consenso dos noticiários que os maquinoides eram inofensivos, nada faziam contra a humanidade. Mentira. Eram seres homicidas, que atacavam seres humanos aleatoriamente, sem razão aparente. Os primeiros homicídios, no entanto, não interessaram aos veículos de imprensa. O primeiro homem que eles mataram foi, ainda na primeira passagem pela África, um namibiano que praticava caça esportiva. Alguns jornais locais noticiaram, mas nada foi dito ao resto do planeta.
No Brasil, foi registrado um ataque no Morro do Dendê; os maquinoides atacaram e mataram alguns traficantes, em pleno tráfico. Na Floresta Amazônia, um garimpeiro foi igualmente morto enquanto garimpava. Alguns mexicanos foram mortos enquanto tentavam cruzar as fronteiras para os EUA. Na Eurásia, morreram alguns manifestantes radicais do ETA e alguns islâmicos que admoestavam uma mulher desvirtuada.
– A justiça finalmente chegou neste mundo. – bradavam alguns.
As opiniões se inverteram dois anos após a chegada deles, em 2018, quando um avião foi atacado por vários maquinoides e, dentro dele, estava o Secretário-Geral da ONU. Todos no avião morreram. Esse acontecimento fez emergir vários outros ataques a pessoas consideradas de bem, que já tinham ocorrido antes, mas sem qualquer notoriedade. A partir de então, estava certo de que os ataques não obedeciam nenhum juízo moral. Ser honesto ou desonesto, pobre ou rico, influente ou desconhecido, nada fazia diferença. A qualquer momento, um ser humano qualquer poderia ser atacado.
Não havia formas de escapar. Maquinoides voavam mais alto que qualquer avião ou helicóptero. Além disso, eram altamente sensíveis à vibração de corpos. Qualquer movimento, qualquer pequeno atrito era captado por um maquinoide a decâmetros de distância. E quando atacavam, tinham alvo certo. Em uma lavoura de tomate dos Estados Unidos, por exemplo, um agricultor, percebendo que seria atacado, pensou que poderia se livrar do ataque jogando um de seus empregados na frente. Inútil. O empregado foi ignorado pelo maquinoide, que apenas o empurrou para fora do caminho e matou o agricultor. Na Polônia, uma mãe tentou proteger seu filho de apenas quatro anos; ela se jogou na frente do maquinoide, agarrou o filho e o embalou por completo com seu próprio corpo. O maquinoide arrancou-a de perto do pequenino e o matou.
A preocupação tornou-se geral. Evolucionistas temiam a extinção da espécie humana. Ambientalistas, a extinção de espécimes da fauna e da flora (baseados no acontecimento na Antártida). Sociólogos passaram a falar abertamente sobre o problema da redução de comunidades e desaparecimento de culturas. Assim começou uma luta. Químicos estudaram e desenvolveram diversos materiais corrosivos para tentarem lançar contra os maquinoides, mas nenhum funcionou. Investiram na produção de uma bomba nuclear, que foi jogada contra alguns, que nada sofreram e até pareceram ignorar a tal bomba. Todas as armarias e máquinas de guerra foram utilizadas, mas todas as investidas bélicas resultaram em absoluta derrota e ainda mais matança de seres humanos. Alguns comandos militares produziram armas com propriedades magnéticas que retardavam o avanço de um ou dois, mas eram inúteis contra um bando, e eles eram muitos e muito gregários.
Era muito difícil obter informações sobre eles. Apreendê-los era impossível, porque eram mais ágeis que qualquer tecnologia humana. Além disso, aproximar-se deles era um perigo não só porque eles podiam atacar, mas também por causa do que veio a ser chamado de sonoridade maquinoide: eles emitiam um jato de fumaça branca, acompanhado de melodias musicais altamente desagradáveis aos ouvidos humanos. A fumaça liberada provocava uma terrível micose em quem estivesse por perto, além de reações alérgicas em algumas pessoas.
Um informe interessante veio cerca de trinta anos depois, em 2050, no Japão, quando um maquinoide caiu no chão, completamente enferrujado e com movimentos bastante lentos. Naquele momento, os maquinoides que estavam por perto aproximaram-se e fixaram suas lanças no que estava caído; pareciam o estar eletrocutando; na verdade, estavam sugando o restante de energia que lhe sobrava e, ao terminarem, uma hora depois, abandonaram-no, já completamente sem movimentos. Dois anos depois, foi registrado o mesmo acontecimento na Guatemala e, depois disso, soube-se de outros anteriores, que tinham ocorrido, muitos anos antes, na Jamaica, no Paquistão e na Guiné-Bissau. Os maquinoides caídos nunca mais levantaram. Foram apanhados para estudo. Depois de alguns anos, foi consenso: eles eram seres vivos e aquele estranho acontecimento era a morte deles.
Com o tempo, a humanidade foi se acostumando a conviver com os maquinoides. O medo foi ficando menor, pois os ataques eram avulsos, e ocorriam, em média, uma vez a cada três meses e quase sempre matavam uma única pessoa. Depois de muito tempo, as pessoas entenderam que de nada adiantava não sair às ruas, porque os maquinoides achavam um ser humano onde estivesse. Então, as pessoas continuaram seguindo sua vida de maneira ordinária. O medo continuou, mas tornou-se um medo conformista.
Os anos foram se passando e a batalha continuava. A luta para derrotar aqueles seres se tornou cada vez mais desesperançosa Tudo o que se inventava de bélico falhava. As tentativas de estudar o funcionamento social e orgânico dos maquinoides traziam pouquíssimos resultados. Por muitos anos, várias agências de fomento à investigação científica, no mundo inteiro, investiram pesado em qualquer pesquisa sobre eles; ofereciam a graduandos de iniciação científica bolsas mais altas que a de um doutorando mais ordinário, bastava que tematizassem os maquinoides em suas pesquisas.
E muitas pesquisas foram desenvolvidas assim. Em 2060, uma bióloga argentina, Julieta Alonzo, criou um programa de pesquisa para investigar a fumaça dos maquinoides; o programa detectou bactérias e alguns tipos de fungo. O mesmo programa descobriu que o fungo já se proliferava independentemente dos maquinoides. Em 2066, os Estados Unidos – país onde havia o maior índice de infecção pelo famigerado fungo – suspenderam o bloqueio econômico a Cuba, depois que o médico cubano Alberto Torrez desenvolveu um antimicótico eficiente e, por razões políticas, ele e o governo cubano se negaram a compartilhar a descoberta com o resto mundo.
Entre as Ciências Humanas, várias dissertações, teses, artigos e ensaios foram muito bem financiados. Na área de Letras, alguns teóricos desenvolveram o conceito de “literatura maquitemática”, que classificava toda e qualquer ficção que tivesse como tema central os maquinoides. Na História, a chamada Idade Contemporânea chegou ao fim, sendo prosseguida pela Idade Pós-Contemporânea, ou, para alguns autores, Idade do Medo. Na Antropologia, muitos pesquisadores descreveram e interpretaram a influência da presença maquinoide nas diversas culturas. Na Pedagogia, discutiu-se a inclusão dos maquinoides no currículo escolar. Na Psicologia, a russa Lisa Dominik desenvolveu uma terapia eficiente para crianças que tenham visto seus pais serem mortos por um maquinoide.
Em 2077, o músico australiano Ash Sympson defendeu sua tese de doutorado sobre a sonoridade maquinoide. Ele coletou gravações de cinegrafistas amadores e reconheceu notas, descreveu melodias e compassos em partituras. Alguns anos depois, sua tese virou livro.
Houve, assim, nas diversas áreas, muitas pesquisas. Porém, poucos resultados práticos. Com o tempo, essa falta de resultados foi se tornando o comum e o esperado. Os valores de financiamento foram diminuindo; com isso, o interesse em estudar os maquinoides também. A humanidade foi ficando desesperada; e a ciência, descreditada.
No século XXII, não existia mais o Prêmio Nobel de Ciência e ninguém mais sabia o que era uma ficção científica. A última tinha sido escrita em 2092, pelo peruano Hermano González. Em seu ultra-book, intitulado “Enfim, livres!”, uma outra civilização invadiu a Terra, derrotou os maquinoides e foi embora. Foi um fiasco. Dos pouquíssimos que leram, quase todos se sentiram agredidos pela sensação de falsa esperança provocada pelo ultra-book. Depois disso, González continuou sua carreira como escritor, fazendo um relativo sucesso em seu país, mas dedicou-se aos livros policiais e de suspense, sem mencionar maquinoides novamente.
O dado mais precioso sobre os maquinoides aconteceu em 2123. O antropólogo holandês Jeroen Jansen estudava a comunidade pirahã, na América do Sul. Enquanto inquiria um membro da comunidade, assustou-se com a presença de dois maquinoides sonorizando e liberando fumaça. O homem pirahã, no entanto, aparentou não ter medo algum.
– Eles estão conversando. – disse o pirahã, em sua própria língua.
– Por que você acha isso? – perguntou o antropólogo, curiosíssimo.
– Nenhum deles faz isso sozinho. Só se houver outro por perto.
Jansen não deu tanta atenção ao caso. Por cinco anos, ele não mencionou a questão, apenas pensou nela de relance, sem fazer muito além de observar. Sempre que dois maquinoides sonorizavam e liberavam fumaça, Jansen ficava olhando e confirmando para si mesmo a constatação do homem pirahã. Em 2128, apresentando uma palestra sobre os resultados da sua pesquisa, ele exemplificou a constatação do pirahã para mostrar como um homem sem instrução, sem estudos científicos, sem contato com o mundo dito civilizado, conseguiu perceber, ordinariamente, algo tão coerente sobre os maquinoides. Esse foi um parêntese aberto durante sua palestra que chamou atenção de tal forma, que, em uma semana, líderes políticos do mundo já discutiam a nova informação.
Naquele mesmo ano, o linguista chinês Lee Lin retomou a obra de Ash Sympson, entrou em contato com a universidade australiana – Sympson já havia morrido, àquela altura – e reouve as filmagens. Observou que as notas tinham significado: elas seguiam uma sequência lógica e quase sempre uma determinada sequência estava associada a uma iniciativa ou atitude ou fato. Os maquinoides sempre sonorizavam de um jeito quando algum deles morria; de outro, quando estavam prestes a atacar um ser humano; de outro, quando seguiriam em viagem. Estava descoberta a língua maquinoide: música.
Descoberta, não desvendada. Vários linguistas, antropólogos e teóricos da música se reuniram num programa de pesquisa dedicado à linguagem e à comunicação maquinoide; chamava-se Pro-Licomaq, e reunia pesquisadores da Angola, da Austrália, do Brasil, Estados Unidos, China, Inglaterra, Japão, Rússia e Turquia. Levaram dezenove anos para conseguirem elaborar uma comunicação mínima. Antes disso, houve várias tentativas sem resultado, com a produção de algumas melodias que nada comunicavam aos maquinoides. Em 2140, após muito estudo, conseguiram emitir uma melodia, arriscando a um deles uma pergunta: “Quem é você?”
O maquinoide deu a resposta prontamente. Porém, só se chegou a um consenso de decodificação e interpretação da resposta em 2147; o maquinoide havia respondido que era um indivíduo de sua espécie e que era oriundo de... Não se sabia completamente o que queria dizer a sequência sonora seguinte; acreditou-se, por alguns anos ainda, que era a identificação do planeta. Em 2162, após muitas observações da interação entre maquinoides, descobriram que a sequência não decifrada era o cálculo da distância entre a Terra e o planeta de origem deles. Estava descoberto como davam coordenadas.
Com o passar dos anos, foram se revelando mais e mais elementos da língua maquinoide. Mas não foi fácil nem rápido. Aos poucos, foi possível formular diversas perguntas, que sempre eram prontamente respondidas por qualquer um deles. Descobriu-se a razão deles estarem na Terra: eles alimentavam-se de energia elétrica e as fontes no planeta de origem deles estavam se esgotando. Isso esclareceu a razão da preferência deles por cachoeiras e ondas martítimas, e porque tantos se aglomeraram no Deserto do Saara: era uma fonte inesgotável de energia solar. Também se descobriu porque atacavam e matavam seres humanos: às vezes, precisavam de energia emergencialmente, algo produzido por seres humanos quando estão agitados.
Os maquinoides se mostraram bastante comunicáveis. Eram capazes de travar diálogos duradouros com seres humanos. Respondiam imediatamente a qualquer pergunta. Em cinquenta anos, muito se descobriu sobre seus hábitos e sua vida social, apenas perguntando a eles. Chegaram a revelar sua maior fraqueza: ausência de fontes de energia elétrica. Mas, como fazer? Impossível.
Em 2227, no Uruguai, um trágico incidente desembocou na mais importante informação sobre os maquinoides. Um jovem estudante, que aprendera a tocar algumas palavras e frases em um teclado, resolveu fazer uma brincadeira com um deles: inventou que, na escola onde ele estudava, havia um instrumento capaz de bloquear a energia elétrica e que seria usado para matá-los. O estudante foi assassinado no mesmo momento. O maquinoide em questão repassou a informação a mais nove, que voaram até a escola. Alguns especializados que sabiam a língua maquinoide, informados do acontecimento, tentaram explicar que o tal instrumento não existia, mas foi inútil. Os maquinoides destruíram a escola e mataram os professores. A princípio, achava-se que eles não haviam acreditado nos profissionais.
Cinco anos mais tarde, no Brasil, uma estudante, conversando com um maquinoide, em rede nacional, através de uma flauta, disse a ele, de maneira bem filosófica, que ele não existia, que o universo era, na verdade, irreal. O maquinoide interrompeu a interação imediatamente, não respondendo absolutamente nada. A estudante continuou conversando e repetiu o que tinha dito antes; o maquinoide teve a mesma reação – a de não reagir àquela informação. Dois anos depois, na Índia, um menino de nove anos, munido de um piano, afirmou ser capaz de voar da Terra até o planeta de origem maquinoide em apenas uma hora. O maquinoide, da mesma forma que antes, interrompeu o diálogo, não respondendo absolutamente nada. Em 2235, uma psicanalista japonesa, Sakura Kenji, comparou esses dois acontecimentos à morte do estudante e levantou a hipótese de que os maquinoides não concebiam a mentira. A hipótese foi confirmada várias vezes, em várias partes do mundo. Estava descoberto: eles acreditavam em qualquer informação que lhes fosse dada, exceto as muito absurdas. Estas, não assimilavam, como se não as escutasse, nem informações que contradissessem uma anterior. Não existia a mentira na língua deles. Não existia a mentira na concepção deles.
Em 2241, Vanessa Dias, uma moçambicana erradicada no Brasil, em um congresso sobre políticas mundiais, ofereceu a grande ideia: inventar que a Terra perderia suas fontes de energia elétrica em cinco anos. Bastava dizer que o sol estava previsto para se apagar, congelando as águas e interrompendo o fluxo dos ventos. Em 2242, o também cientista político haitiano Jean-Louis Nelson, acrescentou à ideia: dar aos maquinoides as coordenadas de um buraco negro, informando que naquelas coordenadas haveria muita fonte de energia elétrica. A ideia foi exposta em um conselho de diversos países do mundo e, após longas discussões, foi acatada por consenso. O conselho convocou os linguistas e músicos mais especializados na língua maquinoide para criar a informação. Ainda em 2242, a informação foi anunciada e difundida mundo afora.
Quatro anos depois, pessoas do mundo inteiro viram diversos maquinoides migrando para o sul. Eles se dirigiram à Antártida, onde ainda se localizava o minhocão de ferro. Passaram dez meses dentro do minhocão, acredita-se que consertando e desenferrujando, preparando-se para uma viagem. Depois de dez meses, em 2246, o minhocão decolou. Seguiu em linha reta para o céu. Ainda por uns cinco anos, os observatórios conseguiam ver o minhocão no espaço, distanciando-se da Terra, indo em direção ao buraco negro indicado.
Em 2250, o Prêmio Nobel de Ciência foi revivido. Por muitos anos, esse prêmio acabaria sendo conquistado majoritariamente por linguistas, antropólogos ou teóricos da música. Em 2272, Kumar Guptel, um famoso literato indiano, redescobriu o ultra-book “Enfim, livres!”. Fez uma longa crítica elogiando a obra, que repercutiu por todo o mundo. Com isso, muitos leram e gostaram. Os mais velhos sentiram um delicioso alívio nostálgico, uma sensação que lembrava o alívio sentido quando aqueles monstros assassinos foram embora. Assim, a última ficção científica tornou-se a pioneira de muitas outras que viriam posteriormente, muitas imaginando respostas sobre os maquinoides que os cientistas nunca descobriram: como se reproduziam, quanto tempo viviam, como era a vida em seu planeta de origem.
A humanidade, então, começou a olhar mais para si, deu-se conta de que já estava em pleno século XXIII e precisava pensar no seu futuro e na sua história. Por alguma razão, as gerações seguintes vieram a interpretar a invasão maquinoide como um longo período histórico em que a capacidade e a inventividade humana tinham sido testadas. O que isso significaria para o futuro? Ainda era muito cedo para dizer.