A LENDA DE TUIUMIM

Tuiumim vivia numa aldeia que era próximo a uma fazenda. Com medo do progresso que se aproximava rapidamentem os lideres da aldeia resolveram ir para Brasília pedir aos governantes que tombassem sua aldeia como patrimônio histórico e assim preservassem a historia da tribo. Os lideres queriam muito que Tuiumim fosse junto, mas o jovem índio só queria ficar em cima da árvore da fazenda olhando pela janela da cozinha Doná ( uma mulher que morava na lá) cantar. Era doce ouvir sua voz numa linda música que ela mesma havia inventado e havia dado o nome de "A lenda de cabocla". No seu canto ela falava de uma linda moça de cabelos comprido, filha de branco e índio, que vivia na beira do rio sempre chamando a rainha do mar. Pedia para ela noite e dia que a deixasse tomar conta do pequeno rio que ficava próximo à fazenda. Ate que um dia cabocla ouviu a voz da rainha e mergulhou no rio, desde então nunca mais ninguém a viu. Dizem que a rainha do mar atendeu ao seu pedido e ela mergulhou para nunca mais sair de lá. E quando a mata faz silêncio é para ouvir cabocla cantar. Quando não tem ninguém na mata ela se senta numa pedra na beira do rio para matar saudade do ar que respirava e agora chora o nome de alguém que possa ficar no seu lugar.

Tuiumim enquanto ajudava sua mãe a ralar mandioca a ouvia dizer: “-menino moço tem que acompanhar os lideres para salvar a aldeia e seu passado”. Mas como deixar de sonhar com a bela moça do rio. Ele não sabia se ela tinha virado sereia ou era um espirito das águas. Por que ela queria voltar? Será que sentia falta de pisar na areia, subir nas árvores, caçar bicho no mato? Ou de sentir o perfume das flores? Dia após dia Tuiumim não saia da árvore para ouvir a lenda da cabocla. Era lindo ouvir Doná cantar. Seu canto não era triste, mas fazia Tuiumim sentir frio na barriga (a mãe dele dizia que isso era sinal de mau presságio). Será que era Doná que chamava cabocla? Parecia que ela a conhecia. Que estranho! Para Tuiumim que falava com as plantas, os bichos, vento, lua e sol, a natureza era sua amiga e ele fazia parte dela. Que pena que o progresso se aproximava. Eram barulhentas, afugentava a todos. Ele se lembra de um dia uma dessas coisas chamadas de avião passou bem baixinho sobre sua aldeia, o barulho foi tão alto e assustador que Tuiumim que ainda estava na sua rede caiu, e sua mãe que carregava um balaio de mandioca derrubou tudo (a mãe pediu para que a chuva o fizesse desce do céu).

Certo dia a mãe de Tuiumim pediu para que ele fosse lá no rio buscar água para cozinhar as ervas para os rituais da tribo. Já era tardinha e lá se foi Tuiumim com a jarra de barro na cabeça. Na floresta enquanto caminhava Tuiumim ouviu o som do urutau que outro dia cantou perto de sua aldeia e ele sabia que precisava de uma pena daquele pássaro para lhe dar sorte. Queria usar essa pena no seu colar. Enquanto olhava para cima das árvores com o seu braço enfiado na jarra Tuiumim se distraia com a procura do seu pássaro,e sem perceber já estava perto do rio e logo outro som lhe chamou atenção. Era uma voz doce parecida com a de Doná, só que mais jovem. Ele nunca tinha visto Doná perto do rio por que sabia que o fazendeiro não a deixava sair da fazenda, só a via na cozinha sempre com aquele pano branco no ombro a secar o suor que lhe escorria na face, tão linda, no entanto muito marcada como a face de sua mãe. Doná reclamava do calor daquele lugar, mas nunca quis ir embora da fazenda. Doná apesar da pele muito branca era uma mulher bonita. Tuiumim logo se lembrou de sua infância não tão distante quando todos da aldeia podiam entrar na fazenda, pois o fazendeiro tinha feito um acordo com o seu povo que se eles plantassem e colhessem boas frutas e verduras podiam também usufruir delas. Ele via a felicidade no rosto de Doná que em dias muito quentes levava água para todos. Na colheita quando os frutos foram fartos e bonitos o fazendeiro com ganância expulsou todos da fazenda dizendo que não podiam colher nada do que plantaram. Dias depois Doná inconformada com o que ele fez adoeceu e o fazendeiro culpou a tribo de ter jogado um feitiço nela. (a mãe de Tuiumim diz que quando Doná adormecer seu espirito vai cuidar das flores da colina alta, onde homem nenhum alcança).

Tuiumim ainda ouvia aquela doce voz que vinha do rio. Ele soltou a jarra e começou a caminhar em direção a uma moita, pois não queria assustar quem estivesse lá. Viu uma mulher sentada numa pedra na beira do rio, aquela onde sua mãe costumava lavar as roupas de Doná quando ainda estavam na fazenda. Ele não conseguia ver seu rosto, pois ela estava de costas só via seus longos cabelos escuros que acompanhava o curso das águas, eles pareciam cachoeira. De vez em quando ela colhia água e molhava seu rosto e voltava a cantar. De repente ela chamou seu nome:

-Tuiumim... Tuiumim!

Ouvir seu nome naquela voz tão doce fez o jovem índio sai da moita e ir em direção àquela mulher, parecia que ele estava em transe. Parecia estar sendo carregado por aquela linda voz. Já estava quase próximo a ela. Sentiu seu pés molhados; já estava dentro do rio. Enquanto ela se virava aos poucos, Tuiumim sentia seu coração bater mais alto do que a aquela voz. Ele abriu a boca devagar como se fosse soltar um grito ou outra coisa qualquer. E naquele instante de transe ele ouviu outra voz que chamava persistente seu nome. E como um segundo de raio de sol passando numa fresta ele olhou para trás e não viu ninguém, mas quando voltou seu olhos para a mulher ela já não estava mais lá. Sentiu uma mão pesada no ombro que lhe fez dar um salto e quando se virou viu sua mãe que segurava algumas erva e logo lhe abraçava.

- menino que demora! –dizia sua mãe

Ele sem responder a abraçou e os dois foram caminhando até a aldeia.

Depois daquele dia Tuiumim nunca mais foi ouvir Doná cantar, pois como sua mãe havia dito seu espirito já estava na colina. Toda manhã antes do sol nascer por trás da colina, Tuiumim cantava para ela bem baixinho a mesma musica que ele ouviu por muito tempo. E sabia que quando os primeiros raios surgiam era Doná lhe desejando um bom dia.

Certo dia seus lideres estavam já reunidos com os governantes, após intensa e calorosa discurssão, finalmente eles estavam assinando uma ordem de preservação daquele lugar. Tuiumim muito feliz voltou para mata, queria encontrar urutau e pegar apenas uma pena, queria ficar bonito. Na sua buscar pelo pássaro raro ele foi parar no rio e o encontrou parado em cima da pedra onde ele tinha visto aquela mulher. O pássaro parecia não se incomodar com sua presença e isso deixava Tuiumim muito feliz. E com muito jeito conseguiu passar sua mão sobre o pássaro que simplesmente ignorava seu toque. O pássaro subiu na sua mão e ele o abraçou e logo Tuiumim estava com a pena em suas mãos. Enquanto soltava o pássaro que voou e sumiu rapidamente. No segundo aquela mulher estava sentada na pedra olhando para ele. Seus olhos ficaram fixo naquela beleza morena de olhos azuis e cabelos negros. Usava contas no pescoço, mas não tinha calda, era uma linda garota que lhe sorria e mostrava dentes muitos brancos, tão brancos que aumentava sua beleza.

-Me deixar ficar junto da minha mãe!- ela pedia para Tuiumim que lhe olhava com dúvida. –você foi à única pessoa que amava ouvi-la cantar e agora que ela se foi eu finalmente posso ficar junto a ela para sempre. Mas não é certo deixar esse lugar sozinho. O rio precisa de proteção. Eu sou filha daquela mulher que cantava a saudade de não poder me ver. E hoje se você aceitar ficar em meu lugar posso ir para junto da minha mãe, dessa vez para sempre.

Tuiumim segurou com força a pena do urutau que estava na sua mão e esticou o braço para segurar a mão da moça. Ele não ia questionar com ela o que tinha acontecido antes, mas queria de alguma maneira agradecer a Doná por aqueles doces dias. Ele sabia que tinha sido escolhido para que lhe acontecesse tudo aquilo e não ia deixar de cumprir sua missão. E foi com esse pensamento que ele segurou finalmente na mão de cabocla e viu seu sorriso pela ultima vez. Quando abriu os olhos estava no fundo do rio o que era lindo estava lá e não é preciso explicar. Aquela pena que estava em suas mãos voou até a colina levando o espirito de cabocla que se reencontrou com sua mãe.

E hoje na beira do rio se ouve uma índia cantar o mesmo canto de Doná, mas esse é para um índio. E diz a lenda que esse índio é seu querido filho que para salvar sua aldeia prometeu para a rainha do mar ser protetor do rio e de tudo que existia lá.