A paixão
A paixão
A paixão desatina o coração e vai, aos poucos, vencendo a lucidez. Sem regras e deveres, vai ganhando o seu território e colocando as suas bandeiras. O fogo da paixão queima e faz, com aquele que pega em sua brasa, arder de emoções.
Roberto sentiu tal fogo e estava ardendo de paixão. Vivia pelos cantos cantando e sonhando acordado, e a sua vida parecia mais um conto de fadas. No começo, apenas, admirava a beleza de Carolina, mas, depois da apresentação, pois a beleza é a primeira que se apresenta, sentiu seu coração bater de uma maneira diferente. Começou a segui-la com os olhos e coração e admirá-la de longe. Roberto decidiu que a queria de qualquer jeito, mas não sabia como se aproximar. Carolina não estava solteira e namorava Mateus, parecia apaixonada, pois o casal vivia pelas ruas dando provas do seu amor. Cada carinho explícito do casal era uma punhalada no coração de Roberto.
- Marcos, meu coração dispara só em ver Carolina. Falou Roberto.
- Você está apaixonado? Mas você sabe que ela tem namorado e parece apaixonada por ele. Comentou Marcos.
- É um idiota, um playboy! Ela só gosta dele porque ele tem um carrinho.
- Não é bem assim! Eles namoram, há muito tempo, e, quando ela o conheceu, ele tinha apenas uma bicicleta velha.
- Eu lembro, mas, e daí? Não muda nada, ele continua um idiota!
- A paixão, às vezes, cega a gente, você tem que ter cuidado.
- Eu quero a Carol pra mim e pronto!
- Mas como você vai fazer? Você vai ter paciência para esperar o romance dela acabar e depois tentar conquistá-la? Mas te digo amigo, parece que esse romance não acaba tão cedo!
- Vá rogar praga para outro, sua “cassandra”!
- Tem tanta mulher sozinha, por quê...
- Porque eu “quero ela”!
- Você é quem sabe!
Roberto parecia decidido em conquistar sua grande paixão, mas sabia que até a aproximação seria difícil. Carolina não era de sair muito e, quando saía, geralmente, estava acompanhada de seu namorado. Roberto, com o tempo, começou a segui-la, vivia feito uma sombra atrás dela, mas ainda não achou oportunidade de se apresentar. Até que, um dia, teve uma ideia estapafúrdia, mas, talvez, desse certo. Resolveu simular um assalto, contratou um menino e deu as instruções. Queria ser o herói de Carolina e, assim, quem sabe, ela o notasse. Os dias passavam e a oportunidade desse ato heroico não concretizava. Foi quando, sem menos esperar, a avistou entrando em uma loja de roupas e, imediatamente, ligou para seu cúmplice para colocar em prática o combinado. Eles não esperaram muito, e Carolina saiu com a mão cheia de compras, foi quando, num susto, viu-se sendo roubada. Assustada, fez o que todos fazem:
- Socorro, ladrão! Gritou, apavorada, Carolina.
Mas, mal sabia, seu herói surgiria do nada e saiu correndo atrás do falso meliante. Não demorou muito e voltou com as coisas roubadas de Carolina.
- Foi só isso que aquele vagabundo roubou? Perguntou Roberto.
- Você conseguiu recuperar tudo. Surpresa e ofegante, falou Carolina.
- Peguei aquele ladrão e dei uma lição nele. Falei pra nunca mais roubar uma menina linda. Roberto, enfim, conseguiu fazer seu primeiro elogio.
- Obrigada, mas o que eu faço para agradecer a você?
- Que tal tomarmos um suco para acalmar?
- Acho uma boa ideia.
Roberto e Carolina sentaram numa lanchonete próxima, falaram sobre o ocorrido e também sobre coisas amenas. Passaram o dia numa conversa informal, mas Roberto não se declarou, apenas mostrou que poderia contar sempre com ele. Depois de horas de conversa, eles se despediram, e Roberto não deixou de perguntar o telefone dela. Educadamente, ela lhe deu, num gesto de agradecimento e confiança.
- Sabe quem me deu o telefone? Falou Roberto com Marcos.
- Quem? Respondeu Marcos.
- Carolina. Não falei que conseguiria me aproximar dela.
- E daí, ela te deu alguma esperança?
- Não, mas vai dar!
- E como você conseguiu?
- Vou te contar.
Roberto contou toda a façanha para o amigo e depois confessou que foi tudo uma armação. Marcos então lhe falou:
- Você é maluco? Isso é coisa de doido!
- No amor e na guerra vale tudo!
- E a ética, fica onde?
Roberto estava deixando a emoção falar mais alto. A paixão desenfreada estava vendando seus olhos para uma coisa chamada sensatez.
Noutro dia, Roberto telefonou para Carolina, queria saber como ela estava depois daquele incidente. Era um motivo para manter mais um contato. Já passada a emoção da hora, ela o atendeu com frieza, afinal, tinha namorado. Roberto sentiu que ela estava distante, mas, mesmo assim, a convidou para sair. Ela agradeceu, mas disse que não. Desligou o telefone e engoliu a seco o choro, limpou uma lágrima que correu pela face e balbuciou algumas palavras.
- Você vai ser minha, Carolina, minha!
Realmente, estava decidido, mas tinha um obstáculo pela frente. Mateus era seu calo, sua pedra que precisava ser retirada do caminho. Como? Ele pensou em várias coisas, mas nada que fosse definitivo. Um romance de anos para acabar tinha que ter uma coisa forte e que deixasse Carolina bem decepcionada. Os dias passavam e ele voltou a segui-la de longe, olhava o romance dela e Mateus e engolia à seco sua raiva. Mas, certo dia, ao ver passar uma gestante por sua frente, teve uma ideia. Resolveu fazer outra armação e, desta vez, seria contra Mateus. Com algum dinheiro que havia guardado para comprar sua tão sonhada moto, resolveu desviar para dar asas a seu plano. Foi em uma das favelas, de sua cidade, e lá procurou uma gestante. Contou-lhe o plano e ofereceu dinheiro. A gestante era solteira e o pai havia desaparecido pelo mundo. Uma arma perfeita para Roberto (o desespero de uma futura mãe solteira).
Tudo combinado, mas Roberto queria a cena em um local apropriado, que deixasse Mateus sem reação e envergonhasse Carolina.
O dia chegou finalmente, e seria na festa da cidade. Carolina e Mateus estavam felizes junto dos amigos, quando de repente...
- É por isso que você sumiu, por causa de outra mulher? Você me engravidou e depois me largou, seu cafajeste. Falou a gestante.
- Você está falando comigo, é? Respondeu Mateus.
- É com você mesmo, Mateus! Por que me abandonou depois que me engravidou?
Carolina foi pega de surpresa e quis uma explicação de Mateus.
- Quem é essa mulher, Mateus? Quero saber.
- Eu nem sei quem ela é, amor.
- Agora você não sabe, mas quando me levava pra cama e dizia que me amava você me conhecia muito bem, seu vagabundo. Gritou a gestante.
- Mas eu não te conheço, menina. Você está me confundindo com outro.
- É você mesmo Mateus.
Carolina então saiu correndo, chorando e Mateus, sem reação, não sabia como se comportar na frente de todos. Enquanto isso, Roberto fingia estar passando por ali e, então, foi atrás de Carolina. Ela correu e parou numa esquina, sentou e chorou até soluçar. Roberto logo apareceu para confortar. Frágil e, ao mesmo tempo, com raiva, aceitou tal companhia.
A gestante, depois da confusão, saiu em meio a multidão e se perdeu. Sua tarefa foi cumprida e, enquanto isso, Mateus, desesperado, procurava Carolina. Mal sabia que ela estaria entregue ao seu algoz. Roberto a levou daquele local e ela estava entregue à raiva e a vingança. Disse que queria tomar umas cervejas e Roberto, prontamente, atendeu ao seu pedido. Ela bebeu até cair nos braços de quem lhe causara tal angústia e Roberto, certamente, não perderia tal oportunidade. Levou Carolina para a sua casa e a amou sozinho, pois, no estado em que se encontrava, ela mal sabia o que estava acontecendo. Carolina amanheceu nos braços de Roberto e, assustada, levantou-se num pulo e perguntou:
- O que houve?
- Você não lembra, amor? Nós nos amamos a noite toda.
- Isso não podia ter acontecido.
Carolina se arrependeu da noite, mas ainda guardava a raiva de Mateus. Queria explicações e foi procurá-lo. Mateus contou-lhe que não conhecia aquela menina e que nunca a traiu, mas os fatos eram fortes e Carolina não acreditou. A sua raiva fez com que ela contasse que passou a noite com outro homem e que agora já tinha um novo amor. Mateus não acreditou na história e insistiu na verdade que estava com ele, mas nada adiantou. Carolina só queria acreditar no que viu.
Roberto conseguiu separar o casal e, consequentemente, também teve sua primeira noite de amor. Carolina não queria mais ver Mateus e sua vingança era desfilar com um novo amor. Ainda o amava, mas seu orgulho estava ferido demais. Ela resolveu dar uma chance pra Roberto, mas deixou tudo às claras. Falou que não sentia nada por ele e que ainda amava seu ex.. Roberto concordou e disse que a faria gostar dele como ele a ama.
A vida passa e Carolina não se entrega a Roberto, mesmo ele fazendo de tudo para agradá-la. Enchia-a de flores, de cartões românticos, de elogios, mas ela se esquivava dos beijos, negava as noites de amor e procurava meios de afastá-lo, sempre. Roberto então conversa com Marcos.
- Tudo eu faço por Carolina, mas ela só me evita.
- Eu ainda não entendi como você a conquistou. Mas, tudo bem.
- Isso não interessa agora. O que eu quero é que ela me ame e esqueça de vez aquele idiota.
- Esse é o preço que você vai ter que pagar por entrar no meio de um relacionamento.
De longe, Mateus vê Roberto e Marcos conversando e espera Roberto se afastar para se aproximar de Marcos.
Apresenta-se e conta que acha que Roberto armou para ele. Marcos já havia desconfiado da conduta do amigo, mas sublimava. Resolveram ir atrás da gestante e esclarecer tudo para Carolina. Marcos topou na hora e foram, portanto, investigar. A vida passava e Mateus não tinha êxito em sua busca, nem Roberto em sua empreitada.
Roberto já não sabia mais o que fazer para que Carolina abrisse o coração. Estava se consumindo de ciúmes e raiva, já não mais controlava as suas emoções. Enquanto Mateus procurava, incessantemente, a sua absolvição. Carolina era um eterno eco do não, e Roberto engolia a seco sua paixão e ódio. Num gesto desesperado, resolveu arrancar da boca um eu te amo, mas ela continuava negando. Então esbravejou e a esbofeteou. Ela caiu e disse que ele nunca mais a procurasse. Roberto ajoelhou e pediu perdão, mas nem assim conseguiu.
Roberto insistia nesse romance e chegou a tal ponto de invadir a casa de Carolina para dizer do seu amor. Ela, novamente, o expulsou. Ele não sabia mais como fazer para provar seu amor.
Numa noite sombria e chuvosa, entrou em desespero e resolveu declamar, pela última vez, seu amor. Mas, naquela mesma noite, Mateus e Marcos haviam encontrado a gestante que contribuiu para a mentira. Imediatamente, os três foram até a casa de Carolina. Enquanto isso, Roberto tentava, pela última vez, provar sua paixão. Carolina ouviu atentamente, mas, novamente, lhe deu um não. Roberto, desesperado, falou que sua paixão era para sempre e que provaria, enfim, o seu amor. Puxou uma arma e apontou para a própria cabeça e, enquanto isso, batiam na porta Mateus, Marcos e a gestante. Quando, de repente, ouve-se um tiro. Mateus arrombou a porta e viu caída no chão Carolina. Roberto acertou bem no coração dela, que já caiu morta. Roberto estava catatônico e ficava repetindo sem parar:
- Agora, meu amor, você vai saber que eu te amo, pois vou ficar o resto de minha vida sozinho, pensando em você.
A paixão comete suas loucuras e procura desculpas nas emoções e na parcialidade.
Mário paternostro