Póstumo

Londres, 20 de Janeiro de 1885.

Ao Ilustríssimo Sr.Radford,

Temo ser tarde demais para dar alguma explicação sobre as coisas que estão a ocorrer, por isso não o farei. Mas Creio que compreenderá tudo no término desta carta.

Muitas pessoas têm falado de mim, da minha falta de perspectiva, da minha falta de planos e principalmente do meu jeito excêntrico de ser. E tenho toda a certeza de que alguma dessas conversas tenha lhe chegado aos ouvidos. Temo em concordar com o fato de que aqueles que falam da minha excentricidade estão corretos, pois isso é presente em minha vida desde minha remota infância.

Lembro-me de ser o típico garoto calado com poucos amigos e excelentes notas que sofria com o vexame que os colegas lhe provocavam, e que se encontra em todos os Internatos de nossa nação. Um típico garoto de pai militar mandado ao internato quando tinha apenas onze anos. Um garoto que sofria com as ameaças de seus genitores. Estes que queriam que ele tivesse um futuro brilhante. Um Futuro que certamente não seria o seu. Por esse motivo os pensamentos de medo, raiva e paranoia vieram até mim. A minha fobia perante o futuro me tornava imprevisível.

Sempre fui o estranho de todas as turmas que estudei porque tinha um medo terrível das consequências que as minhas ações poderiam trazer. Inclusive aquela mínima como expressar-se de maneira lógica e direta. Com certa dificuldade eu ia avançando os degraus que compunham minha vida acadêmica. Boas notas e nenhum amigo. Estes pensamentos tortos que dizem que tudo irá dar errado, que eu irei fracassar e que é melhor fazer o que eles me dizem são de fato a minha Nêmesis.

Quando Completei vinte e três anos, conheci sua Filha Helena. Eu ainda era Muito Indeciso sobre o que queria para meu Futuro, e também muito tímido com as mulheres. Mas quando Helena chegou, tudo mudou. Ela me mostrou um outro lado da minha personalidade que eu não conhecia, passei a ter mais amigos, a sorrir e a me sentir realmente parte da sociedade em que vivíamos. Por esses motivos continuo com ela até hoje e continuarei até o além-túmulo. Mas apesar de tudo, os pensamentos não haviam ido embora. Eles Permaneciam ali a me dizer o que fazer, e embora eu procurasse não os escutar eles moldavam vagarosamente minhas ações para o que veio a ocorrer.

Esse meu medo irracional, essa atitude de evitar os pensamentos tortos me atrasaram de mais. Ignora-los me trouxe-me alucinações de uma maneira que eu não conseguia mais distinguir o que era real e o que era simplesmente fruto de minha imaginação já enegrecida pelo excesso de confusão que minha nêmesis me trazia. Estava à beira da loucura.

Não ouso chamar esses pensamentos de "vozes”. Não, vozes não. Vozes fariam com que aquilo que gritava em minha cabeça parecer ser muito ofensivo, quando na verdade ele queria apenas o meu bem. Não o dos outros.

Talvez tenha sido por isso que hoje eu deixei minha nêmesis me pegar pelos dedos e me levar para dançar antes de escrever esta carta. Talvez tenha sido por isso que eu só tenha conseguido a primeira namorada aos 23. Talvez tenha sido por isso que eu me casei com ela. Talvez tenha sido por isso que eu a matei. Perdão por tomá-la de você.

Hoje minha Colt finalmente me trará o Silêncio.

Tristemente,

William Wilson.