Viagens pelo Ceará LXV
IDEIAS AVENTUREIRAS, MUSICAIS, LITERÁRIAS, MÍTICO-CURANDEIRAS, ENXADRÍSTICAS, TEATROLOGAS E INSANAS... DE MORADORES DO VALE JAGUARIBANO, NUM ANO DE ESTIO.
LIMOEIRO
“Fazer sucesso, também vai variar de acordo com o gosto da pessoa em questão, artista ou não. No caso de personalidades da música, seria vender milhões de cópias do disco? Ou seria estar na mídia aplaudido e famoso? O que é afinal? De um modo amplo, parece que é se dar bem com a situação, obter êxito e não haver mau sucesso. Mas não seria simplesmente a pura satisfação? Sim, mas esta mesma varia de um pra outro. Enquanto um gosta de calma o outro quer agitação, enquanto um deseja simplicidade, outro quer dar asas a desenfreada vaidade. Porém! um cronista bem antigo já não disse certa vez que tudo é vaidade debaixo do sol, então! O que será? Existem pessoas comuns que querem ser reconhecidas como bons profissionais, outras não estão nem aí para isso, querem é viver na marginalidade, esta também dá fama. Tem gente que quer possuir muito dinheiro, sem nem mesmo saber se isso lhe proporcionará a satisfação desejada. Mas eu prefiro não falar do poder e das artimanhas do dinheiro, gostaria de citar a fama somente. Ora! existem pessoas que desejaram ser famosas e se tornam celebridades, mas em seguida ao estrelato pode ser que venha o anonimato, nem todos os famosos serão sempre estrelas. Exatamente essa mudança pode causar grande desencanto e dor para elas. Assim, a frustração faz com que a pessoa acorde e bote os pés no chão e comece a se conhecer melhor. Talvez no tempo em que desejou começar a carreira a pessoa não fosse ela mesma e estivesse tomada por exacerbada vaidade, estivesse sendo lançada por alguém como se fosse um produto ou simplesmente fingindo... sei lá, penso que ninguém sabe ao certo o que a glória pode fazer com a cabeça e com os sentimentos das pessoas... a prova disso é a quantidade enorme de grandes artistas que acabaram com as suas vidas em horríveis dramas. É por isso que tenho pensado, se o ideal não seria a pessoa se conhecer um pouco melhor e daí partir para a ribalta sem muita sede ao pote, ou mesmo se aceitar como uma pessoa comum e com os pés na realidade do chão!
Concordei com a exclamação do flautista e ele lembrou de um argumento bom pra encaixar no seu comentário e disse:
“Existe um cantor estrangeiro que canta sem instrumentos para lhe acompanhar, pra ele basta o microfone que o resto ele faz com a voz e as mãos. Se chama Bobby Mc Ferrin que, diz exercer seu ofício para alegrar as pessoas, e eu gosto disso.
Já a Cecília Meireles disse em um poema que canta porque o instante existe e sua vida está completa, não é alegre nem triste, é poeta. Sei que uma coisa é a gente realizar as nossas vontades, desejos e vaidades embora não prevendo que consequências isso pode trazer, e outra é se levar o bem-estar que a arte nos proporciona aos outros. Se o desejo do artista é realmente este de compartilhar o que sente, ele não vai se importar muito com fama nem em com grandes quantias de dinheiro, pois a princípio o ato de criar e executar já é prazeroso e por tanto, compensador, até mesmo o simples assobiar e o cantarolar já serve de contentamento”.
Aquelas alturas a mulher dele acordou e perguntou ao garçom se havia café. Aproveitei para pedir mais duas doses e um tira-gosto de filé trinchado com bastante cebola e macaxeira frita. Enquanto ele continuou:
“Sou músico, mas trabalho numa gráfica. Além do atendimento aos clientes também me dedico a compor, a escrever textos, e às vezes até executo escalas na flauta para não perder o bom costume nem deixar os dedos enferrujarem. Recebo visitas de vários tipos de pessoas. Quase que diariamente me aparece o Marquinho, que tem certa dificuldade no falar e por isso foi apelidado com o nome de gaguinho. Esse figura está aposentado por ter um problema de saúde. Já trabalhou em Fortaleza e gosta de manusear equalização de mesa de som. Diz que quer trabalhar em estúdio de gravação, mas só se for com MPB, detesta forrós, breganejos e similares. Faz também divulgação com cartazes e panfletos de eventos locais, era esse o seu trabalho na capital. Diz que foi dj no “Cais Bar” e que conhece a maioria dos grandes artistas de Fortaleza. É ele quem me traz notícias de feiras de música no estado, festivais e apresentações de cantores em bares. Diz que crê na boa música. Faz questão de querer divulgar essa ideia na cidade. Já se aliou a donos de bares para promover a vinda de músicos de fora e espera desse modo convencer as pessoas comuns a gostarem de uma música mais elitizada. Lamento, mas sou obrigado a dizer que têm sido vãs as suas bem intencionadas tentativas, que pena, é isso. Parece que falta um retorno de iniciação, o ensino aos mais novos como propôs Platão e o próprio Gandhi e quem sabe assim se retoma o bom gosto para os ouvidos das pessoas.
Obs:Tenho publicado somente no recanto das letras uma auto-biografia, meu primeiro livro, cujo nome é “Fascinado por chuvas”. Já este texto que voce acaba de ler é parte do meu segundo volume, cujo título e subtítulo pode se lê acima.
Caso essa seja sua primeira leitura desses contos, sugiro que leia desde o primeiro capítulo para uma melhor compreensão e proveito. Atenciosamente
Agamenon violeiro