Viagens pelo Ceará LXIII
IDEIAS AVENTUREIRAS, MUSICAIS, LITERÁRIAS, MÍTICO-CURANDEIRAS, ENXADRÍSTICAS, TEATROLOGAS E INSANAS... DE MORADORES DO VALE JAGUARIBANO, NUM ANO DE ESTIO.
LIMOEIRO
Ao ouvir ”She`s my girl” eu me encontrava também numa praça em Juazeiro e era um fim de tarde. Detalhe, essas músicas eram novas mas, o que mais me chama a atenção é que para mim naqueles dias, elas possuíam o poder de despertar indescritíveis emoções, mesmo sem eu entender nada das letras delas. Vim a saber depois, por estudos de música que a melodia por si só já fala à alma da gente... não esquecendo que a música tem três partes: melodia, harmonia e ritmo, pois bem a melodia sozinha, pode exercer o poder de mensageira e passar uma impressão e essa tal impressão o ouvinte pode muito bem nem saber definí-la. Ele sente, mas no caso de alguém novo, este alguém pode muito bem nunca ter sentido aquilo antes... não sei como dizer isso melhor. Ao ouví-las naqueles dias, havia outras impressões no ar, cheiro de lanchonete, barulho de carros e pessoas se movimentando, mas como que a um hipnotizado, aqueles sons me arrebatavam, quero crer que aquilo naqueles dias traduziam coisas para um coração inexperiente. Qual sutil feitiço, de um estado feliz e sonhador de quem está a fim de encontrar ou já tem idealizado no pensamento, algo ou alguém que deseja. Naqueles instantes, sentí-me sob a emoção que elas despertavam em mim, sentia-me feliz e com a impressão de uma promessa que eu seria muito feliz futuramente... era como se a música me sinalizasse uma boa e bela estrada. Era em resumo, um bom pressentimento onde nenhuma sombra de temor se atrevia a turvar aquele meu momento. Era quase que como a hipnose que é induzido o diabo da tasmânia quando escuta a música que gosta.
Assim foi com tantas outras canções. A “my love” do Paul Mc Cartney, “olha” do Roberto Carlos que começa com um solo de cravo, “infinito” de Márcio greyck onde o sentimento é semelhante. Falo dessas melodias pois eram as que eu tinha acesso naqueles tempos. Eu ouvia o som pela rua vindo das casas dos que podiam comprar vitrolas e discos. As músicas eruditas e internacionais não tocavam em rádio AM aqui do Ceará.. Acho que sou mesmo romântico na maioria das vezes.
Na década de 1980 foi que conseguir ampliar meus horizontes sonoros e ouvir outros autores por minha conta. Assim também acontece com som de vozes e risos de pessoas, cantos de bichos, insetos. Até mesmo sons de sinos de igreja me despertam a audição, e isso já vem desde os dias em que era menino e morava no interior, mas continuou em outras cidades menores e maiores por onde passei e vivi.
Vamos tomar mais uma? Tá gostando do papo?”
Respondi que nunca em minha vida havia escutado tantas e tão belas impressões em matéria de música. Claro que o uísque inspira o bom ouvinte e melhor ainda o bom falante e pedi para ele continuar, a mulher dele continuava no sono.
“ Sons, sou fascinado por eles, sejam vocais, cantigas de pássaros, animais, sons de instrumentos musicais, que irei dizendo aqui à medida que eu for me lembrando. Ouço e sinto os timbres de pessoas de outras regiões. Meu ouvido vai captando chiados e pronuncias do meu país, é tanto que atrevo-me a distinguir os chiados nos sotaques dos cearenses, dos cariocas, dos pernambucanos, dos mineiros, e até dos sul mato-grossenses. Vou exemplificar: a palavra “alma” é pronunciada por mim assim: auma, já um velho irmão Marista estrangeiro ao ler as leituras da missa dizia lá em Juazeiro: “álema” destacando a sonoridade da letra l (éle); é comum alguém de São Paulo falar: apartamiento, quando lê apartamento; alguém de Belém falar: farinnia, no lugar de farinha; alguém do Rio de Janeiro dizer: naisci , no lugar de nasci... e por aí vai, mas por falar em preciso dizer da minha origem. Nasci às margens do rio Salgado bem pertinho de Juazeiro do Norte no cariri cearense. Segundo meu pai, no tempo em que era menino, ninguém queria morar ali, pra você ver, hoje um terreno lá é mais caro do que na capital.
Obs:Tenho publicado somente no recanto das letras uma auto-biografia, meu primeiro livro, cujo nome é “Fascinado por chuvas”. Já este texto que voce acaba de ler é parte do meu segundo volume, cujo título e subtítulo pode se lê acima.
Caso essa seja sua primeira leitura desses contos, sugiro que leia desde o primeiro capítulo para uma melhor compreensão e proveito. Atenciosamente
Agamenon violeiro