Válter e o Chão
Ao acordar, Válter enxergou a mesma noite, o mesmo dia, Otávio Augusto lhe atormentava, mas desta vez ele não viera materializado como da última vez, roubou a cena, o fez sentir o mesmo cheiro, a mesma sensação. Aquele homem de pele clara, magro e alto se levantava da sua cama. Em um instante o amou, no outro fez questão de odiá-lo, não podia amá-lo mais uma vez, Otávio Augusto já lhe fizera sofrer, com ele, Válter questionou até o fato da sua existência, e agora, Válter pensava que não existia. Mas como? “Se penso, logo existo” diria o filósofo, mas o que seria pensar? Válter se questionava. Ele desconstruíra o seu mundo e até hoje não voltara para reconstruí-lo, vivia a procura do que não sabia o que era, mas tinha medo de enfrentar o desconhecido. Válter olhou mais uma vez para o vulto torto e monstruoso que se apresentava, trocaram algumas palavras, Válter sequer tinha consciência do que falava, mais uma vez cedeu, fez o que Otávio Augusto queria, não lhe impôs limites, mais uma vez foi pobre de termos e espírito, sucumbiu, desistiu. E no cansaço causado pela confusão entre o que foi e o que ainda será, deitou no seu chão marrom e se elevou, entrou profundamente em uma realidade onírica, onde tudo era possível. Ali era sua verdadeira existência! Ali se consolidava a sua realidade! Ao acordar, amedrontado e com receio de rever Otávio Augusto, não quis abrir os olhos, ficou assim por horas, nada ouvia, nada sentia, nada dizia. Quando finalmente resolveu voltar a sua falsa realidade notou que Otávio Augusto já partira. E ainda hoje Válter leva uma vida conflituosa, dividido entre a realidade onírica e a concreta, com o mesmo medo de encontrar Otávio Augusto em ambas as partes.