Viagens pelo Ceará LIV

IDEIAS AVENTUREIRAS, MUSICAIS, LITERÁRIAS, MÍTICO-CURANDEIRAS, ENXADRÍSTICAS, TEATROLOGAS E INSANAS... DE MORADORES DO VALE JAGUARIBANO, NUM ANO DE ESTIO.

QUIXERÉ

Certa vez falou sobre caçadas que ele fez e nos chamou a atenção para os latidos dos cachorros. Disse que assim como uma mãe experiente sabe distinguir os motivos do choro do seu bebê, os cachorros também apresentam diferenças no seu latir, que se observasse que o latido de um cachorro novo brincando é um, quando ele está adulto e zangado é outro, quando está atacando uma caça é um, e quando está sendo maltratado é outro e era mesmo muito certo aquilo. Pois ele me assegurou que às vezes em caçadas lá no Maranhão ele e outros ouviam os cachorros num aiaiai como que sendo chicoteados pelos cipós e ouviam um zumbido no ar. E o que era aquilo? Ninguém sabia, uns diziam que era a caipora e ela jamais se deixava ver. Mas quem provava que esse bicho existia? Que não era invenção do povo? Ninguém provava nada, e a coisa permanecia e permanece como os casos de lobisomem, porém para os antigos e para os novatos as únicas coisas sensíveis eram as cipoadas que os cachorros levavam e os latidos de dor que eram distinguidos pelos caçadores e o assobio gritante que cortava a mata e todos ouviam. Era a caipora atacando, alguns mais crentes diziam, e que não se devia caçar em dias santos, mas eu pergunto, se vocês já viram um calendário da igreja! Todo dia é dia de santo e então? A melhor coisa é não caçar e deixar os bichos viverem.

O velho fez uma pausa e disse.

- Mas com relação à escutar coisas nos matos não posso dizer que ouvi assobios como disse o Severino, nem os cachorros gritando como se estivessem sendo açoitados, mas escutei batuques e não foi só eu...

O Bastião confirmou que já havia ouvido também.

Era assim: quando nós chegávamos no mato, soltávamos os cachorros e eles saíam desesperados nas veredas, dando vazão aos seus instintos olfativos, a excitação era tanta que até se mijavam. Pois bem, os cachorros se iam e nós íamos andando pelas veredas também, depois de certo tempo, parávamos e ficávamos na espera, que podia ser em qualquer lugar. Levávamos as lamparinas, água nos cabaços, café, farinha carne seca ou toucinho e rapadura, nunca cachaça. Naquele tempo eu tinha o hábito do cigarro de fumo brejeiro. Os cachorros podiam latir logo, ou demorar muito tempo, mas o certo é que quando latiam estavam em perseguição ou cavando algum formigueiro, onde podia ter entrado algum bicho. Era o momento da gente ir até lá pra ver se valia a pena cavar tal buraco. Caso os cachorros demorassem a latir a gente podia até tirar uma soneca. Teve vez que despertei tranquilamente enquanto ouvia o leve som do batuque soando distante, a coisa parecia um encantamento, pois se eu dissesse alguma palavra, o som parava e pra um e outro escutar era necessário que acordasse sutilmente e ficasse em silencio.

Fez uma pausa e disse que ia contar outro caso.

Obs:Tenho publicado somente no recanto das letras uma auto-biografia, meu primeiro livro, cujo nome é “Fascinado por chuvas”. Já este texto que voce acaba de ler é parte do meu segundo volume, cujo título e subtítulo pode se lê acima.

Caso essa seja sua primeira leitura desses contos, sugiro que leia desde o primeiro capítulo para uma melhor compreensão e proveito. Atenciosamente

Agamenon violeiro

Agamenon violeiro
Enviado por Agamenon violeiro em 17/04/2013
Código do texto: T4245059
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