O RETRATO DO SILÊNCIO
De começo direi: - Nada substitui o trabalho do pensamento, análise, meditação e raciocínio. Sem interpretação e entendimento racional, não há aprendizado. Não se pode relegar a segundo plano o pensamento e em conseqüência, a ausência da aquisição do conhecimento, que só na paz de espírito e no silêncio, como a chama de uma vela se pode obter.
Não basta o silêncio de fora. Cessar o clamor da existência humana e seus desejos, o fervor das vidas desbravando e desafiando o mundo. É preciso silêncio na alma.
Lembro o recorte de meu pai contra o brilho da janela, com seu olhar perdido, olhando o espaço vazio, e as nuvens navegando o Tempo, desfiando as horas, ele repontando a vida a si mesmo. Cismando sobre a própria Criação.
Era – hoje eu sei – um sapateiro filósofo que aprendeu com a vida; um teólogo por seus constantes estudos da Palavra Sagrada e suas fervorosas Orações. Era comum sua sapataria ser visitada pelo Padre Ângelo da paróquia de São Benedito, às vezes por "seu" Samuel e "seu" Cruz, da Igreja Presbiteriana, onde eram presbíteros, outras vezes por um casal inglês Testemunhas de Jeová: Richard e May, ele conversando com meu pai e May querendo aprender a cozinha brasileira com minha mãe. Isto mostrava seu conhecimento teológico onde todos queriam beber um pouco da fonte.
A gravura em minha mente é de um homem de pensamentos. Em que cismava meu pai?
Minha mãe às vezes era ferina sem querer, mas pisava seu íntimo inteligente, quando lhe dizia: - Nardo, (Arnaldo) você é um homem de “sete instrumentos e sete necessidades”. Finalizava com um risinho irônico. Ele só dizia para ela uma interjeição herdada de seus avós sulistas: - Bah! E continuava em silêncio por um bom pedaço de tempo.
Sempre disse para mim: - A vida não é equivalente ao que lhe damos; do que somos capazes, do que sabemos e do que fazemos!
Em que ele pensava? - Jamais saberemos ao certo.
O que pensava na existência isso o sabíamos...
Como escreveu Rubem Alves: - “E aí se faz o silêncio e dentro
a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.”
Eu comecei a ouvir o silêncio, aprendi com meu pai a ouvir a quietude das coisas. As falas viram palavras escritas, e o gênio da escrita é o silêncio. Aprendi a me refugiar no silêncio das palavras não faladas. Aprendi que, "quando quiseres orar tu vais para teu quarto (teu templo, uma catedral dentro de seu quarto), e lá no silêncio desse teu templo tu irás orar em silêncio e em secreto, e vosso Pai que está em secreto te ouvirá.”
Os pássaros cantam seus variados cantos. Um grande estrondo os faz cessar. O barulho cessa o canto.
Fernando Pessoa conhecia a experiência e referiu-se a "algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras."
A música como o canto dos pássaros acontece no silêncio dos bosques, quanto mais profundos mais silenciosos; mais linda é a melodia, os cantos mais harmoniosos.
É preciso que todos os ruídos cessem.
No silêncio, abrem-se as portas de um mundo encantado que mora em nós - como no poema de Mallarmé, “A Catedral Submersa”, que Debussy musicou. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar... Os poetas conhecem esta experiência.
O contrário não produz poesia.
Não se produz poesia em meio ao crepitar de uma guerra.
“Nosso olhar é submarino", escreveu T.S. Eliot:
“Olhamos para cima e vemos a luz que se fratura através de águas inquietas...”
No silêncio das profundezas se procura por si mesmo. No silêncio da meditação se busca no mais íntimo de nós as respostas às nossas mais sérias indagações.
Para mim, Deus é a beleza que se ouve no silêncio.
Não consigo, e sei que não peco - por que Deus me arquitetou assim – louvar, orar, meditar, dar graças, abençoar, em meio ao barulho, gritos, alaridos, falatórios exaltados de qualquer forma. Mesmo os produzidos à guisa de louvor. Não se concatena poesia no caos, antítese do cosmos. E, toda oração é louvor e poesia.
O paraíso era silencioso. No Grande Jardim Inicial, Deus passeava todas as tardes ao embalar da brisa perfumada. Ele o fez e o achou muito bom.
Deus amaria mais o mundo se os homens voltassem a transformá-lo no Grande Jardim, para que em silêncio o louvássemos de alma e coração.
De começo direi: - Nada substitui o trabalho do pensamento, análise, meditação e raciocínio. Sem interpretação e entendimento racional, não há aprendizado. Não se pode relegar a segundo plano o pensamento e em conseqüência, a ausência da aquisição do conhecimento, que só na paz de espírito e no silêncio, como a chama de uma vela se pode obter.
Não basta o silêncio de fora. Cessar o clamor da existência humana e seus desejos, o fervor das vidas desbravando e desafiando o mundo. É preciso silêncio na alma.
Lembro o recorte de meu pai contra o brilho da janela, com seu olhar perdido, olhando o espaço vazio, e as nuvens navegando o Tempo, desfiando as horas, ele repontando a vida a si mesmo. Cismando sobre a própria Criação.
Era – hoje eu sei – um sapateiro filósofo que aprendeu com a vida; um teólogo por seus constantes estudos da Palavra Sagrada e suas fervorosas Orações. Era comum sua sapataria ser visitada pelo Padre Ângelo da paróquia de São Benedito, às vezes por "seu" Samuel e "seu" Cruz, da Igreja Presbiteriana, onde eram presbíteros, outras vezes por um casal inglês Testemunhas de Jeová: Richard e May, ele conversando com meu pai e May querendo aprender a cozinha brasileira com minha mãe. Isto mostrava seu conhecimento teológico onde todos queriam beber um pouco da fonte.
A gravura em minha mente é de um homem de pensamentos. Em que cismava meu pai?
Minha mãe às vezes era ferina sem querer, mas pisava seu íntimo inteligente, quando lhe dizia: - Nardo, (Arnaldo) você é um homem de “sete instrumentos e sete necessidades”. Finalizava com um risinho irônico. Ele só dizia para ela uma interjeição herdada de seus avós sulistas: - Bah! E continuava em silêncio por um bom pedaço de tempo.
Sempre disse para mim: - A vida não é equivalente ao que lhe damos; do que somos capazes, do que sabemos e do que fazemos!
Em que ele pensava? - Jamais saberemos ao certo.
O que pensava na existência isso o sabíamos...
Como escreveu Rubem Alves: - “E aí se faz o silêncio e dentro
a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.”
Eu comecei a ouvir o silêncio, aprendi com meu pai a ouvir a quietude das coisas. As falas viram palavras escritas, e o gênio da escrita é o silêncio. Aprendi a me refugiar no silêncio das palavras não faladas. Aprendi que, "quando quiseres orar tu vais para teu quarto (teu templo, uma catedral dentro de seu quarto), e lá no silêncio desse teu templo tu irás orar em silêncio e em secreto, e vosso Pai que está em secreto te ouvirá.”
Os pássaros cantam seus variados cantos. Um grande estrondo os faz cessar. O barulho cessa o canto.
Fernando Pessoa conhecia a experiência e referiu-se a "algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras."
A música como o canto dos pássaros acontece no silêncio dos bosques, quanto mais profundos mais silenciosos; mais linda é a melodia, os cantos mais harmoniosos.
É preciso que todos os ruídos cessem.
No silêncio, abrem-se as portas de um mundo encantado que mora em nós - como no poema de Mallarmé, “A Catedral Submersa”, que Debussy musicou. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar... Os poetas conhecem esta experiência.
O contrário não produz poesia.
Não se produz poesia em meio ao crepitar de uma guerra.
“Nosso olhar é submarino", escreveu T.S. Eliot:
“Olhamos para cima e vemos a luz que se fratura através de águas inquietas...”
No silêncio das profundezas se procura por si mesmo. No silêncio da meditação se busca no mais íntimo de nós as respostas às nossas mais sérias indagações.
Para mim, Deus é a beleza que se ouve no silêncio.
Não consigo, e sei que não peco - por que Deus me arquitetou assim – louvar, orar, meditar, dar graças, abençoar, em meio ao barulho, gritos, alaridos, falatórios exaltados de qualquer forma. Mesmo os produzidos à guisa de louvor. Não se concatena poesia no caos, antítese do cosmos. E, toda oração é louvor e poesia.
O paraíso era silencioso. No Grande Jardim Inicial, Deus passeava todas as tardes ao embalar da brisa perfumada. Ele o fez e o achou muito bom.
Deus amaria mais o mundo se os homens voltassem a transformá-lo no Grande Jardim, para que em silêncio o louvássemos de alma e coração.