Viagens pelo Ceará XXXXVII
IDEIAS AVENTUREIRAS, MUSICAIS, LITERÁRIAS, MÍTICO-CURANDEIRAS, ENXADRÍSTICAS, TEATROLOGAS E INSANAS... DE MORADORES DO VALE JAGUARIBANO, NUM ANO DE ESTIO.
QUIXERÉ
O homem morava fora da cidade numa casa de taipa mas toda rodeada de plantas. Devia ser umas seis horas quando chegamos ao local. Apenas uma luz fraca brilhava no interior e no momento que paramos sem desligar os motores ouvimos latidos de cachorros na casa ao lado. Um senhor que parecia irmão gêmeo do velho Ariano Suassuna, sem camisa apareceu na porta, de lamparina na mão, em seu pescoço um grande crucifixo de madeira. Ficou parado no seu alpendre esperando a gente entrar no páteo. Antes de passarmos a porteira o velho levantou a lamparina acima da cabeça e mesmo no meio da algazarra dos cachorros eu o escutei dizer:
- Quem vem lá! É da parte de quem?
Aí o motoqueiro se identificou e disse que eu era um repórter e desejava conversar com ele. O homem nos recebeu sério e os cachorros foram parando seus latidos. Achei incomodo perturbar o homem e desculpei-me por ter vindo conhece-lo aquela hora, em seguida perguntei se eu podia vir no dia seguinte conversar um pouco. Eu gostaria de saber de alguns casos de caçadas, fotografar. O Aprígio com a cara bem fechada como estava, disse que sim mas só depois das onze horas da manhã. Pedi desculpas mais uma vez e ele sério como estava apenas balançou a cabeça afirmativamente.
Voltamos pra cidade e o moto-taxista me disse que o velho Aprígio era homem que não gostava de responder perguntas, que conversava pouco, era mesmo meio ignorante, mas podia ser que conversasse bem comigo, agora advertia que não era bom nunca interromper a conversa dele. Paguei e agradeci ao rapaz pelo alerta. Dirigi-me à pousada, também era hora de comer alguma coisa e descansar pra o dia seguinte.
OS CASOS CONTADOS PELO VELHO APRÍGIO
Naquela noite não dormi bem. Alguma coisa me incomodava e eu sabia que isso se dava de vez em quando em alguns lugares durante as viagens. Não pensei que fosse o ambiente carregado e sim coisas do meu estado de espírito, cansaço, tensão ou mesmo algo inconsciente e sem clara definição. Lá pelas duas da madrugada, levantei e peguei um dos livros que sempre trago e fui ler um pouco. Escolhi um conto de Sagarana e me pareceu que aquilo tinha alguma coisa a ver com o velho Aprígio caçador, que usava uma grande cruz no pescoço, rústico e sério devia ser um devoto. Esse pensamento foi rápido, um pouco depois o sono me chegou pra valer e dormi pesado, mesmo assim acordei depois das sete com pouca disposição e a cabeça doendo. Eu precisava espantar aquele mal-estar com um bom banho e se eu não melhorasse ia sim tomar algum analgésico, pois nunca apelo de primeira para remédios.
Resolvi sair para comprar algumas frutas, e logo depois voltei à pousada. Eu não me achava disposto a fazer fotos naquela manhã, ia relaxar um pouco e esperar a hora de visitar o homem. Saí da pousada para as compras, pensando em como iniciar uma conversa com ele. Por volta das dez horas eu estava bem melhor, levei apenas o gravador e a câmera digital pequena. Quando cheguei ao local ainda não eram onze horas, o portão estava fechado e os cachorros da casa ao lado não latiram. Observei que as duas casas eram situadas numa várzea e distavam uma distancia de uns trinta metro de uma pra outra. As portas de ambas estavam fechadas, fiquei aguardando no carro. Antes da hora marcada ouvi barulho de gente andando. O homem chegou acompanhado de outro e dois cachorros vira-latas nas coleiras. O velho trazia um facão e uma lamparina e o outro trazia um bornal de palha e um enxadeco no ombro. Cumprimentei aos dois e eles me cumprimentaram. Estavam vindo do mato, os cachorros pareciam saciados da aventura e o outro que estava com ele, aparentava cara de quem dormira pouco.
Obs:Tenho publicado somente no recanto das letras uma auto-biografia, meu primeiro livro, cujo nome é “Fascinado por chuvas”. Já este texto que voce acaba de ler é parte do meu segundo volume, cujo título e subtítulo pode se lê acima.
Caso essa seja sua primeira leitura desses contos, sugiro que leia desde o primeiro capítulo para uma melhor compreensão e proveito. Atenciosamente
Agamenon violeiro