Viagens pelo Ceará XIII
IDEIAS AVENTUREIRAS, MUSICAIS, LITERÁRIAS, MÍTICO-CURANDEIRAS, ENXADRÍSTICAS, TEATROLOGAS E INSANAS... DE MORADORES DO VALE JAGUARIBANO, NUM ANO DE ESTIO.
JAGUARUANA
Disse-me que viajou ao Recife quando era rapaz, trabalhou e estudou por lá, depois resolveu voltar. Gostava do seu lugar, mesmo com todos os dilemas ... que em sua cidade o povo era muito preocupado com boatarias e envolvido com as eleições. Eu lhe disse que tudo isso era normal em outras cidades e ele, embora não tenha vivido em muitas outras cidades, foi prontamente discordando de mim e dizendo que não, não era possível que em outras cidades acontecesse a "escuilambação" que acontecia ali. E eu ao notar que ele se alterava deixei a coisa como estava e resolvi não apresentar mais nenhum argumento contrário. E ele continuou.
Podia falar com toda certeza que igual ao povo da Jaguaruana não podia existir. Por ter se calado, ferroei o que ele achava da política eleitoreira, e ele disse que política mesmo era algo sério demais e ele não falava desse assunto, como não discutia causas religiosas... que política era coisa de interesse dos politizados e estes viviam ocupados com as suas grandes responsabilidades. Para não ficar calado poderia dizer alguma coisa sobre a sordidez do povo do seu lugarejo na época das campanhas. Do povo, e era bom não esquecer que candidato a cargo eletivo é sempre alguém do meio do povo e que quando há sujeira, esta afeta aos dois indistintamente. A luta pelo poder era coisa antiga e manjada e disso também não falava, preferia dizer alguma coisa dos esdrúxulos acontecidos da região.
Pois é, que eu soubesse que naquela cidade havia família que se dividia e irmãos que brigavam e casais que se separavam e gente que fazia pequenas e grandes apostas nas eleições, havia vandalismo, traição e tudo o mais no meio da politicagem.
O que se passava na cabeça dos sectários ninguém sabia, mas dava pra se ver muito bem as suas ações e efeitos.
Era incrível, mas ele conhecia um cidadão dali dentre tantos e tantas outras pessoas que, nunca havia trabalhado nem sido beneficiado com nada vezes nada do meio dos políticos locais, um sujeito que nunca tinha ido sequer a uma reunião na câmara de vereadores durante sua vida, um velho que nem precisava mais votar e por aí eu tirasse, pois bem, esse dito cujo se transformava no período eleitoral. Se tornava nervoso como quem tivesse defendendo sua integridade moral e física diante de um tribunal de acusação... que o tal fanático, efetuava trabalhos manuais de redes e quando falava defendendo seu candidato, ficava tremendo e até mudava de cor, se alterava visivelmente ao se referir ao opositor do seu candidato...e que isso até o deixava afetado. Naqueles momentos, ele Zé Arilo, tentava fazê-lo sair da angustiosa vibração... que não se preocupasse, era o que podia dizer, mas nem mesmo disso esse seu amigo se convencia, era dureza, não entendia aquilo!
O engodo era muito grande por essas causas, muito maior do que discussões sobre quaisquer outras preferencias. Sabia de casos de casais que devido às suas preferencias eleitorais, se desentendiam durante as campanhas, e muitas vezes chifres apareciam na cabeça de alguns. A "escuilambação" era grande, não era brincadeira não, o carnaval perdia, o carnaval era só três, quatro dias e tudo voltava ao normal, mas as campanhas dos políticos eram meses, cada fim de semana um passeio e muita gente junto em suas cumplicidades, o povo dali gostava era de disputa, eram loucos por essa causa, uma coisa meio sem razão.
Que havia pessoas interessadas em trabalhar isso era verdade, como igualmente existiam espertalhões com a finalidade de se darem bem em tudo que faziam.
Falou depois que na eleição deste ano, um chefe da política local que era apoiador e aliado à vencedora do pleito, falou no microfone da rádio logo a pós a contagem dos votos: "Eu botei o atual prefeito pra dentro e estou agora botando pra fora!" Por aí eu tirasse como era a política em pleno século vinte na bela e majestosa Jaguaruana.
Eu o ouvi com atenção e fiz menção de concórdia e foi mesmo que botar mais lenha na fogueira, ele continuou com a mais veemência. Que hoje em dia até padres estavam engajados em causas da política, não concordava com isso. Padre é pra ser padre, político é pra ser político, mas hoje existia de tudo, os noticiários divulgavam notícias de padres que largavam a batina e se casavam e desses ele não falava, mas padres pedófilos era outra coisa, pedofilia é crime, mas que eu imaginasse uma coisa, se hoje o homossexualismo era aceito no meio social, imagine quando padres declarados homossexuais se manifestassem para serem aceitos pela igreja... sim porque existia muitos deles com essa preferência... aí ele queria ver qual seria a posição da igreja nesse caso, até quando iria continuar a tradição do celibato. Mas a "escuilambação" era grande pois até mesmo houve Papa na história que teve mulher e isso era coisa velha...o caso do padre Amaro de Eça de Queiroz era coisa de ontem!
E como ele saltou de politicagem para assuntos da igreja, resolveu contar que havia feito romarias pra Canindé, prá Juazeiro e tinha ido até Fortaleza quando o Papa João Paulo II veio ao Brasil. E falou e falou... que ele mesmo já havia sido bem fervoroso na fé, mas via muita gente criando fantasia em torno de preferências e de uma religiosidade besta. Achava que essas romarias pra lugares daqui e pro estrangeiro hoje em dia, estavam mais pra turismo do que prá fé. Pra Juazeiro e pro Canindé o povo que faz promessa leva aqueles votos de madeira, e muitos dizem que conseguiram graças e disso ele não duvidava, mas que existia um forte comércio em torno das romarias isso era inegável. Mas que eu prestasse bem atenção, se ele não estava certo, o caso do padre Cícero era uma prova de que padre não devia se meter com política, e o cantador Pedro Bandeira ainda teve a coragem de fazer um poema-cordel propondo ao papa João Paulo II, a canonização de Cícero Romão Batista, um vigário que foi até proibido pelo próprio vaticano de celebrar missa... que eu entendesse que ele não estava falando mal do poeta, mas do absurdo dos versos do cordel... se tinha cabimento um sujeito padre engajadíssimo em coisa de política naquela época!
Mas ele ia ficar calado, sabia dos fatos contados pelos livros, Deus sabia e o que o padre do Juazeiro havia feito, mas, quem sabia, se a história no futuro não poderia até dizer outra coisa sobre o milagreiro! Quem sabe?
E o Zé Arilo não parava de desfiar seus conhecimentos de casos assim e alguns torpes até. Agora vinha com outro relato de que em Morada Nova existia um padre que ele conhecia bem, este havia tido um caso com uma mulher há algum tempo atrás quando foi da paróquia do Aracati... o religioso era e é um bom pregador e cantor de boa voz, você sabe, impressionou muita gente e não se sabe se a mulher foi seduzida por ele, se ela o seduziu ou se ambos começaram a despertar as emoções de homem e mulher juntos. Muitos moradores por lá sabem do caso... e ele não ia longe não, ali mesmo nas barbas dele na sua cidadezinha havia acontecido coisas do arco da velha. Um padre recém-chegado por lá, foi assassinado e tudo parecia que pelo meio do crime havia envolvimento com práticas sexuais abominadas pela madre igreja, um negócio sério, caso de de polícia... outro caso antigo de padre dali, sim porque ele não era de ficar falando de casos de outros lugares, noticiados por jornais e televisão, pois bem, esse outro chegou a monsenhor e já era falecido, era pai de filho feito em mulher por ele mesmo e isso também não era segredo. O dito monsenhor era querido por muitos da região por ser um pregador prático, avesso à burocracia da igreja, casava e batizava no atacado quem aparecesse e sem nenhuma exigência. Era um amante da boa mesa, adorava uma galinha caipira nas festas e fazia questão de ser convidado para todas, era também profundo leitor de filosofias e como nada é perfeito era um tremendo desastrado no volante de um carro, só não ia dizer o nome do santo por uma questão de ética cidadã.
Obs:Tenho publicado somente no recanto das letras uma auto-biografia, meu primeiro livro, cujo nome é “Fascinado por chuvas”. Já este texto é parte do meu segundo volume, cujo título e subtítulo pode se lê acima.
Caso essa seja sua primeira leitura desses contos, sugiro que leia desde o primeiro capítulo para uma melhor compreensão e quem sabe proveito. Atenciosamente
Agamenon violeiro