“Há vários motivos para não se amar uma pessoa e um só para amá-la”. (Drummond)
 
Ivone com os seus 19 anos já era cobiçada pelos rapazes do vilarejo. Menina bonita e de cabelos cacheados destilava desejo até no modo de andar.
 
Eu ficava de longe assistindo as disputas acirradas para conquistar seu coração, me mordendo de ciúmes, pois sabia que nunca poderia ser o homem dela.
 
Primos de primeiro grau crescemos juntos, eu era mais velho que Ivone apenas dois meses.
 
Éramos inseparáveis, eu por não conseguir viver longe daqueles olhos, ela por ver em mim um irmão que nunca teve.
 
Eu tinha de me contentar com essas migalhas jogadas por Ivone. Eu, um pobre cão.
 
Confesso que me sentia bem com isso, pois eu tinha mais que os outros. Eu tinha seu sorriso, eu tinha seu cheiro e tinha também suas conversas. Ah! Ficávamos horas a falar e rir de tudo e de todos. Ivone ria a toa e aprendi a me alimentar daqueles risos.
 
Mas sentia que um dia aquilo iria acabar... E acabou.

Chegou ao vilarejo o Marcos. Com seus vinte anos e já com trabalho garantido na farmácia de seu avô. Marcos era meu conhecido e de Ivone também. Ele era o garotinho mimado e rico que foi estudar na capital. Já fazia algum tempo que não víamos Marcos que até nos esquecemos dele.

Agora volta causando o maior burburinho entre as meninas, trazendo desconforto entre os rapazes, incluindo minha pessoa.

Notei que Ivone se interessou rapidamente ao vê-lo rodeado de meninas, todas com pretexto de saber como era a vida na capital.

Marcos foi o centro da atenção, mas só uma menina atraiu a sua. Ivone.

As trocas de olhares evoluíram para conversas e logo Ivone me confessava a paixão por Marcos sem nem perceber a minha dor.

Aquele dia eu senti o mundo rodar e os pés saírem do chão. Meu maior medo se materializava bem a minha frente. Eu perdia Ivone.

Os dois começaram a namorar com o consentimento de toda a família, menos o meu. Eu ainda a amava em segredo e sofria terrivelmente por ver Marcos sorvendo os beijos que nunca seriam meus, mas que eu queria avidamente.

Ivone não me procurava e todo o tempo estava com Marcos. Impressionante como
Ivone ficou ainda mais bonita e eu definhava a olhos vistos.


Deitado em meu quarto e traçando planos para ir embora para longe de Ivone eu ouço me chamar:

- Nego! – só Ivone me chamava assim.
 
De repente as batidas descompassadas me fizeram lembrar que ainda tinha um coração. Sem vida, mas tinha.
 
De um salto fui à janela para vê-la. Era ela, mais linda e radiante do que nunca. Mil coisas passaram pela minha cabeça. Menos o que Ivone iria me dizer.
 
- Ivone? – consegui dizer.
 
- Oi Nego! Você sumiu.
 
- Eu, sumi?
 
- É.
 
Consegui esboçar um sorriso amarelo e nada mais dizer. Ficar ali, só olhando Ivone já era o suficiente para que eu recuperasse a vontade de viver. Mas a vida gosta de nos pregar peças.
 
- Nego, eu vim compartilhar minha alegria com você. Sorrindo ela continuou – você é muito importante pra mim e eu quero que você seja meu padrinho de casamento, você e a Glorinha.
 
 
O que ela continuou dizendo eu não consigo me lembrar, pois o que eu ouvia era somente minha respiração ofegante e o coração bater sem rumo.
 
Meus olhos se escureceram e nada mais viram.
 
Também não consigo me lembrar como eu vim parar nesta cela...

Paulo Moreno
Enviado por Paulo Moreno em 21/03/2013
Reeditado em 21/03/2013
Código do texto: T4200450
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