A CORTEZÃ VIRGEM - Cap.XIII

A CORTEZÃ VIRGEM – Cap.XIII

- Eu não sei Jessika, apenas eu penso assim, e nem sei por que estou falando estas coisas, se eu mesma nunca pensei assim! Pode ser iluminação. Alguém gostaria de lhe falar isso. Pessoa com mais experiência de vida e entendimento!

- Estranho! Eu nunca pensei que você tivesse uma filosofia de vida desta!

- Não é filosofia, é apenas vivência com pessoas que já passaram por todos estes problemas!

- Mas não deixa de ser filosofia de vida!

- Pode ser, mas creia que foi sem pensar; não costumo falar estas coisas. Mesmo por que eu não entendo nada sobre isso! Eu acho melhor mudarmos de assunto. Vamos falar de coisas que entendemos; “O amor!” Este bichinho que está mordendo seu coração e de Rogério!

- Pode até ser, Jaade, mas eu não quero, e não posso me envolver com o Rogério, nem com homem nenhum!

- Não pode ou não quer? A não ser que exista por traz disto, um grande amor!

Pode ser, e por que não?

- Ah! Então existe! Não quer falar sobre ele?

- Não, não quero!

- Lhe faz mal?

- Talvez!

- É por isso que você se conserva virgem?

- Não. Eu nunca vou lhe pertencer!

- Não? E por que não?

- Sabe, Jaade, eu não gostaria de falar neste assunto!

- Por que você foge Jessika, você tem medo dos homens?

- Claro que não. Apenas eu não posso!

- Está bem, se um dia lhe fizer bem falar sobre o assunto, eu estarei disposta a ouvi-la, e ajudá-la se for possível!

- Obrigada minha amiga pela compreensão!

Já era tarde, e as duas terminaram por adormecerem na mesma cama, só muito mais tarde, já quase amanhecendo o dia quando Jessika acordou. Ajeitou as cobertas sobre Jaade e desceu!

Apesar da madrugada fria, Jessika foi até o lago. Algumas estrelas ainda pontilhavam o céu; e resplandecia no lago!

Jessika pensou: Não demora amanhecer, e logo a lida da cidade vem perturbar este silêncio. Eu nunca pensei que era tão bonito, o amanhecer do dia!

Esta é a primeira vez que vejo! É mais bonito até que as noites!

São menos tristes! O romper do dia parece estar desvirginando a madrugada, e desabrochando uma nova vida!

É o ventre da noite que se abre para abortar este embrião que para muitos não conseguem tornar um feto com vida.

“Vida! E que é vida? Se a perdemos quando mais precisamos dela!... Meu Deus, por quê? Alivie senhor este meu coração, não deixe que eu cometa o absurdo de discordar dos seus desígnios. Não permita nunca que por nenhum momento eu sinta revolta, e discorde de ter levado a minha querida Joice! E por fim, meu Deus ilumine-me este meu caminho que está tão difícil de trilhar! Ajude-me tomar esta decisão. O que fazer com esta fortuna que Joice deixou; adquirida com tanto sacrifício, trabalho sofrido humilhação, e tantas coisa mais. Ela não me pertence apesar de que por lei é minha. Ajude-me Senhor!”

Um dia Joice me disse: “Você vai ser muito feliz!” “Felicidade!” Que tipo de felicidade é esta, quando ela tentou construir a sua própria e não consegui! Foi arrebatada assim tão prematuramente!

Uma folha caiu no lago, e as pequenas ondas que formavam círculos, foram deixando aparecer uma forma de rosto que com uma vós suave disse: “Não deixe a sua imaginação criar fantasmas! Quando ela própria, por si só pode ser um fantasma, e poderá destruir você!” Não pense em mim como fantasma, mas como uma doce lembrança. Tenha-me sempre no seu coração como tal. Viva a vida que desejei viver, e não consegui, mas estou vivendo na sua pessoa. “Eu dei a você” Viva por mim! A vida é linda minha querida, mas nunca despreze a morte! Mas enquanto você pensar em mim com amor, eu não morrerei jamais. Estarei sempre viva no seu coração, e daqueles que amei e me amaram!”Não chore por mim eu estou em paz”!

Aquela imagem foi desaparecendo e Jessika começou a gritar: Joice, Joice, não vá! Por favor, não me deixe!...

Os grandes círculos que se abriram, fecharam novamente para nunca mais voltar!

Os gritos dela despertaram Dona Zuleica, e Jaade, que a encontrou caída com a metade do corpo dentro do lago, como se tivesse se atirado de propósito, ou apenas desmaiado. Ou ainda uma força qualquer a tivesse detido, evitando afundar no lago!

Levaram-na desmaiada para dentro ardendo em febre, e delirando. Rogério foi chamado ás pressas. Foi muito difícil a sua recuperação.

Jessika não quis dizer o que se passou no lago, mas Jaade disse: “Eu já esperava isso. Ela ontem estava muito abalada, apesar de não ter demonstrado!”

Uma semana de cama! Rogério comentou consigo mesmo! “Será meu Deus, que vai começar tudo de novo?” O que você falou Rogério, perguntou Jaade.

Nada, estava falando com os meus botões.O que você falava para eles eu não posso saber?

- Não tem importância, Jaade, fique com Jessika. Eu vou passar na casa de Dez, e pedir para que ela deixe você ficar aqui uns dias com Jessika, e trazer-lhe algumas roupas!

- Não será necessário, Rogério, eu já estou boa. Não quero atrapalhar a vida de Jaade, por um pequeno mal estar!

- Pequeno mal estar? Você sabe quanto tempo durou este pequeno mal estar, minha querida, você tem idéia?

- Bem, foi nesta madrugada, eu estava sem sono e fui até o lago. As ondas que formavam círculos quando caia as folhas me deixaram tonta então caí. Mas foi apenas um desmaio sem importância! Eu não me alimentei direito ontem, e estava um pouco nervosa! Foi só isso. Não vamos fazer um “cavalo de batalha”.

- Realmente, Jessika, não foi nada demais. Mas eu vou levá-la para fazer uns exames!

- Exames? Por um simples desmaio?

- É sim. Por um simples desmaio é que precisamos fazer exames, por precaução apenas!

- Está bem, quando o Doutor quiser!

- Agora, minha cara; aproveitemos para dar uma caminhada e conversarmos!

- Sobre o que Rogério, não me diga que vai me pedir em casamento!

- Quem sabe!

Jaade foi saindo devagarzinho, a fim de deixá-los a sós; mas Jessika percebeu, e perguntou-lhe: “Aonde a senhorita vai? Por favor, fique; preciso falar com você quando eu voltar!”

Por enquanto dê uma mão a Zuleica. Ela está nervosa. Faça companhia a ela. Eu vou falar com Dez, e justificar a sua ausência na casa dela!

- Está bem, Jessika, tenho certeza de que ela compreenderá. Jaade piscou para o Rogério que disfarçadamente a acompanhou, enquanto Jessika se aprontava com a ajuda da Zuleica que lhe disse: “Quando a senhorita voltar vai direto para cama. O doutor ordenou repouso.”

- Repouso? Eu não estou doente!

- Menina, o que você me falou, que eu poderia puxar suas orelhas, não disse? Então não me desobedeça!

- Ai que medo! Como estás brava!

Jessika abraçou Zuleica e disse: Obrigada minha amiga. Começo a sentir o seu amor. Deus lhe pague por tudo!

Prometo que vou repousar; disse fazendo um gesto com os dedos!

Jaade perguntou ao Rogério, qual era o estado real dela se era grave!

- Não sei. Só após os exames! Mas estou achando muito estranho. Aparentemente ela está bem. Eu a examinei e não vi nada de anormal!

- Então por que este desmaio? Será que está grávida?

- Grávida?! Você enlouqueceu Jaade? Já se esqueceu que ela é...

- Ah! É verdade, havia me esquecido. Mas também o nosso meio! Vai demorar os resultados dos exames?

- Não. Vou pedir prioridade, com a máxima urgência!

Para surpresa do Rogério e dos médicos, não encontraram nada que justificasse aquele desmaio tão prolongado!

Quando Rogério trouxe o resultado dos exames, Jessika perguntou: “Então doutor, eu vou morrer? Estou muito mal?”

- Não. Felizmente não. Os exames deram todos negativos.

- Negativos? E por que ela ficou tanto tempo desmaiada, perguntou Jaade intrigada!

- Tanto tempo? Como tanto tempo? Olha Jessika, disse Rogério: - Nós escondemos de você o tempo que você ficou desmaiada. Mas veja você mesma. Olha esta data. Não diz nada?

- Não. Pôr que? O que tem esta data?

- Que dia é hoje? Você não percebeu nada?

- Não, Rogério, não me atormente mais com este enigma. O que tem este dia? Para mim é um dia igual aos outros!

- Jessika, não se trata do dia de hoje, apenas eu gostaria que você percebesse esta data. Quantos dias passaram depois que você teve aquele desmaio!

- Não. Eu não sei de que você está falando. Quantos; o que? Você disse dias?

- É isso mesmo, Jessika, disse Jaade. O seu pequeno desmaio durou apenas cinco dias. Mas o seu estado de saúde era bom. Rogério nem quis interná-la, para não chamar a atenção de outros médicos. Ele sabia que o seu estado de saúde era perfeito, apenas não entendia por que você continuava desmaiada!

- Bem, agora eu vou embora, disse Rogério: Vou deixá-las conversando.

O medico foi embora, e as duas ficaram conversando.

- Agora que tudo passou Jessika, diga-me o que aconteceu naquela madrugada com você?

- Eu não sei. Só me lembro que estava quente, e eu saí para tomar um pouco de ar. Fui até o lago. Fiquei por muito tempo olhando a serenidade daquelas águas, e pensava: “O que terá por baixo deste lago, tão sereno na sua superfície? Que mistério será este? Eu tenho certeza de que Joice sabia! Mas ela nunca quis me dizer, nem mesmo falar sobre isso. O que será meu Deus, e se eu entrasse aí?”

Foi nesse momento que uma folha caiu no lago, e começou formar aqueles círculos, que fazem quando cai uma folha, uma pedrinha; ou uma flor no lago. Os círculos foram se formando, e dentro de um deles apareceu o rosto da Joice, e me falou umas coisas estranhas que não entendi, nem queria concordar como que ela estava dizendo. Eu não podia me conformar com aquilo, mas era ela quem estava falando, e era o seu desejo. Então o rosto dela foi desaparecendo. Então eu me atirei no lago, e não entendo como não morri como não desapareci no sumidouro.

Talvez ela não quisesse que eu a acompanhasse!...

- Sabe, ela estava muito feliz... Meu Deus, que felicidade irradiava no seu semblante, nos seus olhos!

Sabe? Gostaria de ter ido com ela. Eu sei que Joice está lá dentro do sumidouro. Ela estava lá, e foi de lá que ela!...

- Jessika, querida, você não está bem. Precisa se conformar. Joice morreu, ela não voltará mais, e você só pode prejudicá-la agindo assim. Lembre-se; ela gostava muito de você. Ela a fez sua herdeira universal. Será que isso não lhe diz nada? Pense!...Se ela não gostasse tanto de você, não teria feito o que fez, deixado você numa situação financeira invejada até por muitos abastados da Bahia! E tudo o que ela deseja é paz, e só você poderá proporcionar-lhe esta paz!

- Sabe, Jaade, eu não queria o dinheiro dela. Eu queria apenas trabalhar, aprender a viver, a ser uma mulher, e nada mais. Não é o dinheiro! Não nego que foi por ele que vim para cá. Eu precisava ganha-lo para ajudar meus pais que passavam tanta necessidade. Agora sou uma mulher rica. Poderia estar feliz, se o dinheiro fizesse as pessoas felizes. Joice então seria a pessoa mais feliz do mundo porque ela tinha dinheiro; era educada, culta, tinha o mundo aos seus pés.

Ela era feliz? Não! Ela não era feliz!... Agora sim ela está feliz! E aonde ela foi encontrar a felicidade? - Jessika, você está se martirizando, e por uma coisa que você não tem certeza! Joice era feliz sim. Ela era muito feliz! Você não a conheceu!...

- Engana-se minha amiga! E não era por que sabia que ia morrer prematuramente!

- Para com esta divagação, Jessika; você não sabe o que está dizendo!

- Mas um engano seu, minha cara! Sebe, Jaade, você é ainda muito criança; não tem a percepção das pessoas adultas. Por isso não a censuro, e depois você teve pouco tempo de convivência com ela.

- Não por isso minha cara, disse Jaade: - Você teve também pouco tempo, apenas morou um tempo. Isso não lhe dar o direito de dizer que ela era infeliz!

- O bastante para lhe afirmar sim, que ela era muito infeliz!

- Por que isso, Jessika, pode me dizer?

- Não, não posso, por que também não sei!

- Veja, você continua divagando! Mas me diga o que Joice lhe disse exatamente, naquela madrugada!

- Eu não saberia repetir o que ela disse. Por isso eu desejo pensar um pouco, tentar me lembrar suas palavras. Quem sabe eu conto um dia para você. Mesmo por que eu não sei se ela quer que eu conte para alguém!

- Nem mesmo para o Rogério?

- Creio que sim!

- Você vai encontrá-la novamente?

- Vou voltar muitas vezes, mas não para encontrá-la!

- Não?

- Não. Ela nunca mais voltará! No sumidouro ela estará muito mais feliz.

- Feliz morta?

- E se ela não estiver morta?

Jessika não conseguiu terminar a frase, correu para os seus aposentos, e ninguém, por mais que implorassem, não conseguiram convencê-la abrir a porta.

Zuleica, Jaade, até mesmo o Dr. Rogério, por que o chamaram as pressas!

Ele perguntou se ela estava bem. Ela disse que sim, apenas queria ficar só. Então Rogério pediu que a deixasse só.

No dia seguinte, ela acordou muito animada. Não parecia que tivera uma crise de nervos na noite anterior. Então Jaade tomou café com ela sem tocar no assunto. Ela estava sorridente. Jaade não estava entendendo nada, mas ficou preocupada. Então disse: - Sabe, Jessika, eu não posso ficar mais tempo aqui, a madama Dez, reclama minha presença. Ela disse que tenho que voltar imediatamente!

- Está bem Jaade; eu a acompanho. Preciso mesmo agradecer-lhe a gentileza de ter permitido você ficar estes dias. E tenho outros assuntos a tratar com ela!

- Você gostaria de ficar aqui comigo, Jaade?

- Se gostaria? Você me pagaria o mesmo que ela?... Desculpe-me Jessika, eu dependo deste dinheiro que ganho para ajudar a minha família. Do contrário, eu ficava com você sem ganhar nada!

- Está bem, vamos ver o que posso fazer!

Jaade percebeu que alguma coisa havia mudado. Tinha algo de estranho no seu olhar, na sua atitude, no modo de falar. Ela não sabia o que era, mas houve uma grande transformação de ontem para cá, pensou!

Á tarde daquele dia, Jessika levou Jaade para a casa da madama Dez, que a recebeu de uma maneira muito cordial.

Ela já sabia que Jessika era a herdeira de Joice, e que sua fortuna era muito maior do que a dela. O que a madama nunca se conformou que Joice tenha acumulado tanto! Então Jessika disse: - Eu gostaria de ter a Jaade comigo!

- Bem, Jessika você sabe que ela vai me fazer falta. Depois ela veio para minha casa a pedido dos pais!

- Disto eu me encarrego!

- Não vai ser fácil arranjar outra igual a ela!

- Quanto Dez?

- Você sabe, ela...

- Quanto? Não percamos tempo!

- Eu não sei, nunca fiz negócio desta maneira!

- Isso não é um negócio, apenas estou pagando os gastos que teve com ela!

- Está bem, pode levá-la; isso se ela quiser. Quanto ás despesas que tive; eu lhe mandarei a conta, está bem?

- Está ótimo. Eu encarrego de acertar as coisas com os pais dela!

- Está bem!

- Vamos Jaade, apanhe as suas coisas o chofer vem pega-los.

Jaade não entendeu bem o que havia acontecido, não entendeu como Jessika pode falar assim com a madama Dez. Ela é muito poderosa, pensou!

No retorno para casa, as duas não conversaram. Jaade tinha medo de perguntar-lhe alguma coisa. Agora ela era sua empregada. Antes eram amigas!

Jaade já começava se arrepender da troca, mas pensou: - Não, Jessika não pode ter mudado de uma hora para outra. Como também não pode ser tão má patroa, como é tão boa amiga!

Quando chegaram a casa; Jessika subiu para os seus aposentos, sem mesmo despedir da Jaade, que também foi para os aposentos que tinha ocupado como hóspede, e amiga da Jessika. Agora teria que esperar como ia ser.

O jantar já estava posto; e Jaade não compareceu. Jessika perguntou: Onde está Jaade, Zuleica? - Ela não desceu!

- Não desceu por que, ela não está se sentindo bem?

- Não sei senhorita!

- Zuleica, por favor; mande chamá-la!

- Mandou me chamar, senhorita? Perguntou Jaade!

- Senhorita?! O que está se passando aqui? Primeiro a Zuleica me chamando de senhorita, agora você, Jaade?

- Bem, nós tivermos conversando. Você está diferente. Eu agora sou sua empregada, e não sei como devo me comportar. Espero que você determine o meu lugar na casa, as minhas funções!

Jessika levantou, porque já estava sentada a mesa. Pegou no braço da Jaade com força; e disse para Zuleica acompanhe-me!

Subiram para os seus aposentos, sempre segurando no braço de Jaade, e disse para elas em tom de raiva!

- Sinceramente, eu não estou entendendo a atitude de vocês. Eu não quero aqui na minha casa empregados. Quero amigos. Cada um na sua função é claro! Se não posso contar com vocês como amigas, estão dispensadas!

Quanto a você Jaade, depois do jantar vá aos meus aposentos, precisamos conversar.

Por favor, Zuleica; mande chamar Rogério.

O jantar transcorreu num silêncio mortal. Nem Jaade, nem Zuleica tinham coragem de falar alguma coisa!

Quando Rogério chegou, antes de falar com Jessika, Jaade conversou com ele e contou-lhe o que estava se passando.

- Me anuncie. Vou ver o que está acontecendo.

- Não sei Rogério. Já tenho minhas dúvidas se seremos mesmo amigos!

Lício Guimarães
Enviado por Lício Guimarães em 05/02/2013
Código do texto: T4124196
Classificação de conteúdo: seguro