As Sororocas
As sororocas que vinham na rede
Por Débora Peixoto
De longe se ouve seu constante assovio... com todas as notas harmonizadas em suaves canções... tecendo sua rede...fechando os buracos feitos pelos siris. Assoviar também é uma de suas predileções de amores.
Ele gosta de ser chamado de “amante do mar” ou “aquele que entende da pesca.”
Por muitas vezes, pode ser visto lançando sua rede de arrasto, rindo com alguns amigos...em seu hobby habitual...tanto pela companhia do mar, como dos amigos.
Suas histórias com o mar são muitas. Pescar é revivê-las, sem sentir dor de saudades ou medo de esquecê-las. E isso ele faz nobre e prazerosamente.
De cá se ouve ecos dos risos espaçados e saltitantes, quando vem em sua rede, grandes e variados peixes...anulando qualquer possível “história de pescador.”
Não fosse desconexo... daria para ver alegria nos peixes diante de tamanho regozijo ao serem pescados.
-Hoje terá moqueca! Prepare os ingredientes...há peixes frescos chegando.
Sobre a mesa...a panela de barro ainda fervilhando e exalando cheiro de um bom, farto e agradecido almoço, preparado pelas mãos da prendada cozinheira.
Como são felizes esses almoços!
Mas hoje não há peixes...não há outro alimento...não há assovios, nem canções.
Hoje só ele, a rede e um olhar distante para a linha do horizonte. Olhar de pedido de ajuda aquele que tantas vezes o ajudara em alegrias e sustento.
-Preciso de você...não há nada para comer.Dá para ouvir o sussurrar dos seus pensamentos ao som do vento rodeando a praia.
Coloca silenciosamente sua rede ao mar e fica ali... horas...esperando...pensando em quem dependia de alguns peixes para o almoço daquele dia.
Passado algum tempo ele volta ao mar para conferir a rede.
Lá estão elas...muitas sororocas. São deliciosas, quando fritas.
Seu sorriso se estampa com rapidez, pois o alimento para aquele dia estava garantido.
Engraçado como as sororocas pareciam estar em seu tempo...se é que existe um tempo só delas. Todos os dias vinham na rede apenas sororocas.
-De novo sororoca? O que acontece com o mar...que só tem esse peixe?
-Melhor aprender a agradecer. Antes sororoca a nada.
-Comeremos sentindo o sabor dos outros peixes que gostamos. Se não acontecer, ainda assim seremos bem alimentados. Isso é provisão de Deus e devemos ser agradecidos...sempre.
Assim acontecia. Dia era sororoca com limão e arroz...dia sororoca com arroz e limão.
Enfim, a fase das sororocas passara. Ele voltara a trabalhar e agora poderia voltar em sossego para suas pescadas divertidas sem nada esperar.
O que fora aprendido ali não há preço... o valor é inestimável.
Não murmurar durante as dificuldades advindas dos dias...não questionar seus porquês... e principalmente confiar que Deus olha pelos seus em todo o tempo.
A repetição diária das sororocas foi apenas um desafio para alcançar esse conhecimento...e felizes são aqueles que o alcançam.
Que meus olhos vejam por muitos anos... papai assoviando suas canções...tecendo sua rede...feliz por mais uma pesca que virá...ou apenas por estar ali...no seu momento