DESTINO

Um carro escuro, possivelmente. Atravessa a noite pela estrada. Uma mulher acredita no destino, nem sempre acreditou, só ao fim da consulta de algumas obras de literatura menor. Reconheceu a autenticidade daqueles que foram vítimas do destino. Deixou tudo para trás, o passado era tão denso como a névoa que cobria a noite decisiva. O carro de cor escura diluía-se no espaço e a velocidade não permitia captar senão um silvo e um risco luminoso e repentino na paisagem. A última palavra só com muita dificuldade a pôde ouvir, sem a entender. Escolheu a curva perfeita à direita, o momento exacto. Acelerou até ao limite e o corpo adormecido ao seu lado desfez-se no asfalto húmido, perdendo o rosto a sua identidade. Um carro escuro atravessa a noite e uma mulher loira sorri ao cumprimento do destino. Que palavra a vítima terá pronunciado antes de ser empurrada com um golpe tão eficaz como fatal? Já não tem importância, um pequeno pormenor para esquecer.

In "CONTOS EM 8 MILÍMETROS", 2013