Do Ocaso a Alvorada: Páginas de uma vida qualquer.

Silêncio...

São exatamente 23h30min e eu aqui na escrivaninha do meu quarto debruçado sobre uma pilha de papéis, com as quais tento - de certa forma - descrever meu ano que findar-se-á logo menos. Puto com o insucesso de minhas intermináveis tentativas, levanto-me da cadeira e vou até a cozinha - buscar qualquer dose de álcool que encontrar na geladeira – deparo-me com uma garrafa de vodka e algumas frutas da ceia passada, então paro de pensar no que devo escrever e entro num mantra de descascar as frutas e soca-las num recipiente para que seu sumo possa misturar-se com a bebida e aromatizar todo o ambiente.

E foi nesse momento em que o perfume de morangos, framboesas e blackberry com o teor alcoólico da vodka encheram o ar com o seu aroma,transportando-me aos acontecimentos que, por diversas vezes, narrei aqui e que agora, ao dar-me conta você vem discutir comigo. Sirvo-me de uma dose e despejo o resto em outra taça dirigindo-me de volta ao meu quarto convidando-te para que possamos desfrutar-nos desse drinque e dialogarmos sobre essa infinidade de coisas com as quais concordamos e discordamos, tantas vezes.

Entre um cômodo e outro, arrumo um quadro aqui, um porta-retratos ali sob o seu olhar interrogativo e seu sorriso torto nos lábios, demonstrando que me conhece mais do que deveria. Apanho mais uma cadeira, recolho alguns papéis amassados da escrivaninha para que você possa acomodar-se da melhor forma possível – já que o papo será longo. E foi desta forma, que iniciamos a nossa conversa, que tardou para acontecer, mas que – uma hora outra – sabíamos que aconteceria.

Você serve-se de um gole da bebida e sem falar nada permite que eu tome a iniciativa e comece a detalhar algumas situações das quais vivi e dissertei para alguns entes, embora, você não precise que eu conte nada – já que as viveu comigo. Contudo, mostra-se interessada em cada detalhe e em cada particularidade delas – mesmo sabendo que seriam bem melhores se narradas por você. E foi entre uma risada aqui e uma discussão ali que avisto da janela do meu quarto meus familiares, todos arrumados para mais uma comemoração de passagem de ciclo, na qual restam menos de 10 minutos para acontecer.

Sem notar, você aproxima-se de mim e recosta uma de suas mãos sobre o meu ombro, como quem diz: “- O que está esperando pra ir ao encontro deles?”. Observando-os ainda, respondo com desdém:

“– O que te faz pensar que quero estar junto deles?”.

- Foram suas palavras ao depara-se com a minha irmã ou vai me dizer que esqueceu delas também? Pois, caso queira, posso repeti-las, já que você não estava só naquele momento.

“... Por favor, não me leve agora. Não quero ir embora. Tenho tanta coisa pra fazer, tenho um filho pra ter e motivos pra crer que ainda não é hora” – sussurra-me com deboche.

Irritado com o rumo que aquela prosa estava tomando, fecho a janela e volto a minha concentração pra criação de um texto (ignorando-a por completo). Tomando ciência de que não haveria mais conversa ela entrega-me um embrulho, abraça-me e vai embora, pego o pacote e coloco sobre a escrivaninha, olho pro relógio e já são 23h57min, amasso mais uma folha - aporrinhado por não conseguir dissertar nem 2 parágrafos com alguma coerência.

Tomo o último gole da minha bebida e resolvo analisar melhor o embrulho que me foi entregue, aparentemente envolto em um papel pardo velho e completamente amassado, amarrado com um barbante e completamente cheio de pó. Intrigado com o objeto resolvo abri-lo tentando discernir o que se tratava, tiro-o da embalagem e percebo que se trata de uma espécie de livro com capa dura, negra como as asas de um corvo com uma gravura em dourado, a qual não consigo decifrar. Assopro o pó que atrapalha a minha visão e, neste momento, ouço o barulho ensurdecedor dos fogos de artificio pintando o céu escuro sobre nossas cabeças que anuncia o termino e o início de um ciclo e leio o seguinte prefácio:

“Esse é o primeiro dia de um novo ano, então com o misto de emoções que você limpou o pó da capa deste caderno que iniciamos uma página em branco, sem sabermos ao certo se esse registro marcará o início ou o auge de um pós-escrito á uma história que o antecedeu ou o precederá. Por isso, não tenhas medo e espero que possa usá-lo com a mesma sabedoria e emoção que preencheu o último livro que lhe dei”.

Carinhosamente, Vida.

Dr Vilela
Enviado por Dr Vilela em 31/12/2012
Reeditado em 09/08/2013
Código do texto: T4061452
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