Pacto de amizade

A amizade que as unira a vida inteira chegara ao fim. Por mais que se esforçasse, não conseguia acreditar naquilo. Sua alma se corroía de dor.

Na infância, eram as melhores amigas, compartilhavam brinquedos, roupas, até mesmo as mães.

Na adolescência, eram uma só. Gostavam das mesmas coisas, tinham as mesmas ideias, viajavam para os mesmos lugares nas férias. Se fossem irmãs não seriam tão parecidas. Só em uma coisa diferiam:uma adorava rosas, a outra era fascinada pelos jasmins.

Eram confidentes uma da outra: o primeiro amor, as dúvidas, as certezas. Aconselhavam-se mutuamente, descobriam a estrada da vida juntas. Eram amigas inseparáveis.

Nos anos finais da adolescência, descobriram o prazer do sexo. Decidiram que iam perder a virgindade e, como não aparecia o cara certo, resolveram escolher qualquer um, sem compromisso. No dia seguinte, uma correu para casa da outra para contar tudo em detalhes.

Já adentrando na fase adulta, passaram no vestibular. Alegria em dobro. Como escolheram o mesmo curso e a mesma faculdade, iam continuar estudando juntas.

A amizade das duas era fascinante e comovente. Chegaram a fazer um pacto, quando ainda eram adolescentes, que era renovado todos os anos. No dia que uma delas morresse, a outra se mataria. Uma não conseguiria viver sem a outra.

Os anos de faculdade foram difíceis. Muitos livros, madrugadas sem dormir. O curso era puxado, mas, tinham uma a outra e isso bastava.

Os anos se passaram. Conluíram o curso. Começaram a trabalhar.

A amizade havia se solidificado ainda mais com a maturidade. A única coisa que lhes faltara na vida fora um amor verdadeiro. Nas inúmeras conversas que tinham, lamentavam-se pela ausência de um grande amor.

Uma noite, foram juntas a uma festa. Lá, finalmente, encontraram o que procuravam. Parecia mágico, aconteceu no mesmo instante para as duas: dois irmãos igualmente garbosos aproximaram-se e iniciaram um flerte com ambas.

Não acreditavam naquilo. Haviam conhecido seus amores no mesmo instante. O casamento não tardou. Logicamente, marcaram os enlaces para o mesmo dia,na mesma igreja. As duas juntas, como sempre fora.

Viraram uma só família. Estavam sempre juntos os quatro. Um dia, ao se encontrarem, disseram quase ao mesmo tempo ter uma surpresa para a outra. Na ânsia de revelar o segredo, falaram juntas: "Estou grávida!". A alegria espalhou-se pela casa. Era muita felicidade.

Os meses de gravidez transcorreram tranquilamente para ambas. Ao completarem três meses, descobriram emocionadas que seriam mães de meninas. Fizeram planos, escolheram nomes, o enxoval. E, claro, uma seria madrinha da filha da outra.

O grande dia finalmente chegou. Estavam juntas, quando uma delas começou a sentir as contrações, para, logo em seguida, a bolsa estourar. A outra, não aguentando a emoção, começou a passar mal e teve que ser socorrida também.

Ambas foram levadas à maternidade. Lá chegando, foram, com urgência, levadas à sala de parto.

Ao final de meia hora, duas meninas lindas haviam nascido.

Ao segurar a filha, uma delas perguntou pela outra criança. Foi informada que a menina nascera linda e saudável.

No dia seguinte, ao se preparar para voltar à casa com a filha nos braços e ansiosa para ver a amiga na mesma situação, recebeu a notícia que abalou o recanto mais profundo de sua alma: a amiga não resistira a complicações e morrera no parto.

Seu coração se fechou em luto, dor e desepero.

Ao chegar em casa, trancou-se no quarto e relembrou com tristeza do pacto que ambas haviam feito ainda na adolescência, e renovado todos os anos. Sua amiga morrera, ela deveria também se matar. O desespero se apoderou dela. De um lado, sua filha que acabara de nascer. De outro, sua amiga da vida inteira. Encolheu-se! Fechou-se em sua própria tristeza e adormeceu.

Após algum tempo, abriu os olhos e viu uma luz. Nada viu além disso, mas ouviu a voz de sua amiga, libertando-a do pacto e pedindo que cuidasse da filha como se fosse sua. Tentou falar, mas sua voz havia sumido.

Acordou sobressaltada. Tivera um sonho. Levantou-se desnorteada. Olhou ao redor e nada viu, mas, de repente, um forte cheiro de jasmim invadiu seu quarto.

Descobriu comovida que a amizade não terminara, mas que se eternizara.

Ane Rose
Enviado por Ane Rose em 25/12/2012
Reeditado em 29/12/2012
Código do texto: T4052145
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