O ídolo

Sentada na plateia, aguardava o momento vislumbrado durante tantos anos. Seu ídolo ia entrar e ser aplaudido de pé por todos. Momento único em sua vida. Depois daquele dia, poderia até morrer.

O tempo se arrastava, o momento esperado demorava a acontecer. Para aquietar seu coração, reviveu sua história.

Menina pobre, não pudera estudar. Tivera que trabalhar para ajudar a família. Pensou nos dias de fome que passara, quando os pais desolados, serviam um punhado de farinha com água a ela e aos irmãos. Mas, a família sempre unida, agradecia a Deus por ter aquele pouco para enganar a fome.

Aos 20 anos, casara-se com um moço de família igualmente pobre. Era um homem bom. Viviam na pobreza com dignidade. Tiveram cinco filhos. Trabalhavam dia e noite para lhes dar aquilo que não puderam ter: instrução.

Conseguiram livros usados, emprestados e até encontrados no lixo. Os filhos não lhes davam desgosto. Estudavam com afinco, tiravam boas notas.

Com os filhos adolescentes, perdeu o marido. Uma doença se apoderou dele e não teve jeito. A família diminuiu, mas a união aumentou. Sozinha, terminou de criar os filhos, preservando os valores já transmitidos com doçura e firmeza.

Ao completar 18 anos, seu filho mais velho passou no vestibular. Seu coração era pequeno para caber tanta alegria e orgulho.

Os anos de faculdade foram difíceis. O dinheiro era pouco, o gasto era imenso. Mas, ele não desistiu. Andava dois quilômetros todos os dias para pegar a condução. Saía cedo de casa e só voltava à noite, exausto. Havia dias em que tinha de escolher entre comer e pagar a xerox. Ficava com fome. Os colegas, acostumados com fartura, certa vez, fizeram piada porque o viram comendo um resto de sanduíche deixado no prato por alguém.

Perdida em suas lembranças, aquela mulher, ainda jovem, mas cujos anos de sofrimento faziam com que parecesse ter mais idade, escutou chamarem o nome do filho.

Havia chegado a hora. Ele, seu filho, não apenas concluíra o curso, como seria homenageado como o melhor aluno da turma. Ver aquela cena não tinha preço: seu filho aplaudido de pé por todos ...

Ele era seu ídolo.

Ane Rose
Enviado por Ane Rose em 17/12/2012
Reeditado em 29/12/2012
Código do texto: T4039512
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