QUE RAIVA! QUE... RAAAAIVA!
          
 A mulher entrou apressadamente na sala de doentes terminais, resmungando coisas ininteligíveis. 
 Era domingo, hora cedo; ninguém ainda viera para a visitação costumeira. 
 ...Ou melhor, viera sim, um homem, por quem a fulana passou sem cumprimentar; um homem que estava nos arremates duma fumada de cigarro e por isso deixara de entrar na sala antes dela. 
 Sem querer, os olhos do homem a seguiram, como limalhas atraídas por imantação; e ele conseguiu captar todo o gestual, toda a movimentação que ocorria do outro lado das vidraças que separavam os ambientes. Viu quando ela parou diante das duas primeiras doentes e imediatamente as deixou, voltando-se para a terceira, depois para a quarta. A rapidez com que se afastou também dessas últimas indicava que ainda não havia encontrado aquela a quem procurava.
 ...Restava apenas uma, no canto. Diante desta a mulher permaneceu, mais  demoradamente. Perdeu mais tempo. Encontrara? Parecia que sim, pois tentou reanimar a doente, dando-lhe toques, sacudindo-a, às vezes mais, às vezes menos intensamente, sem, no entanto, conseguir resposta aos estímulos.   
 Parou. Continuou ali, em pé, três, quatro, cinco minutos, imóvel, como que surpreendida pela não resposta.
 ...De repente, surtou!  
 ...- e começou a esmurrar e dar pontapés na pobre coitada que não a atendera.
 (...)
 Saiu mais depressa, mais zangada do que quando entrara, mais esbraseada: 
 - Que raaaaiva! Que... meeeerda!...
 (Havia passado a noite inteira na festa e precisava voltar pra casa).
 (...)
 Tão logo ela saiu, o homem entrou, pigarreando nicotina.
 Dirigiu-se à primeira doentinha, à segunda, e se deparou com os avisos: "Com Defeito".
 Sem perder tempo, dirigiu-se à terceira... depois à quarta. De ambas recebeu a informação: "Por favor, dirija-se a outro terminal".
 Na última, antes mesmo de tocá-la, encontrou a mensagem, que ainda não se desmanchara na tela e que tanto aborrecera a mulher: "Saldo insuficiente".
 
(...)

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 Na rodoviária, em frente ao Banco***, a mulher aguardava as amigas. 
 ...Ia tentar fazer uma "vaquinha", para comprar a passagem de volta, pois não conseguira nada nos terminais eletrônicos.


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Dez., 15.2012