A VOLTA

A Volta.

Ao chegar diante do prédio onde eu havia morado, meu coração disparou. Medo, ansiedade, dor... seria tudo de novo?

_ O que eu estou fazendo aqui? _ perguntava internamente, sem dar tempo de ouvir a resposta, enquanto caminhava pelo "hall" de entrada.

O porteiro tirou o olho de sua pequena TV e me cumprimentou, como se eu tivesse saído para comprar cigarros naquela manhã. Já havia muito tempo que eu tinha saído com a promessa de não mais voltar. As pessoas pareciam indiferentes ao momento crítico que eu estava para viver.

Ana me recebeu na porta com um sorriso carinhoso. Ela não perguntou nada e não falou nada... mas dizia tudo com aquele olhar brilhante. Eu sabia que algo novo havia acontecido com ela, enquanto estivemos separados, mas não conseguia identificar o que era. confesso que eu estava muito confuso e não encontrava palavras para começar uma conversa.

Ela estava linda e sabia como mexer comigo. Não havia o que falar... por isso começamos com um beijo. A noite começou a cair e a luz da lua entrava pela janela, completando o ambiente que lembrava os romances de Jorge Amado.

Eu tinha medo de confiar de novo e sofrer as mesmas dores, mas também tinha medo de perder a mulher que me deixava naquele estado alterado de consciência chamado paixão. Ficamos, uns dias, namorando escondido, sem que ninguém soubesse. Eu não queria interferência e precisava ter certeza que iria mesmo ficar com Ana ou se tudo era apenas mais uma ilusão.

Foi ficando cada vez mais difícil esconder a alegria de estarmos juntos.

O Natal se aproximava e o que antes parecia ser o mais triste de nossa família, foi celebrado quando anunciamos nossa decisão de retomar nosso casamento.

Ana e eu estávamos felizes com a vida nova. Certa manhã quando conversávamos, os olhos de Ana se encheram de lágrimas. Eu fiquei sem saber o que estava acontecendo. Vendo minha perplexidade, Ana enxugou os olhos e disse que ela se lembrou de que, naquele dia, completava um ano que ela tinha estado num grupo de oração e que uma mulher, que não conhecia, havia dito que nós voltaríamos. A profecia havia se cumprido: tudo aconteceu como ela havia dito!

Eu estava acostumado com pessoas que têm dons especiais e pensei que se tratava de mais uma médium, por isso pedi que Ana a convidasse para agradecer a Deus com uma oração. Embora tivesse me afastado dos místicos, eu ainda tinha uma grande curiosidade pelo sobrenatural.

Quando chegou o dia da oração, minha pequena casa ficou lotada de familiares.

Eu esperava uma pessoa com aquele estilo sobrenatural: ametistas, olhares místicos, incensos, pêndulos e pirâmides para purificar o ambiente...Mas as pessoas que vieram com a mulher de oração eram como nós. O brilho no olhar e o sorriso generoso chamaram minha atenção.

A mulher falou do amor de Deus e a expressão máxima deste amor era dar Jesus, Seu Filho, para ser a porta pela qual agora poderíamos retornar para Deus..."Jesus veio para reconstruir uma relação que foi quebrada" dizia, com alegria.

Foi tudo muito estranho e bonito ao mesmo tempo...difícil de descrever. A impressão que eu tinha era de que algo sobrenatural estava acontecendo bem na minha sala e só eu estava percebendo. Instintivamente, fechei meus olhos e falei com Deus.

Em minha mente, comecei a ver uma espécie de filme com cenas dolorosas que aconteceram desde o meu nascimento o que (posteriormente, confirmei a veracidade dos detalhes com meus pais). As cenas passavam como se eu estivesse flutuando, olhando de cima. A primeira delas era uma sala de parto. O médico dava ordens para a equipe e usava um vácuo-extrator (uma espécie de sugador de bebês). O comentário era de que a criança (eu) quase morreu. Outra cena era numa fazenda na região serrana, onde uma criança de aproximadamente três anos que brincava com uma grande minhoca colorida, na verdade uma cobra coral. Se ela o picasse, não haveria socorro, a quantidade de veneno seria fatal para uma criança. Na mesma fazenda, uma cena em que o cavalo que eu montava se assustou com uma boiada e disparou pela trilha, os meus pais horrorizados vendo tudo aquilo, só podiam pedir a proteção de Deus. Se eu caísse, poderia ser um tombo fatal.

Passei por cenas na minha adolescência, nas quais a morte chegou ainda mais perto.

Afoguei-me, com risco de vida, cinco vezes. Durante oito anos, surfei regularmente. Às vezes quando o mar ficava mais violento, a s ondas arrebentavam a cordinha que prende a prancha ao tornozelo e me deixavam no meio do caminho, já exausto. Sem ajuda, eu não teria conseguido sair.

Umas das cenas mais chocantes foi aos dezoito anos, no começo do namoro com Ana. Convidei-a para um cinema e, depois, para assistir ao por do sol no calçadão da praia. Nada separava nosso olhar daquele mar calmo, com clima de romantismo propício para a gente se amar. Como que por instinto, olhei por trás do ombro de Ana, para me certificar que tudo estava bem. Foi aí que vi cinco adolescentes, razoavelmente bem vestidos, andavam em nossa direção, de repente um alvoroço, um deles bem à minha frente, puxou um revólver, apontou a arma pra minha cabeça e atirou duas vezes. Os tiros falharam, ele gritou uns palavrões para o revólver e saiu correndo. A imagem do tambor do revólver com as balas e o cano em direção à minha testa custou muito a sair dos meus pesadelos.

Nestes poucos instantes em que o filme passou, pude perceber que, em quase todas as cenas, a morte insistia em tentar me levar. Mas Algo me protegia.

Agora, este "algo" estava se apresentando a mim, na minha pequena sala. Ele tinha nome e, pasmem, me conhecia pelo meu nome.

Ao olhar o filme como um todo, pude ver que eu não era um "erro de tabela" de meus pais, como muitas vezes pensei. Entendi que não era fruto de um acaso...que aquele espermatozoide que venceu outros 300 milhões de competidores e encontrou aquele óvulo (que por sua vez, venceu os outros mil candidatos) não foi obra do acaso.

Deus, o Criador, estava em uma dessas cenas. Cada coisa tem seu propósito e eu não era um acidente, mas um projeto do Seu Amor. As peças comeram a se encaixar.

Os meus pais _ com suas qualidades e limitações _ também não eram as pessoas complicadas, como pensei por tantos anos. Percebi, nesses poucos instantes, que havia um encandeamento das cenas, uma poderosa Força sempre me envolveu todos esses anos. Eu nunca tinha me dado conta de Sua Presença.

Gratidão e amor. Sentimentos invadiam a minha alma, como que uma cachoeira que levava o passado e dava a ele um novo significado. Minha cabeça estava baixa, em reverência ao Amor Incondicional.

Não era Fantasia.

Com o passar dos anos, entendi que poderia fazer mais, ter mais, realizar mais... desde que fosse uma escolha, um meio e não uma compulsão, um fim por si só.

Quando você modifica sua visão, suas escolhas naturalmente mudam.

Talvez você me pergunte _ Você mudou?

Mudei muito, mas continuo me transformando a cada dia.

Comecei um processo que chamo de "terapia no divã de Deus". Neste divã, tenho mais clareza do "para que" de tantas "experiências dolorosas" e outras "tantas belíssimas". O "Amor" ensina a olhar a vida com mais "simplicidade" e a entender as pessoas com mais "misericórdia". As coisas fazem "sentido", quando olhamos a "história" e não somente as "cenas".

Talvez seja difícil falar sobre essa nova relação com Deus, porque é preciso ter uma certa inocência para compreender o intangível. Tenho visto como Deus, em seu amor e graça, está escondido aos intelectuais, mas é tão acessível aos simples. Tenho visto como Ele sempre se manifesta aos que O buscam.

Conclusão:

Desde esse dia, minha maior ambição, meu maior desejo tem sido compartilhar essa experiência transformadora. Por fim entendi: "Deus não é uma religião". "É uma realidade!".

Posso arriscar a dizer que Ele está aí, exatamente agora, enquanto você lê as últimas palavras deste texto. Quem sabe foi Ele quem colocou este texto diante dos seus olhos para lhe falar algo em particular. Talvez Ele esteja batendo em sua porta dizendo: Eis que estou à porta e bato, aquele que abrir, entrarei e cearei com ele.

Aproveite, fale com ele: "Ei Deus, eu quero você, entra na minha vida... não quero continuar igual...quero viver de outra maneira...quero aprender a AMAR!.

Essa é a escolha que muda todas as outras. Ela muda seu destino.

Autor: Roberto Aylmer.

******************

Mary Josi
Enviado por Mary Josi em 07/12/2012
Reeditado em 07/12/2012
Código do texto: T4024702
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.